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Estudos Avançados em Saúde e Exercícios - Fisiología (página 2)

Paulo Gentil

 

O papel do estresse 

Em um estudo de GOULD fez-se um teste denominado "Paradigma do residente-intruso", no qual um macaco macho adulto, criado em cela individual, é colocado na cela de outro adulto, resultando em encontro agressivo e posição de subordinação do "intruso" em relação ao "residente". Foi verificado que após uma única sessão de 1 hora deste (cruel) teste o número de células proliferadoras nestes animais caía significativamente em relação a animais não estressados. Ou seja, situações de estresse influenciam negativamente no nascimento de novos neurônios (GOULD et al, 1998). O papel negativo do estresse foi confirmado por diversos outros estudos, como o de TANAPAT et al (2001), no qual ratos eram expostos ao odor de fezes de raposa. Uma revisão de GOULD & TANAPAT (1999) atribui o efeito do estresse às alterações bioquímicas específicas, como a elevação da adrenalina e dos corticosteróides.

Atividade física e novos neurônios

Com as descobertas feitas em Princeton, é tentador achar que podemos combater lesões e degenerações do sistema nervoso com as atividades físicas. Além de todos os benefícios conhecidos, comprovaria-se mais um: a saúde neurológica. Nesta linha destaca-se o estudo recente do grupo de JOSÉ LUIZ TREVO, onde foi verificado que o exercício em ratos estimula a absorção pelo cérebro do fator de crescimento IGF-1, que teria efeito neurotrófico.

Mas deve-se ter cuidado e responsabilidade ao entrar em um programa de atividades físicas com esse objetivo. Lembre-se que o estresse é antagonista da neurogênese e que a atividades física tem tanto seu lado estressante, quanto estimulante. Um programa com potencial de promover o bom funcionamento neurológico deve ser responsavelmente equilibrado para que as alterações bioquímicas sejam as mais favoráveis possíveis.

Considerações finais

Ocorrendo ou não a gênese de novos neurônios em seres humanos, ficam três importantes dicas para se ter uma boa saúde do sistema nervoso:

- Pense!

- Reduza o estresse!

- Exercite-se!

Referências bibliográficas

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Gordura marrom e UCP: causas da obesidade?

Ao contrário do tecido adiposo branco, o marrom é altamente vascularizado, possui alto número de mitocôndrias e tem inúmeros tecidos amielinizados que providenciam estímulos simpáticos aos adipócitos. Suas células apresentam a "mitochondrial uncoupling protein (UCP1)" que dá ao seu mitocôndria a habilidade de inibir a fosforilação oxidativa, atuando diretamente na cadeia de transporte de elétrons, assim, quando o grupo fosfato é separado, a energia não é transmitida para a cadeia de transporte de elétrons, onde produziria ATP, e sim liberada como calor, que chega ao sangue e é transportado pelo corpo. Resumindo, esta enzima faz o organismo produzir calor ao invés de armazenar energia.

Ao descobrir estas propriedades da gordura marrom, muitas pessoas sugeriram maneiras de estimula-la como: treinamentos em ambientes frios e a suplementação de substâncias especificas. Porém, devemos ter em mente que esse tecido corresponde somente a cerca de 5-10% do tecido adiposo de adultos, sendo localizado principalmente em volta do pescoço, ombros, espinha, órgãos importantes e vasos sangüíneos. Em humanos a gordura marrom é mais significativa em recém nascidos, no qual chega a ser responsável por 5% do peso total, diminuindo com o passar do tempo até virtualmente desaparecer. Esta gordura é importante para filhotes em geral e animais que vivem no frio e/ ou que hibernam, justamente pela sua habilidade de produzir energia térmica.

UCP (mitochondrial uncoupling protein) 

Apesar de ser improvável que distúrbios na gordura marrom sejam relacionados ao ganho de peso em humanos, algumas variantes da UCP já foram identificadas. Pesquisadores da Millenium Pharmaceuticals (GIMENO et al, 1997) e da UC Medical Center, Duke University Medical e Center French Centre National de la Recherche Scientifique (Fleury et al , 1997) anunciaram, em momentos diferentes, a descoberta de um gene que pode explicar porque algumas pessoas podem ingerir mais calorias que as outras e ainda assim emagrecer, enquanto as outras engordam. O gene identificado denomina-se dubbed uncoupling protein 2 ou UCP2 (denominado UCPH pelo grupo de GIMENO), e ao contrário da UCP1, encontra-se em vários tecidos humanos incluindo gordura branca, por isso a UCP2 possui um papel muito mais importante na obesidade. Foi verificado que as pessoas que possuem mais dessa proteína produzem mais calor, queimando mais calorias. Esse gene também pode ser responsável pela produção de calor em estados febris e em locais específicos no caso de inflamações.

Esta proteína, juntamente com a leptina, parecem ter papel importantíssimo na obesidade, uma vez que a leptina regula o apetite e o próprio metabolismo.

Porém não devemos tirar conclusões precipitadas, pois supõe-se que existam de 8 a 30 genes que podem contribuir para a obesidade, portanto esta pode ser uma explicação, mas não a única. 

Referências Bibliográficas

  • GIMENO RE, DEMBSKI M, WENG X, DENG N, SHYJAN AW, GIMENO CJ, IRIS F, ELLIS SJ, WOOLF EA, TARTAGLIA LA. Cloning and characterization of an uncoupling protein homolog: a potential molecular mediator of human thermogenesis. Diabetes 1997 May;46(5):900-6
  • FLEURY C, NEVEROVA M, COLLINS S, RAIMBAULT S, CHAMPIGNY O, LEVI-MEYRUEIS C, BOUILLAUD F, SELDIN MF, SURWIT RS, RICQUIER D, WARDEN CH. Uncoupling protein-2: a novel gene linked to obesity and hyperinsulinemia. Nat Genet 1997 Mar;15(3):269-72

 

Miostatina

A miostatina é um gene que regula negativamente o crescimento muscular, ou seja, ela limita o tamanho do músculo, tanto pela atenuação da hipertrofia quanto da hiperplasia. Ainda não se sabe ao certo como a miostatina atua, podendo ser pela indução da morte das células, inibição da proliferação de células satélites e/ou diretamente no metabolismo protéico."

Estudos em animais

Em 1997, MCPHERRON et al fizeram um experimento interessante e obtiveram uma descoberta surpreendente. Através de manipulação genética os pesquisadores produziram ratos com deficiência no gene GDF-8 (miostatina) e verificaram que os animais "deficientes" eram muito maiores que os normais, com seus músculos chegando a ser de 2 a 3 vezes mais volumosos, sem que houvesse um aumento correspondente na gordura!!!!

Em animais de maior porte, como os bois, a inibição da miostatina não é tão significativa quanto em ratos. Existem algumas raças que possuem naturalmente mais massa muscular, como a Belgian Blue, a qual possui uma mutação genética que a leva a ter de 20 a 25% mais massa muscular e uma menor quantidade de gordura intramuscular e tecidos conectivos (dados citados por MCPHERRON & LEE, 1997). Estes dados em animais podem levar a interessantes trabalhos no campo da engenharia genética, no sentido de produzir animais maiores e com carne de melhor qualidade em uma grande variedade de espécies, tendo em vista que a miostatina conserva suas propriedades em diversos componentes do reino animal.

Estudos em humanos

Desta forma, tornou-se inevitável associar o ganho de massa muscular à atividade da miostatina em humanos. Esta poderia ser uma explicação de como o fator genético determina a composição corporal dos indivíduos em níveis musculares, teorizando que pessoas com maiores atividades de miostatina teriam dificuldade em ganhar massa muscular.

Um estudo feito em Estocolmo, na Suécia, mediu a quantidade de miostatina em um grupo de homens saudáveis e dois de HIV positivos (um com perda de peso menor que 10% e o outro com redução ponderal maior que 10% nos últimos 6 meses). De acordo com os resultados há uma correlação negativa entre a miostatina e quantidade de massa magra, tanto em indivíduos saudáveis quanto HIV positivos, dando suporte à teoria de que a miostatina seja inibidora do desenvolvimento muscular (GONZALEZ-CADAVID et al, 1998). Outros estudos também verificaram maiores atividades da miostatina em estados catabólicos induzidos por períodos prolongados de imobilização, como estados de leito (ZACHWIEJA et al, 1999; REARDON et al, 2001). Mais recentemente também foi verificada uma maior atividade de miostatina em idosos, atribuindo um possível papel deste gene na sarcopenia (perda de massa muscular) (MARCELL et al, 2001; SCHULTE et al, 2001).

Os maiores níveis de miostatina em portadores do vírus HIV (GONZALEZ-CADAVID et al, 1998), atrofias crônicas (ZACHWIEJA et al, 1999; REARDON et al, 2001) e idades avançadas (MARCELL et al, 2001; SCHULTE et al, 2001) fazem surgir especulações acerca das aplicações terapêuticas que a inibição da atuação da miostatina podem ter em estados catabólicos induzidos por diversas patologias.

Em 2000, IVEY et al publicaram um estudo, no qual procurou-se verificar os efeitos da miostatina nos resultados obtidos com o treinamento de força. O estudo envolveu um treinamento de musculação de 9 semanas, com uma metodologia similar ao drop-set, tendo 4 grupos: homens jovens, homens idosos, mulheres jovens e mulheres idosas. De acordo com os resultados os diferentes fenótipos de miostatina não influenciaram na resposta hipertrófica ao treinamento de força quando os resultados de todos os 4 grupos eram analisados em conjunto, porém houve uma tendência para maiores ganhos de massa muscular em mulheres com um determinado genótipo. Estas conclusões podem gerar dúvidas quanto à influencia da miostatina na resposta normal ao treinamento de força.

A descoberta deste gene trouxe reações em diversos segmentos: os profissionais da saúde procuraram uma maneira de reverter o catabolismo gerado por estados patológicos e pelo envelhecimento; os pecuaristas visualizaram uma forma de aumentar seus ganhos, produzindo animais maiores, e alguns segmentos do esporte procuraram uma maneira de obter melhores resultados desportivos e estéticos.

Como era de se esperar, muitas indústrias de suplementos alimentares se prontificaram a lançar no mercado substâncias que prometem atenuar os efeitos da miostatina e, desta forma, romper as barreiras genéticas do ganho de massa muscular, porém creio que isto seja improvável de acontecer, pois dificilmente um destes produtos produzirá a mágica de inibir a atuação deste gene e se isso ocorrer, os resultados podem não ser muito agradáveis, pois não podemos esquecer que todos os movimentos de nosso corpo são controlados por músculos, incluindo os da fase e outros locais que não costumamos lembrar quando pensamos em hipertrofia. Uma inibição generalizada da miostatina poderia provocar desenvolvimento incontrolado de todos eles, gerando um aspecto nada agradável.

Outro ponto que gerará questionamentos é a distante, porém real, possibilidade da miostatina passar a ser manipulada em humanos mesmo antes do nascimento, originando uma linhagem de "super-seres". Isto traz à tona a questão ética da engenharia genética: até que ponto a ciência pode interferir no desenvolvimento de um indivíduo?

Referências Bibliográficas

  • GONZALEZ-CADAVID NF, TAYLOR WE, YARASHESKI K, SINHA-HIKIM I, MA K, EZZAT S, SHEN R, LALANI R, ASA S, MAMITA M, NAIR G, ARVER S, BHASIN S. Organization of the human myostatin gene and expression in healthy men and HIV-infected men with muscle wasting. Proc Natl Acad Sci USA 1998 Dec 8;95(25):14938-43. 
  • IVEY FM, ROTH SM, FERRELL RE, TRACY BL, LEMMER JT, HURLBUT DE, MARTEL GF, SIEGEL EL, FOZARD JL, JEFFREY METTER E, FLEG JL, HURLEY BF. Effect of age, gender and myostatin genotype on the hypertrophic resposnse to heavy resistance training. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2000 Nov;55(11):M641-8 
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  • SCHULTE JN, YARASHESKI KE. Effects of resistance training on the rate of muscle protein synthesis in frail elderly people. Int J Sport Nutr Exerc Metab 2001 Dec;11 Suppl:S111-8. 
  • ZACHWIEJA JJ, SMITH SR, SINHA-HIKIM I, GONZALEZ-CADAVID N, BHASIN S. Plasma myostatin-immunoreactive protein is increased after prolonged bed rest with low-dose T3 administration. J Gravit Physiol 1999 Oct;6(2):11-5.

 

Relação sexual e performance

A famosa "concentração" é uma prática bem antiga que persiste até hoje. Dentre seus objetivos está o de manter o atleta longe do sexo no(s) dia(s) anterior(es) à competição. A favor dela estão os conservadores e contra estão, obviamente, os(as) atletas e respectivos(as) companheiros(as). É muito comum ouvirmos em noticiários que determinado jogador fugiu da "concentração" e causou transtornos para o time, ou que a atividade sexual do atleta foi a culpada pelo mal resultado na competição. Além do detrimento à performance também é muito comentado que a relação sexual prejudicaria a concentração e diminuiria os níveis de testosteronas, prejudicando, nesse caso, o processo de hipertrofia. 

Em 1995 foi publicado um estudo dos pesquisadores americanos BOONE & GILMORE procurando verificar os efeitos da relação sexual na performance. Os autores usaram 11 homens como amostra, os quais foram testados em duas ocasiões: com ou sem relação sexual antes do teste. No caso do grupo experimental as relações eram mantidas 12 horas antes do teste, bem menos que o sugerido pelos treinadores, e mesmo assim não houve alterações negativas na performance durante os teste máximos para mensurar a potência aeróbia. 

Um grupo de pesquisadores suíços foi ainda mais longe: usou atletas de alto nível em sua amostra, analisou também os níveis de testosterona, testou a capacidade de concentração e ainda esperou apenas 2 horas após a relação sexual para realizar os testes. De acordo com os resultados: no teste máximo no cicloergometro não houve prejuízo da performance; no teste para verificar a capacidade de concentração também não foi verificado prejuízo na performance; os níveis séricos de testosterona também não pareceram ser afetados (SZTAJZEL et al, 2000). Quanto à questão dos níveis de testosterona, pesquisadores italianos ousaram ao sugerir que os níveis de atividade sexual estão diretamente relacionados com os níveis de testosterona (JANNINI et al, 1999) 

Vale ressaltar que a proibição do sexo não é defendida por todos, segundo consta na autobiografia de Bob Beamon. A única vez que ele teve relações sexuais na noite anterior à uma competição foi nas Olimpíadas do México em 1968, quando coincidentemente (ou não) quebrou o recorde mundial de salto em distância em sua primeira tentativa, com a marca de 8,9 metros, superando o recorde anterior em mais de meio metro, marca histórica que perdurou por mais de duas décadas, até que Mike Powell a superou em 1991.

Segundo conta a lenda, os alemães orientais já sabiam dos benefícios do sexo há algum tempo, tanto que às vésperas da Copa do Mundo de Atletismo de 1981, em Roma, eles levaram a equipe inteira a um cinema pornô e estimularam os atletas a formarem pares. 

Em relação às mulheres também há controvérsia, porém apesar de não haver material suficiente para embasar afirmações é provável que as observações sejam as mesmas que para os homens. 

Na minha opinião não é a relação sexual em si que pode trazer prejuízo a performance, mas sim o fato de se passar a noite em claro tendo a relação ou no processo de "caça", que envolve muitas vezes o uso de "drogas sociais" como álcool e cigarro. Além disso a associação com a perda de concentração me parece ser justamente inversa, pois prender o atleta em seu quarto longe de sua(eu) companheira(o) me parece muito mais estressante do que passar a noite com essa pessoa. A opção mais racional seria vale-se do princípio da individualidade, deixando o atleta livre para o optar qual o procedimento que o deixaria mais apto para competição. 

Referências Bibliográficas

  • BOONE T, GILMORE S. Effects of sexual intercourse on maximal aerobic power, oxygen pulse, and double product in male sedentary subjects.J Sports Med Phys Fitness. 1995 Sep;35(3):214-7. 
  • SZTAJZEL J, PERIAT M, MARTI V, KRALL P, RUTISHAUSER W. Effect of sexual activity on cycle ergometer stress test parameters, on plasmatic testosterone levels and on concentration capacity. A study in high-level male athletes performed in the laboratory. J Sports Med Phys Fitness. 2000 Sep;40(3):233-9. 
  • JANNINI EA, SCREPONI E, CAROSA E, PEPE M, LO GIUDICE F, TRIMARCHI F, BENVENGA S. Lack of sexual activity from erectile dysfunction is associated with a reversible reduction in serum testosterone. Int J Androl 1999 Dec;22(6):385

 

Lactato, acidose e fadiga

"Todos ‘sabem’ que a acidose lática causa fadiga. Mas, de fato, é verdade que a fadiga associada com o exercício intenso é causada pelo lactato? E, além disso, como esta opinião surgiu? Em muitos casos nossos professores nos instruíram neste fato enquanto nos encorajavam a ler trabalhos clássicos dos progenitores da bioquímica e fisiologia muscular. Subseqüentemente, nós credulamente transferimos esse conhecimento para nossos estudantes. Rotineiramente, a associação entre acidose e fadiga é reforçada em nossas mentes e psiques por jornalistas e comentaristas do esporte que reiteram o que nós previamente transportamos através de nossos ensinamentos e escritos". (Brooks, 2001)

Uma das maiores "verdades" da Fisiologia é a idéia de que tanto o lactato quanto a acidose metabólica contribuem diretamente para a fadiga muscular. As associações entre lactato e fadiga se originaram em estudos de quase um século atrás, quando se descobriu que contrações até a exaustão levam ao acúmulo de lactato e queda no pH. Na ocasião também foi observado que a presença de oxigênio na recuperação era associada a um declínio na quantidade de lactato, aumento nos níveis de glicogênio e restabelecimento da função contrátil (Brooks, 2001). A soma deste achados fez surgir automaticamente uma suposta relação entre acidose lática e alterações na função muscular.

Entretanto estudos recentes revelaram que, em temperaturas normais, a queda de pH não interfere no funcionamento muscular (Westerblad et al. 1997; Posterino & Fryer, 2000; Westerblad et al, 2002). Pelo contrário, já estão disponíveis fortes evidências opostas ao senso comum, trazendo a hipótese que a acidose pode ser um importante mecanismo protetor contra a fadiga.

Contrações extenuantes levam a perda de K+ intracelular, com acúmulo extracelular do mineral, de modo que a concentração plasmática de íons de potássio pode chegar a 10 mM, sendo ainda maior nas adjacências do músculo. Em um estudo de Nielsen et al (2001), esta situação foi simulada através da incubação de músculos de ratos a 11 mM de K+ e obteve-se redução de 75% na força de músculos de ratos, mostrando que o acúmulo de K+ interfere negativamente na função muscular. A adição de 20 mM de lactato, no entanto, levou ao restabelecimento quase total da capacidade contrátil. Além disso, quando se adicionou lactato e K+ simultaneamente, a queda na força induzida pelo K+ foi totalmente prevenida. Em um estudo posterior, Pedersen et al. (2003) obtiveram resultados similares, verificando que 10 mM de lactato restauravam parcialmente a força em músculos de ratos incubados a 11 mM de K+. 

Com o surgimento de estudos como os citados acima, se tornou praticamente inviável sustentar a hipótese que o lactato seja causador da fadiga. Diante destas evidências, muitos se apressaram em dizer que, ao invés de lactato, são os íons de hidrogênio os grandes culpados pela fadiga, tentando sustentar parte do dogma atual. Por outro lado, também surgiu a especulação que o lactato seja favorável a performance por tamponar os íons H+ e entrar no metabolismo energético, fornecendo substratos para ressíntese de ATP. Mas nenhuma das hipóteses parece ser verdadeira. 

Para verificar se a recuperação da força era causada pela acidose em sí ou se era devido a algum efeito metabólico, foram feitos outros experimentos por Nielsen et al (2001). No primeiro, concomitante com a elevação nas concentrações de K+, a glicose também foi elevada, mas não houve efeitos positivos na recuperação da força em músculos no pH padrão. No segundo, a queda no pH foi induzida pela adição de ácido propiônico ou CO2 e se verificou uma recuperação similar à causada pela adição de lactato (Nielsen et al, 2001). Deve-se lembrar que o acréscimo de ácidos levou a uma significativa queda no pH (de 7,44 para 6,80) e ainda assim houve melhoras na performance. Ou seja, os efeitos benéficos na performance não foram causados pelo fornecimento de energia, mas sim pelos próprios íons de H+. Deste modo os experimentos de Nielsen, Paoli e Overgaard abalaram as estruturas de outro dogma da fisiologia ao demonstrar que a acidose metabólica não prejudica a contração muscular, mas a beneficia.

Além de descartar que o efeito positivo do lactato na performance é advindo do fornecimento de substratos, outros estudos também descartaram uma possível ação na bomba Na+-K+ e na dinâmica do Ca2+ (influxo e conteúdo muscular total). Aparentemente, a acidificação é associada com maior excitabilidade do músculo, contrapondo os efeitos do acúmulo de K+, conforme mostram os estudos de Nielsen et al (2001) e Pedersen et al (2003), nos quais o lactato restaurou a excitabilidade deteriorada pela concentração aumentada de K+ em músculos intactos estimulados direta ou indiretamente. 

De fato, a queda na força induzida pelo acúmulo de K+ é provavelmente relacionada à despolarização das fibras, levando a uma redução na amplitude dos potenciais de ação (Phillips et al, 1993; Sejersted & Sjogaard, 2000), no entanto a acidificação recupera a excitabilidade muscular, o que pode ser causado por alterações na função dos canais de Na+ (Nielsen et al, 2001). 

Corroborando esta hipótese, na revista Science de agosto, foi publicado um artigo de Pedersen et al (2004) revelando que a acidose preserva a excitabilidade quando os músculos tornam-se despolarizados, permitindo aos potenciais de ação se propagarem. Adicionalmente, outro estudo recente (Karelis et al, 2004) reforçou esta teoria ao examinar os efeitos da infusão de lactato na fadiga muscular durante estimulações elétricas prolongadas. O experimento envolvia contrações induzidas durante 60 minutos concomitantemente a uma infusão salina ou de lactato. Os resultados mostraram que a infusão de lactato atenuava a queda na força, sendo verificado que o lactato atua na excitabilidade (M-wave), sem estar associado à utilização de glicogênio ou efeitos na junção neuromuscular.

Outros mitos referentes a associação entre fadiga, lactato e acidose são: inibição competitiva do lactato pela união de Ca2+ à Troponina, inibição da glicólise, distúrbios do processo de captação de cálcio do reticulo sarcoplasmático e inibição direta das pontes cruzadas e da ATPase miofibrilar. 

Inibição competitiva do lactato pela união de Ca2+ à Troponina

A literatura não traz evidências consistentes a respeito de uma inibição "competitiva" do lactato nem dos íons H+ com o Ca2+. Em verdade, a análise de estudos sobre o tema traz apenas relatos de uma inibição que parece ser devido a mudanças na propriedade da troponina C (Solaro et al, 1989), sendo esta questão da acidose e contração muscular bem estudada em situações clínicas no músculo cardíaco (Orchard & Kentish, 1990). O fato dos íons H+ terem atuação na troponina C já traz questionamentos interessantes, pois o músculo esquelético e o miocárdio têm variantes diferentes desta proteína, o que pode explicar as diferentes respostas à acidose (Palmer & Kentish, 1994)

Inibição direta das pontes cruzadas e da ATPase miofibrilar

Dados consistentes revelam não haver inibição do mecanismo de contração-encurtamento em fibras musculares intactas expostas a acidose (Mainwood et al, 1987; Westerblad & Allen, 1992; Phillips et al, 1993). Em um artigo deste ano, Allen verificou que, apesar de existir a teoria que a acidose inibe a atividade das proteínas musculares, não foram encontrados efeitos da mudança do pH durante repetidas contrações tetânicas (Allen, 2004). 

Não foi possível encontrar referências sobre competição com os canais de cálcio em proteínas contráteis, no entanto há alguns relatos sobre a inibição do lactato na liberação do cálcio pelo retículo sarcoplasmático.

Distúrbios do processo de captação de cálcio do reticulo sarcoplasmático

Distúrbios na liberação de Ca2+ pelo retículo são vistos somente em situações laboratoriais que se afastam do funcionamento real do músculo. Favero et al (1997), por exemplo, encontraram uma redução de 37% na liberação de Ca2+ em vesículas de retículos sarcoplasmáticos isoladas incubadas com 20 mM de lactato. Mas em fibras estimuladas mecanicamente, este efeito parece ser reduzido (Dutka et al, 2000) ou até mesmo revertido (Andrews & Nosek, 1998). No estudo de Dutka et al (2000), apesar do lactato inibir a liberação de Ca2+ induzida pela cafeína, o mesmo não aconteceu quando a liberação dos íons foi induzida por mecanismos mais "normais" de estimulação (Dutka et al, 2000). Pode-se citar também o estudo de Posterino et al (2000) onde se verificou que o lactato tem efeitos negligenciáveis sobre a liberação de cálcio voltagem-dependente e sobre o fluxo passivo do íon pelo retículo sarcoplasmático.

Inibição da glicólise

Em relação à atividade de enzimas do metabolismo energético, é reconhecido que a queda no pH pode causar alteração da atividade enzimática, mas é importante lembrar que não estamos falando somente de sistemas energéticos em um sentido linear, há diversos outros fatores envolvidos na fadiga.

Iniciamos com uma citação de Brooks e usaremos outra frase do mesmo autor, antes de terminar o texto (Brooks, 2001):

"...não é intrigante observar, pelo menos em músculos estudados in vitro, que uma conseqüência de contrações musculares forçadas (acúmulo de H+) oferece um grau de proteção contra outra conseqüência à contração (aumento da concentração de K+)?"

Infelizmente o papel da acidose e do lactato no aumento da performance ainda não tem explicações totalmente definidas, só há a certeza de "que acontece", mas ainda não há a certeza do "como". Enfim, é possível que a questão do pH, lactato e fadiga seja mais um dogma com bases científicas seriamente questionáveis, mas que certamente se sustentará por algumas décadas (ou até mesmo para sempre) graças às suas bases "históricas", assim como (guardadas suas devidas proporções) o ácido lático, as séries de 3x10, o supino inclinado para hipertrofia do peitoral clavicular, a suplementação de proteínas...

Referências bibliográficas

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Paulo Gentil
Presidente do Grupo de Estudos Avançados em Saúde e Exercícios; 19/12/2004;
http://www.gease.pro.br



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