Vladimir safatle - curso completo sobre a 'fenomenologia do espirito', de hegel [30 aulas] [filosofia - usp] aula 03

6585 palavras 27 páginas
Curso Hegel
Terceira aula

Na aula passada, começamos a leitura da Fenomenologia do espírito através de um trecho de seu prefácio que vai do primeiro parágrafo até o parágrafo 17. Nele, vimos Hegel definir, como objeto privilegiado da reflexão filosófica, as expectativas da modernidade e de seus modos de racionalização das dimensões cognitivo-instrumental, prático-moral e estético-expressiva. Uma reflexão que deveria apreender tais expectativas e processos a partir de uma perspectiva capaz de revelá-los como resultados de processos de formação legíveis no interior de uma compreensão racional da história. No entanto, vimos como Hegel definia a modernidade como um momento de cisão. O espírito perdeu a imediatez da sua vida
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Neste sentido, Hegel deve iniciar sua Fenomenologia do Espírito, livro que marca enfim sua entrada em cena no debate filosófico alemão, com uma ruptura clara em relação a Schelling, a quem Hegel foi tão intelectualmente ligado até então. Eu havia lembrado de que, ao menos aos olhos de Hegel, Schelling procurava ultrapassar as dicotomias da reflexão através do recurso a um plano de imanência a partir do qual o subjetivo e o objetivo se extraem. O sujeito emergiu de um mundo indiferente que agora ele confronta e conhece através da reflexão. Daí segue, por exemplo, a definição schellinguiana do Absoluto que aparece como “indiferença absoluta entre sujeito e objeto”. È a natureza que marcaria este ponto de indiferença entre sujeito e objeto no qual se encontra o Absoluto. Ou seja, contra o esvaziamento da dignidade ontológica da natureza produzida por Kant, Schelling propõe o resgate da filosofia da natureza como momento da auto-intuição do Absoluto. O conceito central aqui é intuição. Schelling insiste que há uma intuição intelectual que não é reflexão, que não é posicional, mas que é modo de posição da unidade sem mediação entre sujeito e objeto. De fato, Hegel não pode aceitar tanto o conceito schellinguiano de Absoluto, quanto a maneira com que o recurso a intuição se dá às espessas do trabalho do conceito, como se o recurso à intuição fosse modo de recuperação daquilo que o conceito perde ao operar. Para Hegel, não se

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