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Representação e Cooptação Politica no Brasil (página 3)

Simon Schwartzman

 

5.1. Modificações demográficas no século XIX.

As estimativas da população brasileira antes do Censo de 1872 são imprecisas, daí os dados abaixo serem apenas indicadores de tendências muito amplas. Há pouca dúvida, no entanto, de que São Paulo tenha sido uma província relativamente pouco importante no ano de 1823, tendo apenas cerca de 7% da população total, enquanto as províncias do Nordeste, da Bahia e de Pernambuco possuíam 29% da população. Outros 29% estavam nas províncias de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, incluindo a Corte. Uma revisão cuidadosa das informações disponíveis para o período conduziu a uma caracterização do desenvolvimento demográfico conforme o quadro 6 (vide nota 29).

Quadro 6
Taxas Anuais de Crescimento Populacional por Região

Região:

1808/1854

1854/1890

Norte

2,1

1,72

Nordeste

2,31

1,28

Leste

2,82

1,66

Centro Oeste

2,73

0,59

Brasil

254

1,79

Fonte: Hélio Mathias, "A sociedade civil no Império: crescimento da População". Documento de trabalho do IUPERJ

Tais dados diferem dos de Celso Furtado, por exemplo, que calcula uma taxa de crescimento de 1,3% ao ano entre 1800 e 1850.(27) Não trataremos de determinar aqui a confiabilidade e significação estatística e teórica desta discrepância. Basta observar a queda de mais de um ponto na taxa de crescimento do Nordeste e um acréscimo equivalente no Sul para se obter uma idéia da tendência. As variações na taxa de. crescimento refletem as migrações do Nordeste e Leste para o Sul, bem como o fim do tráfico negreiro em 1850, e a imigração externa . A imigração européia para o Brasil é um fenômeno relativamente pouco importante até fins do século XIX. Apenas cerca de 22 mil imigrantes entraram entre 1819 e 1850, e cerca de 900 mil de 1851 até 1888. Esta média de cerca de 25 mil imigrantes por ano no segundo período compensa parcialmente o fim do tráfico negreiro que havia introduzido no país cerca de 9 mil escravos por ano de 1801 a 1804, cerca de 30 mil de 1820 a 1829, e mais de 50 mil anuais entre 1842 e 1851, quando o tráfico praticamente estancou. A substituição da mão-de-obra escrava pelo trabalho livre prova?elmente significou também um acréscimo na taxa de crescimento que parece ter sido nula ou negativa para a população escrava, o que poderia vir a compensar ainda mais a redução relativa do fluxo migratório.(28)

Os dados para urbanização no século XIX são ainda mais dispersos e não permitem uma comparação sistemática através do tempo. Em 1823 apenas as cidades do Rio, Bahia e Recife possuíam mais de 50 mil habitantes, em uma população total de 4 milhões. As estimativas da população do Rio de Janeiro oscilam entre cem e duzentos mil ao longo do século, e o Censo de 1872 atribui-lhe 275 mil habitantes. Existe uma estimativa para 1864 que tende a exagerar os dados para os centros urbanos, mas o número de cidades relacionadas como tendo mais de 50 mil habitantes é ainda o mesmo, em uma população total de 11 milhões. O primeiro Censo, em 1872, acrescenta a este grupo mais duas cidades, Belém e Campos. Nesta época apenas o Rio, Bahia e Recife possuíam mais de 100 mil habitantes, em um total de 11 milhões. O Estado de São Paulo é o quarto maior, após Minas, Bahia e Pernambuco, e a cidade de São Paulo, naquele ano, possuía apenas 27 mil habitantes. Em 1890 a população do país havia crescido para 14 milhões, e mais três cidades penetraram no grupo dos 50 mil, inclusive São Paulo, que então contava com 64 mil habitantes. Este Estado ocupava então o terceiro lugar no país em termos de população, após Minas e Bahia, mas já acima de Pernambuco.(29) Qualquer taxa de urbanização seria arbitrária, mas existe pouca dúvida de que o processo de urbanização no século XIX foi lento, tendo-se acelerado no fim do período.

5.2. Estagnação e Ressurgimento Econômico

A principal atividade econômica em fins do século XVIII era a mineração; seu declínio foi muito rápido, indo de uma média anual de 14.600 quilogramos de ouro no período 1741-1760 a apenas 1.760 entre 1811 e 1820. As Guerras Napoleônicas e o início do livre comércio com a Inglaterra ocasionaram uma breve prosperidade na agricultura do açúcar e do algodão, mas depois de 1812/15 os preços caem e a independência política brasileira ocorre em um momento de completo recesso econômico mundial e de retração da economia nacional.(30) Ao mesmo tempo, entretanto, o café estava surgindo como o produto básico no país, situação que perduraria a partir de então. O quadro 7 oferece um panorama geral da evolução:

Quadro 7.
Exportação Brasileira até 1931 (valores em Libras de 1950)

Milhões de libras

% do café no valor total

% do segundo maior produto

nominal

valores de 1950

1821

4,3

9, 4

16,3

25,3 (+)

1829

2,1

4,6

20,5

37,2

1830

3,3

7,4

19,8

36,7

1940/1

5,3

10,4

42,7

28,5

1850/1

8,1

21,5

48,1

23,3

1860/1

13,2

25,0

64,7

-

1870/1

15,4

34,0

50,3

-

1872/3

22,3

45,0

37,6

14,7

1880/1

21,2

51,0

54,6

-

1890

26,3

75,0

50,3

-

1900

33,1

90,0

67,7

-

1910

63,0

160,0

42,3

39,1 (++)

1920

82,3

67,5

49,1

6,0 (+)

1929

94,8

156,0

71,0

-

1930

6,7

130,0

62,6

-

1931

49,5

122,0

68,9

-

(+) açúcar (++) borracha

Fontes: IBGE, Anuário Estatístico, 1940 e 1966; APEC, Estudos, A Economia Brasileira e suas Perspectivas, 4 volumes; e Oliver Onody, A Inflação Brasileira 1820-1958 (Rio, 1960) para o índice de conversão em libras para 1950.

Minas Gerais era ainda, na passagem do século, o principal produtor de café no país, mas em base muito diferente de São Paulo. É comumente aceito que a fazenda de café em São Paulo era baseada em um sistema de trabalho de tipo contratual e monetário (o colonato), enquanto no resto do país, e especialmente em Minas Gerais, as relações de trabalho eram baseadas em um sistema de parceria. As diferenças entre estes dois sistemas surgem quando os preços caem no mercado internacional nos começos do século XX. O empresário do café, em São Paulo, é mais vulnerável às flutuações de preço que o sistema da parceria e daí porque, de acordo com Delfim Netto, não tenha sido surpresa que a pressão no sentido de uma intervenção do Estado nacional na economia do café partisse de São Paulo.(31) Um regime de estrito liberalismo com relação à indústria do café foi mantido, entretanto, até 1906.

5.3 Centralização Política e Aumento do Poder

Vejamos agora o que ocorre no nível do sistema político. A história política brasileira no século XIX pode ser contada em termos de dois períodos O primeiro, de 1808 a 1841, assiste às lutas pelo estabelecimento de um governo central enquanto poder estável e centralizado. O segundo, a partir de 1841 até a queda do Império, em 1889, foi um período de acentuada estabilidade e n não-contestação da autoridade imperial.

O primeiro período caracteriza-se pelo conflito entre brasileiros e portugueses, que em breve evolui para um conflito entre os partidos "liberal" e "conservador". A dissolução da Assembléia de 1823 significa a vitória dos portugueses, e a abdicação de Pedro I a vitória dos brasileiros . Após a abdicação, o país atravessa um período de rebeliões regionais que o leva à beira da fragmentação. O governo central tem que desenvolver uma capacidade militar relativamente independente das regiões onde se localizam as revoltas, desenvolvendo então um exército regular . Tanto a Marinha como o Exército, no início do Brasil independente, são compostos por portugueses e utilizam-se de forças mercenárias, mas a nacionalização do exército parece ter ocorrido rapidamente . Um decreto reorganizando o exército, em 1831, fixa sua força em 10 mil homens, e o número real oscila entre 15 e 20 mil em todo o século, à exceção do período da Guerra do Paraguai . Havia 35 mil homens em armas em 1865 e 83 mil em 1869, cifra que cai novamente para 15 mil em 1873. Tais dados deixam entrever o desenvolvimento de um exército organizado e profissional após a instabilidade do regime regencial.(32) Isto é demonstrado no quadro 10 de "Atores Políticos do Império", neste volume.

Apenas o Rio Grande do Sul não está completamente pacificado em 1845, e não é por acaso que o homem encarregado dc combater as rebeliões viesse a ser considerado o fundador do exército nacional .

O fim das revoltas regionais e a criação de forças armadas regulares constituíram apenas algumas das realizações governamentais no período. O orçamento federal triplicou nos primeiros dez anos após a independência, e cresceu constantemente ao longo do século. (Ver quadro 8). Não se trata de um simples aumento nominal, pois a moeda brasileira manteve uma relação estável com a libra inglesa durante a maior parte do século XIX.(33) Esse incremento dos gastos governamentais acompanhou de perto a recuperação da economia brasileira na segunda metade do século, devido principalmente ao café, mas que reflete também a crescente capacidade do governo de usufruir dela. O quadro 8 mostra que as despesas governamentais mantiveram uma relação estável e crescente com o comércio exterior, e o quadro 9, de "Política e Sociedade no Brasil Imperial" (elaborado por Vera Maria Pereira Borda) mostra a crescente importância deste comércio como fonte de renda para o governo central.

Quadro 8.
Despesas Governamentais e Exportações no Brasil, Século XIX
(em 1.000 Contos De Réis)

Ano

DESPESAS GOVERNAMENTAIS

EXPORTAÇÕES

DESP/EXP (%)

1823

4.702

20.623

22,80

1831/2

12.836

32.431

29,79

1840/1

19.073

41.672

39,79

1852/3

29.368

73.745

39,87

1860/1

45.950

123.171

37,30

1870/1

83.435

168.000

49,66

1889

138.108

256.095

53,30

FONTE: Dados coligidos por Sérgio de Rocha e Souza e Luís Werneck Vianna. Dados para a equivalência entre moedas brasileira e inglesa são encontrados em Olivar Onody. A Inflação Brasileira (Rio, 1960).

Quadro 9
Receita Pública no Período Imperial

RECEITA

1831/32

1888

Importações

29,5%

61,0%

Interior

42,7%

10,0%

Exportações

6,0%

28,0%

Total (contos de réis)

11.1 milhões

145,2 milhões

Fonte: Vera Maria Pereira Borda, "Independência e subordinação d Economia Imperial", IUPERJ, Documento de Trabalho.

5.4. Representação Política

Quem se fazia representar ante esta estrutura governamental sempre em expansão? Durante o Império certos níveis de renda e propriedades eram requisitos necessários ao exercício de direitos políticos, e Faoro analisa detalhadamente como a Carta de 1823 intencionalmente reduziu a importância da propriedade de terras enquanto critério principal de elegibilidade(34). O número total de eleitores em 1872 anda em torno de um milhão - cerca de 11 %, da população total do país(34). Essa cifra assinala, de maneira muito geral, os limites do sistema político, e o folclore político brasileiro abriga incontáveis histórias a respeito de irregularidades e fraudes eleitorais de todo o tipo - o partido no poder sempre venceu as eleições por ele convocadas e organizadas.

A Assembléia Constituinte de 1823 é considerada como representante das tendências centrifugas mais liberais contrastando com nas tendências centralizadoras do governo imperial Se isto é certo, é de se esperar que o Congresso jamais se tenha tornado um corpo plenamente institucionalizado. Isso se reflete, embora indiretamente, nos dados relativos às alocações de recursos orçamentários ao legislativo apresentados no quadro 10, em "Atores Políticos do Império", neste volume.

O orçamento do legislativo fazia parte do orçamento do Ministério do Império, tendo sempre um volume de recursos bem menor do que os destinados aos gastos com a Família Real, principal item da despesa desse Ministério. As despesas governamentais com o legislativo jamais excederam 1,6% do total, e tenderam a crescer ligeiramente da primeira para a segunda metade do período imperial (a média para o período que vai de 1837 a 1864 é de 0,75%, enquanto a média do período 1864/89 é de 1,10%).(35) Esse leve aumento relativo significou um progresso real, num contexto de crescimento geral do Estado, mas não foi suficiente para compensar a absorção gradual da oposição liberal pelo Estado político. "O que parece ter ocorrido na realidade foi a prática de um mecanismo semelhante ao da reciprocidade vigente no sistema coronelista: da mesma forma que para se manter o coronel cede na autonomia legal ao governo estadual em troca da concessão, por parte deste, de uma autonomia extralegal, o Partido Liberal abre mão de seus princípios básicos em troca da possibilidade de ser esporadicamente convocado pela instituição suprema do regime imperial centralizado para se ocupar do Executivo". Se a filiação partidária dos detentores das posições executivas e legislativas não nos diz quem eles representam, suas origens regionais podem ser um melhor indicador:

Quadro 10.
Províncias de Origem dos Membros dos Gabinetes do Segundo Reinado

de 1840 a 1953

de 1857 a 1871

de 1873 a 1889

Pará

1,75

1,59

-

Maranhão

-

1,59

1,75

Piaui

-

6,35

5,00

Ceará

-

-

2,50

Paraíba

-

-

2,50

Pernambuco

12,28

14,28

10,00

Sergipe

-

-

2,50

Bahia

26,32

34,92

22,50

Minas Gerais

19,30

7,94

32,50

São Paulo

7,02

7,94

2,50

Santa Catarina

1,75

1,59

-

São Pedro (Rio Grande do Sul)

-

1,59

2,50

Total Brasil (100%)

37

63

40

Este quadro sumaria os dados detalhados no quadro 11 apresentados em "Atores Políticos do Império", neste volume.

O quadro dificilmente poderia ser mais marcante. Enquanto o centro de gravidade econômico e social se desloca para o Sul, a base política do governo se desloca para o Norte, São Paulo e Rio Grande do Sul estão manifestamente sub-representados, e não é por acaso que estes dois Estados irão se tornar os sustentáculos da República. A diminuição da participação do Rio de Janeiro provavelmente reflete o crescente abrasileiramento da elite política, que tende a ser recrutada principalmente na aristocracia mais tradicional do Norte e Nordeste. Todavia, tudo parece indicar que esse recrutamento envolve muito mais um processo de cooptação do que de representação política.

A alienação política das fontes de riqueza é paralela à resistência enfrentada pelo exército na tentativa de assegurar para si um papel político mais ativo. O fim do Império dá-se através de um golpe militar incruento, abrindo caminho para uma tentativa de descentralização política, e para o estabelecimento de uma relação menos imprecisa entre poder político e desenvolvimento econômico e social.

6. Descentralização Republicana

O período Republicano caracteriza-se por uma ascendência das províncias, agora Estados, ao controle da arena política. São Paulo transforma-se num ator principal, e, lado a lado com Minas Gerais, sustenta a eleição de todos os presidentes até Washington Luiz em 1926.

A história política desse período é, sem dúvida, bem mais complexa do que aparece aqui, e não é o caso de analisá-la agora.(36) Pretendemos apenas acentuar alguns fatos comumente deixados de lado na análise desse período.

Primeiramente, a descentralização republicana não significou uma ampliação substancial da participação eleitoral. Maria Antonieta Parahyba mostra como outros fatores correlacionados com o processo de modernização crescem muito mais que os níveis de participação eleitoral,(37) e a inquietação social nos principais centros urbanos cresce continuamente a partir de 1920.

Em segundo lugar, o Exército era um ator muito importante nas decisões políticas da República Velha. Foi o Exército que tomou o poder em 1889, com Deodoro, e foi um general quem o sucedeu, Floriano. A campanha do candidato Rui Barbosa contra o General Hermes da Fonseca em 1910 foi feita em termos de oposição civilista. Hermes é o último representante ilustre da velha geração militar no executivo nacional, mas, a partir dos anos 20, uma nova safra de jovens militares dá início à sua duradoura carreira de atuação política.(38)

Em terceiro lugar, o peso cada vez maior do Estado de São Paulo não levou a uma representação plena na área do executivo nem mesmo neste período. Pode-se argüir que o governo central não era demasiadamente importante, dada a descentralização operada, mas se isto foi verdade em algum momento já tinha deixado de sê-lo nos anos 20.(39) A despeito do fato de o Partido Republicano Paulista ter apoiado todos os candidatos presidenciais eleitos a partir de 1898, e ter dado forma à "política dos governadores" com Campos Sales, de seus sucessores somente Rodrigues Alves e Washington Luiz eram paulistas, tendo o primeiro um colorido fortemente monarquista. A ausência do poder de 1906 a 1926(40) foi fortemente ressentida no Estado e a revolução de 1924 em São Paulo é talvez o melhor indício deste fato. Esta revolta militar teve todo o apoio da Câmara de Comércio de São Paulo, e o depoimento de seu presidente, José Carlos de Macedo Soares, merece uma citação em extenso:

"Tinha São Paulo o direito de abandonar a Federação ao domínio - por vezes exclusivo - de estadistas menos adiantados, de permitir a politicagem utilitária do "empreguismo", desanimando todas as coragens cívicas, pelo apoio sistemático aos mandões regionais, pela expropriação injusta dos mandatos? Pois bem: a abstenção de São Paulo não se limitou aos cargos de nomear, que têm constituído o alvo e a ambição de quase todos os homens públicos do país. Perdemos totalmente a influência legislativa, tanto na Câmara Federal quanto no Senado. Fomos completamente excluídos de um dos poderes da República, pois no Supremo Tribunal Federal, a esta hora não há um único juiz de São Paulo. Entretanto, deles dizia Rui Barbosa: 'Podemo-nos consolar da fraqueza de seus políticos, ao menos, com a serenidade impoluta dos seus magistrados'. Não temos um só representante no Conselho Superior do Comércio. Na Diplomacia, como na Magistratura, na Marinha, como no Exército, nos poderes do Estado, por toda parte, em todos os postos de influência e de autoridade, São Paulo está sistematicamente excluído".(41)

O que mais lhe importava não era a falta de instrumentos para uma política de clientelismo e apadrinhamento, tão essencial em um sistema em que o poder emana do acesso aos instrumentos de administração. O problema principal era ter-se negado a São Paulo a representação política adequada através da qual os objetivos de sua elite pudessem ser alcançados. Não era, assim, uma simples questão de discriminação regional, mas o confronto de dois estilos e objetivos políticos distintos e conflitantes. O resultado, mais uma vez, foi a vitória da cooptação sobre os esforços de representação.

6.1 A nova centralização e depois.

A sociedade e a política brasileira tornam-se cada vez mais complexas e menos estudadas a partir de 1930, e podemos interromper aqui este apanhado histórico. Voltemos à Revolução de 30, e um rápido exame de alguns resultados eleitorais pode ajudar-nos a entender melhor o seu significado. As eleições presidenciais durante a República Velha raras vezes foram competitivas (Rodrigues Alves em 1902, Afonso Pena em 1906, Epitácio Pessoa em 1918, Washington Luiz em 1926) e, quando competitivas, as divisões eram essencialmente regionais. Rui Barbosa, duas vezes derrotado em eleições presidenciais, tinha suas bases políticas na Bahia, e Getúlio Vargas, em 1930, foi sustentado por Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba. O quadro 11 apresenta dados para uma comparação entre as três últimas eleições competitivas da República Velha.(42)

Estes dados são incompletos, e qualquer conclusão é tentativa. 1910 mostrou certa competição intra-estadual localizada, principalmente, nos Estados do Sul (São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande deram uma média de 73,3% de seus votos a seus candidatos preferidos), uma situação que não voltou a se repetir em 1914, quando Rui Barbosa foi apoiado apenas pela Bahia. O comparecimento eleitoral mostrou um aumento pequeno mas persistente durante o período, caindo entretanto para 2,06% em 1926 (uma eleição sem oposição), e mais que duplicando em 1930. A eleição de 1930 foi mais competitiva que as anteriores ao nível estadual, particularmente na cidade do Rio de Janeiro onde o candidato vencedor obteve apenas 51 % dos votos. Em geral, no entanto, o padrão é o mesmo, tanto nos Estados da situação quanto nos da oposição, com uma característica a mais: o nível de participação eleitoral aumentou, principalmente nos Estados da oposição. Isso apenas vem confirmar a proposição geral de que a competição política tende a ampliar a extensão do conflito político, denotando um afastamento radical do padrão de abertura politica extremamente limitada até então dominante.(43) O sistema politico baseado no domínio dos Estados mais tradicionais não pode mais se sustentar; contudo, ao invés de o centro poder deslocar-se para São Paulo, esse Estado, novamente, é o grande perdedor. O regime de Vargas transfere ainda mais a fonte de poder dos Estados para o executivo, e aumenta a participação dos militares e a dependência das oligarquias regionais em relação ao governo central.(44)

Quadro 11.
Eleições Competitivas na República Velha

1910

1914

1930

Estados em oposição

São Paulo, Bahia, Rio de Janeiro

Bahia

Minas, Bahia, R. Grande Sul

Candidato da oposição

Rui Barbosa

Rui Barbosa

Getúlio Vargas

Média das percentagens de votos do candidato vencedor nos Estados da situação

89,5 (16 Estados)

95,60 (10 Estados)

85,44 (9 Estados)

Média das percentagens de votos do candidato da oposição em seus Estados

73,75 (Bahia e São Paulo)

62,21 (1 Estado)

84,83 (3 Estados)

Média das percentagens de votos dos candidatos vencedores em cada Estado

87,79 (18 Estados)

94,00

85,29

Percentagem de votantes sobre a população total.

1,64%

2,14%

5,10%

Em 1932 assistimos ao fim da esperança de que o novo regime não traria nenhuma mudança radical, e muitos dos que apoiaram Vargas em 1930 estão agora atrás das barricadas de São Paulo.(45) As tendências para uma concentração cada vez maior de poder nas mãos do executivo, intensificando a participação da União na vida econômica e social, a continua cooptação das lideranças políticas autônomas em todos os níveis e a subordinação do processo econômico ao processo político, serão firmemente estabelecidas durante o regime de Vargas, e, realmente, não mais alteradas desde então. Ao mesmo tempo, entretanto, as divisões regionais se transformam gradualmente em clivagens nacionais, num processo que começa no Rio e permanece essencialmente como um fato urbano. Essa combinação entre uma forte centralização e uma política "plebiscitária" parece estar na base do populismo a partir do final da década de trinta.

7. Conclusões: algumas implicações teóricas

Os fatos históricos são únicos, e não é possível chegar a conhecer um fenômeno político específico sem estar familiarizado com suas particularidades. Isso vale tanto para o Brasil como para qualquer outro país, mas esse estudo não pretende ser uma análise da "singularidade" de nossa história. Ao contrário, o objetivo é identificar, na aparente singularidade e complexidade de nossa história política, padrões que possam ser divisados em um alto nível de abstração, e cuja combinação compõe a realidade específica que estamos tentando descrever. Já tratamos em outra parte de algumas questões conceituais e proposições mais gerais para a análise da politica brasileira(46) , e esta conclusão se referirá tão somente aos pontos que parecem ser mais diretamente relevantes ou que foram melhor elucidados ou levantados pela análise histórica anterior, em função do modelo analítico apresentado no início.

Em primeiro lugar, as limitações de uma abordagem exclusivamente "desenvolvimentista" do processo sócio-político são visíveis. O processo de mudança política não pode ser entendido seja como uma conseqüência do processo de modernização (como insinuam os que consideram 1930 uma revolução de "classe média") seja através do processo de desenvolvimento econômico, ou acumulação de capital (como afirmam os teóricos da revolução "burguesa"). Há uma esfera específica do poder político que cresce em tamanho e muda suas fontes de energia através do tempo. As ligações entre este processo político e o que acontece em outras esferas da sociedade é um problema de pesquisa empírica. No Brasil, a tendência parece ter sido a existência de um baixo nível de correspondência entre as esferas sócio-econômica e política.

Em segundo lugar, parece claro que a questão não consiste em saber qual tipo de explicação é melhor, mas quanto cada uma delas pode explicar de uma dada situação. Uma abordagem desenvolvimentista de um certo tipo acarreta unia série de conseqüências a fazer dela um quase modelo, e parece e a realidade específica que estamos tentando descrever. Já tratamos em outra parte de algumas questões conceituais e proposições mais gerais para a análise da politica brasileira(46) , e esta conclusão se referirá tão somente aos pontos que parecem ser mais diretamente relevantes ou que foram melhor elucidados ou levantados pela análise histórica anterior, em função do modelo analítico apresentado no início.

Em primeiro lugar, as limitações de uma abordagem exclusivamente "desenvolvimentista" do processo sócio-político são visíveis. O processo de mudança política não pode ser entendido seja como uma conseqüência do processo de modernização (como insinuam os que consideram 1930 uma revolução de "classe média") seja através do processo de desenvolvimento econômico, ou acumulação de capital (como afirmam os teóricos da revolução "burguesa"). Há uma esfera específica do poder político que cresce em tamanho e muda suas fontes de energia através do tempo. As ligações entre este processo político e o que acontece em outras esferas da sociedade é um problema de pesquisa empírica. No Brasil, a tendência parece ter sido a existência de um baixo nível de correspondência entre as esferas sócio-econômica e política.

Em segundo lugar, parece claro que a questão não consiste em saber qual tipo de explicação é melhor, mas quanto cada uma delas pode explicar de uma dada situação. Uma abordagem desenvolvimentista de um certo tipo acarreta unia série de conseqüências a fazer dela um quase modelo, e parece ocorrer que muitos desses modelos podem ser aplicados simultaneamente em diferentes circunstâncias. Vejamos algumas possibilidades. Uma das alternativas possíveis se dá entre modelos "cataclísmicos" e "estratégicos" de explicação, o primeiro determinista e o segundo incluindo elementos de escolha(47). Estes dois modelos podem ser entendidos simplesmente como duas maneiras diferentes dc olhar as mesmas coisas, mas, enquanto o primeiro tende a focalizar a esfera decisória (que é principalmente política) como determinada por processos "externos", o segundo se atém mais especificamente ao processo decisório a partir da suposição de que os graus de liberdade são muitos e relevantes. É importante determinar, numa situação histórica dada, quanto do processo global é decidido em um determinado centro de decisão e em que medida é independente deste, sendo função, então, de circunstâncias fora de controle ou de outros centros de decisão não controlados.(48)

Fizemos referência a três processos distintos de crescimento: um através de um padrão tradicional-moderno; outro através de um continuum pré-industrial-industrial, e o terceiro através de um continuum de crescimento e diferenciação do Estado. Mostramos como os dois processos aparecem como modelos alternativos de explicação da Revolução de 1930, dentro da historiografia. O primeiro supõe uma participação crescente dos setores médios modernizantes na vida política, e o problema político correspondente é o da integração desses grupos emergentes na vida política. Um dos caminhos são os governos de tipo populista, mas suas limitações são bem conhecidas, e diferentes espécies de mobilização de tipo fascista, tecnocrático e/ou regimes coercitivos são prognosticados. O modelo do continuum pré-industrial-industrial se atém mais estritamente aos limites e possibilidades de produção econômica, tendo como variáveis essenciais as características do mercado internacional quando o setor exportador-importador é importante. Esse modelo tende a excluir explicações especificamente políticas até o momento em que se localiza um ponto de estrangulamento econômico, quando então se tende a interpretar a participação governamental nas atividades políticas como completamente dependente das necessidades econômicas. O terceiro modelo possível, bem menos freqüente na literatura, é a abordagem especificamente política que, no caso do Brasil, tenderia a ver seu sistema político como decorrente do estado mercantilista dos séculos XVIII e XIX, e toda a análise política subseqüente sendo feita em termos dos conflitos entre suas tendências centralizantes e as demandas de representação política dos grupos sociais e econômicos emergentes. O que a análise acima sugere é que qualquer desses modelos tem uma aplicabilidade parcial ao caso brasileiro e a questão empírica mais interessante diz respeito ao seu domínio específico e à sua interação.

O terceiro ponto geral decorrente consiste na descrição das clivagens mais importantes na política brasileira. Em primeiro lugar, a separação entre centro e periferia política, uma tendência centralizante e outra descentralizante. Essa separação pode ser desdobrada em duas direções. Primeiro, há a separação entre os setores mais burocráticos e tecnocráticos e a "classe política" que assume o papel de intermediária entre o governo e os interesses locais e regionais. O segundo desdobramento diz respeito ao setor da sociedade que é dependente do governo central e o setor que não o é. O primeiro setor inclui tanto a "classe política" como a administração técnica e burocrática; e o segundo, os setores econômica e institucionalmente autônomos. Essa divisão coincide com a divisão regional entre a área de São Paulo e o resto do país, no que se refere à participação política. Essa divisão regional assume diferentes aspectos para grupos diferentes: divisão entre interesses liberais e interesses econômicos protecionistas, entre corporativismo e sindicalismo, entre formas paternalistas e formas carismáticas de mobilização política popular.

Existem dois tipos de questões inter-relacionadas que não puderam ser examinadas em profundidade aqui. A primeira refere-se ao exame teórico do possível cenário político que decorreria de um predomínio das estruturas de representação sobre as de cooptação na história política brasileira. Se a falência da política civil no Brasil é uma decorrência do predomínio histórico dos sistemas de cooptação, será que a vitória da Revolução de 1932, por exemplo, não teria criado as bases para um regime representativo de apoio civil mais estável e eficaz? A resposta a esta questão é problemática, mas é bastante provável que ela tenda a ser negativa, por uma série de razões. Primeiro, parece bastante evidente que o liberalismo ideológico ligado à economia exportadora e à industria paulista não seria capaz de, por si mesmo, levar à frente um processo de desenvolvimento econômico sem a ajuda do Estado. Depois, o processo de modernização social tende a ser, e tem sido no caso do Brasil, muito mais rápido que o de crescimento econômico, autônomo ou induzido, fazendo com que estilos políticos populistas tendam a predominar quando o sistema de participação se mantém aberto. O populismo carismático (mais ligado ao. processo de crescimento econômico) e paternalista-fascista (mais ligado ao processo de crescimento do Estado) são ambos disfuncionais para um estilo de participação. política que se pretenda eficaz.(49) Finalmente, as possibilidades de aberturas e contatos internacionais parecem conduzir a um "esvaziamento" político das elites econômicas mais ativas.

Este é, pois, o segundo tipo de questões que não pudemos desenvolver suficientemente: o dos efeitos da situação de dependência do país ante o sistema internacional. A vinculação da economia brasileira de exportação ao mercado internacional pode ter sido um dos fatores principais na determinação de um liberalismo à outrance nos seus setores mais dinâmicos, que buscariam no Estado pouco mais que a função policial do liberalismo europeu do século passado. Esta internacionalização prematura da economia seria, assim, um dos principais determinantes da ausência de uma ideologia nacionalista e desenvolvimentista entre os representantes das classes empresariais brasileiras. Quem desenvolve este "projeto" é, na realidade, o Estado Novo, levando muitos a considerarem, por implicação, que o Estado Novo representava os interesses objetivos (mas inconscientes) da burguesia.

Seria importante poder levar à análise dos fenômenos de dependência a consideração dos três processos de transformação a que viemos nos referindo, assim como suas inter-relações e domínio relativo. Haveria que distinguir os setores econômico, governamental e cultural (ou ideológico, ou valorativo), tanto no pólo dominante quanto no pólo dependente, e examinar as conseqüências das diversas combinações. É evidente que a dependência do Império Brasileiro ante a casa Rotschild deve ter tido conseqüências política distintas da dependência de setores da economia brasileira à política fiscal e de importação do governo norte-americano. Cada um destes setores possui graus distintos de liberdade de ação, e a análise desta matriz complexa de interações e domínio pode levar a resultados bem mais proveitosos que a simples constatação de um fenômeno de dependência internacional global e indiferenciado.

Por mais importantes que sejam as questões de dependência, elas não devem obscurecer o fato de que a política brasileira tem uma dinâmica interna própria que deve ser conhecida em seus aspectos fundamentais e que determina, em grande parte, a colocação do país no contexto internacional. Os limites desta autonomia não são conhecidos, mas há tão poucas razões para acreditar em uma autonomia completa quanto em supor que toda a nossa história não passa, na realidade, de um jogo de fantoches feito por mãos alheias.

Notas:

1. Reinhard Bendix, "Social Stratification and the Political Community", em R. Bendix e S. M. Lipset, (ed). Class, Status and Power, 2ª edição, New York, Free Press, 1966.

2. Mais especificamente, para Hegel a sociedade civil é o fenômeno do Estado, enquanto que o Estado é a idéia da Sociedade. A Idéia se apresenta na forma do Soberano e da Constituição, e a mediação entre esta forma particularizada da idéia e a sociedade é realizada por instituições intermediárias, tas como a opinião pública e a representação de grupos civis no Estado, a burocracia, etc. Esta concepção hegeliana do Estado está desenvolvida em Jean Hippolite, Études sur Marx et Hegel, Paris, Marcel Rivière, 1965 (que, por sua vez, baseia-se no trabalho clássico de Luckácz sobre o jovem Hegel.

3. Veja Karl Marx, Crítica à Filosofia do Estado de Hegel, que é uma análise detalhada da Filosofia do Direito de Hegel.

4. Observe-se, no entanto, que os interesses particulares da burocracia são importantes nesta analise, ou seja: a relação entre o Estado e a classe dominante não é imediata. Vale a pena citar: "A burocracia tem em seu poder o ser do Estado, o ser espiritual da sociedade: ela é sua propriedade privada. O espírito geral da burocracia é o mistério, guardado pela hierarquia da vista de estranhos pela sua estrutura de corporação privada. A revelação do espírito do Estado à opinião pública é percebida pela burocracia como traição ao seu mistério. A autoridade é, assim, o princípio de sua ciência, e a idolatria da autoridade o seu sentimento. Mas, dentro da própria burocracia, o espiritualismo se transforma em um materialismo sórdido, o materialismo da obediência passiva, da fé na autoridade, do mecanismo de uma atividade formal fixa, de princípios, idéias e tradições fixas. Para o burocrata tomado como indivíduo, os objetivos gerais do Estado transformam-se em seu objetivo pessoal: a caça às posições mais altas, é necessário subir na vida (traduzido livremente de Marx, Oeuvres Philosophiques, ed. Molitor, vol. IV, p.103).. Toda esta riqueza de interpretação dos fenômenos de burocratização é obscurecida quando se opera a identificação imediata entre Estado e interesses de classe, para surgir novamente muito mais tarde, e de forma paradoxal. em oposição ao marxismo, como por exemplo em Michels.

5. Veja a discussão a este respeito. em termos das ciências sociais contemporâneas, em Simon Schwartzman, "Desenvolvimento e Abertura Politica", Dados 6, 1969.

6. O conceito de "Modo Asiático de Produção" aparece na literatura marxista para designar um sistema sócio-econômico em que o Estado desempenha um papel ativo na organização direção e controle da vida econômica. 0 termo "asiático" explica-se pelo fato de este tipo de organização social ter sido estudado inicialmente nos grandes Impérios orientais que se organizaram no passado a partir de grandes sistemas de irrigação de terras. Não há razão, entretanto, para que fenômenos de organização burocrática e governamental da atividade econômica não sejam estudados de forma mais generalizada. As vicissitudes deste conceito dentro do marxismo, ocasionadas principalmente pela implicação de "asiatismo" que traz necessariamente ao estado soviético é discutida em detalhe por Karl A. Wittfogel, Oriental Despotism. Yale University Press 1957 capitulo 9. A respeito veja também a discussão de Luís Werneck Vianna em "Política e Sociedade no Brasil Imperial", neste volume. Para o conceito em Marx veja os Fondements de la Critique de L'Économie Politique, tradução francesa de Roger Dangeville Ed., Anthropos, Paris 1967 p. 435 e seguintes.

7. David Apter, "Notes for a Theory of No-n-Democratic Representation", em Some Conceptual Approaches to the study of Modernization, Prentice Hall Inc, 1968.

8. ibidem

9. Torcuato S. Di Telha, "As Formas do Populismo", em Para uma Politica Latino-Americana, Rio, Paz e Terra, 1969.

10. Cf. "Desenvolvimento e Abertura Política, Dados 6, 1969.

11. Para uma exposição sintética do modelo parsoniano, visto do ponto de vista do subsistema político, veja Talcott Parsons, "On the Concept of Political Power", em S. M. Lipset e R. Bendix, Class, Status and Power, 2 edição, New York, Free Press, 1966, pp. 240-265.

12. "Cleavage Structures, Party Systems and Voter Alignments: An Introduction", em S. M. Lipset e S. Rokkan, Party Systems and Voter Alignments, New York, Free Press, 1967.A exposição que se segue dá somente uma pálida idéia do modelo desenvolvido pelos autores. Tratamos de manter tanto quanto possível as referências ao "AGIL", para os iniciados, ainda que as referências aqui devam ser inteligíveis independentemente; não há nenhum esforço, na realidade, em compatibilizar o que aqui se diz com o sistema parsoniano, mas simplesmente em utilizá-lo na medida em que nos parece útil.

13. David Apter, The Politics of Modernization (Chicago: The University of Chicago Press, 1965)

14. Nestor Duarte, A Ordem Privada e a Organização Política Nacional (São Paulo, Companhia Editora Nacional, Coleção Brasiliana, vol. 172, p. 169.

15. A Ordem Privada..., pp. 188-9.

16. Raymundo Faoro, Os Donos do Poder - A Formação do Patronato Político Brasileiro (Porto Alegre: Editora Globo, 1958), pp. 53 a 65.

17. Cf. Celina do Amaral Peixoto Moreira Franco Lúcia Lippi Oliveira e Maria Aparecida Alves Hime, "O Contexto Político da Revolução de Trinta", neste volume, para a determinação de duas linhas de interpretação da Revolução de 30 a da "revolução burguesa" e a da "revolução das classes médias". Os representantes da alternativa burguesa são entre outros Nelson Werneck Sodré (Formação Histórica do Brasil, São Paulo, Ed. Brasileira, 1962), Wanderley Guilherme dos Santos (Introdução ao Estudo das Contradições Sociais no Brasil, Rio de Janeiro ISEB 1963) e Octávio Ianni. A recente tese de Bóris Fausto (1930, Historiografia e História, Universidade de São Paulo, mimeografada) se dedica a demonstrar que, pelo menos na área de São Paulo não há confirmação para um sentido "burguês" na Revolução de 30 Octávio Ianni entretanto tomou precauções antecipadas quanto a esta possibilidade de refutação empírica de sua tese: "a Revolução de 30, a despeito de não ter sido alimentada preponderantemente pelas burguesias industrial e financeira nascentes, nem pelo proletariado incipiente, deve ser interpretada como um momento super-estrutural da cumulação primitiva, que funda a industrialização posterior" (Estado e Capitalismo, Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1965 pp. 135-6) Esta afirmação baseia- se no fato de que houve um surto industrial no Brasil depois de 1930. Este tipo de explicação ex post-facto é, evidentemente, irrefutável, mas não deixa de colocar seu autor em dificuldades quando se trata de explicar por que o centro da oposição a Vargas estava precisamente em São Paulo A saída foi dizer que esta oposição, e especificamente a Revolução de 1932, "não é um movimento contra revolucionário senão com referência aos ideais dos componentes não-burgueses da Revolução de 30" (p 138)

18. Os teóricos da tese das classes medias incluem a Virgínio de Santa Rosa (O Sentido do Tenentismo, 1932(?), reeditado como Que foi o Tenentismo? Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1963), Guerreiro Ramos (A Crise do Poder No Brasil, Rio de Janeiro, Zahar, 1961), e Hélio Jaguaribe (Desenvolvimento Econômico e Desenvolvimento Político, Rio de Janeiro, Ed. Fundo de Cultura, 1962). Veja, para um sumário desta perspectiva, o trabalho de Celina Moreira Franco, Lúcia Lippi Oliveira e Maria Aparecida Hime, neste número.

19. A tese das "classes médias" comparte com a tese da "revolução burguesa" o dom da irrefutabilidade. Fora dos extremos superior e inferior da sociedade, todos são "classe média", um truísmo que não tem demasiado valor explicativo. A insistência em teorias de "classes médias" para a explicação de movimentos sociais na América Latina, incluindo a presença dos militares na arena política, é provavelmente uma seqüela de um esquema conceitual que não consegue sair das poucas alternativas de explicação baseadas em três ou quatro classes sociais e suas permutações. "Classes médias" ou, melhor ainda, "setores médios", é uma categoria residual que pode ser usada quando as outras explicações classistas evidentemente não o podem. Mas este tipo de pseudo-explicação vem algumas vezes de algo mais profundo de que esta dificuldade teórica e conceitual, como estamos vendo.

20. Azevedo Amaral, O Brasil na Crise Atual (São Paulo, Companhia Editora Nacional, Col. Brasiliana n 31, 20 1934). Para uma bibliografia completa e uma analise em profundidade de sua obra, veja o trabalho de Aspásia Brasileiro Alcântara, "A Teoria Politica de Azevedo Amaral", Dados 2/3, 1967. Para um panorama de nomes e temas na história do pensamento social brasileiro, veja Wanderley Guilherme dos Santos, "A Imaginação Político-Social Brasileira", Dados 2/3, 1967.

21. Esta é evidentemente uma simplificação de uma situação muito mais complexa, A Revolução de 30 obteve substancial apoio em São Paulo por parte da oposição interna manifesta nos esforços de articulação do Partido Democrata, e utilizou em seu proveito a crise do café no mercado internacional. Paulo Nogueira Filho descreve em detalhes seus esforços para arregimentar apoio paulista para os setores revolucionários mais radicais, mas também seu fracasso, levando o ao rompimento com Prestes. O esforço da política paulista em romper o pacto republicano existia tanto entre o grupo minoritário dos "burgueses progressistas" quanto au por parte da velha oligarquia representada pelo continuísmo paulista de Washington Luís. Cf. Paulo Nogueira Filho, Idéias e Lutas de um Burguês Progressista, (Vol. I, O Partido Democrático e a Revolução de 1930), Rio Ed. Olympio, 2a ed., 1965. Estas contradições internas da política paulista perderam importância, no entanto, ante a intervenção do Governo Provisório no Estado levando à frente unida da Revolução de 1932.

22. Muitos autores têm sugerido distinguir dois polos na sociedade brasileira, incluindo Jacques Lambert (Os Dois Brasis, Rio. CBPE, 1950 ). e Ignácio Rangel (Dualidade Básica da Economia Brasileira, Rio, ISEB, 1959). Todos tendem a referir-se, com diferentes graus de refinamento e engenho, a um continuum ou polaridade tradicional-moderno. Houve quem levantasse a idéia de um "imperialismo interno" de São Paulo, que se opunha ao dito da locomotiva puxando os 20 vagões. Octávio Ianni discute esta questão sob o título de "falsas dualidades", dizendo, entre outras coisas, que "o conceito de dualidade retira a historicidade da história, tomando o objeto presente em sua existência manifesta". O que ele parece querer dizer é que não tem sentido falar em dois polos distintos, já que "nenhuma economia capitalista, subdesenvolvida ou não, é perfeitamente integrada". A impressão permanece, no entanto, de que o problema que este autor discute é principalmente semântico, e a utilidade em distinguir diferentes polos e linhas de mudança e crescimento parece ser bem alta, exatamente porque "nenhuma economia capitalista" (nem qualquer outra) "é perfeitamente integrada". (Estado e Capitalismo, pp. 80/81).

23. Francisco C. Weffort, por exemplo, depois de dizer que "é evidente que as condições paulistanas são especificas de uma grande cidade industrial que ocupa posição única no Brasil", afirma que, "exatamente por ser uma metrópole, ela se constitui em 'modelo' para a análise da política de massas no Brasil". ("Política de Massas", em Octávio Ianni e outros, Política e Revolução Social no Brasil, Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1965 pp. 178-9). O fato de que a metropolização de São Paulo tenha ocorrido simultaneamente com um processo igualmente rápido de industrialização é entretanto muito especial dentro do Brasil, o que torna problemática qualquer generalização a partir deste caso. As diferenças que Weffort estabelece entre dois tipos de populismo em São Paulo, o de Jânio e o de Ademar, parecem co corresponder ao fato de que Ademar era, originariamente, o representante do regime Vargas em São Paulo, dando-lhe aquele aspecto paternalista que contrasta vivamente com o populismo carismático de Jânio Quadros.

24. Fernando A. Novais, "O Brasil nos Quadros do Antigo Sistema Colonial", em Manuel Nunes Dias e outros, Brasil em Perspectiva. Veja também a discussão conceitual em Antônio Octávio Cintra, "A Função Política no Brasil Colonial". Revista Brasileira de Estudos Políticos 18, 1965, e a análise de Faoro, Os Donos do Poder.

25. Depois de descrever as causas do declínio econômico na área do açúcar, Celso Furtado diz que "esses fatores contribuíam para a reversão cada vez mais acentuada a formas de economia de subsistência, com atrofiamento da divisão do trabalho, redução da produtividade, fragmentação do sistema em unidades produtivas cada vez menores, desaparição das formas mais complexas de convivência social, substituição da lei geral pela norma local etc." (Formação Econômica do Brasil, Rio e Lisboa, Editora Fundo de Cultura, 1959, p 87).

26. Para uma análise da colonização espanhola veja Magali Sarfatti, Spanísh Bureaucratic Patrimonialism in America (Berkeley: Institute of International Studies, University of California, 1966).

27. Celso Furtado, Formação Econômica do Brasil, p. 129.

28. Veja, para a imigração européia no Brasil, Manuel Diegues Jr., Imigração, Urbanização e Industrialização (Rio de Janeiro: Centro Brasileiro de pesquisas Educacionais, 1964), e, para os dados sobre o tráfico de escravos, a análise de Emília Viotti da Costa, Da Senzala à Colônia (São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1966). Uma estimativa da taxa de crescimento da população escrava em Minas Gerais para o principio do século é de 1,3% para homens e 0.7% para mulheres. Veja a respeito o estudo de Herbert S. Klein sobre a população negra livre e escrava no Brasil, "The Colored Freedmen Under Brazllian Slavery A preliminary Analysis" (Universidade de Chicago, mimeografado, 1967).

29. Dados coligidos por Hélio Mathias, em várias fontes, a ser publicado como Documento de Trabalho pelo IUPERJ.

30. Virgílio Noya Pinto, "Balanço das Transformações Econômicas no Século XIX", em Manuel Nunes Dias e outros, Brasil em Perspectiva (São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1969), p. 132. Os dados acima são da mesma fonte.

31. Veja Antônio Delfim Netto, O Problema do Café no Brasil (São Paulo: Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade de São Paulo, Cadeira III, 1959. pp. 43-44). A comparação entre os sistemas de "colonato" e de "parceria" se baseia em Augusto Ramos, "A Intervenção do Estado na Lavoura cafeeira", em O Café (Rio de Janeiro, Departamento Nacional do Café, 1934).

32. Uma breve história da criação do exército brasileiro é dada por Eurípedes Simões de Paiva, "A organização do Exército Brasileiro", em Sérgio Buarque de Holanda (ed), História Geral da Civilização Brasileira, t. II. vol. I, pp. 265-277. Uma descrição detalhada da criação da Marinha de Guerra é dada por Prado Maia, A Marinha de Guerra do Brasil na Colônia e no Império (Rio, José Olympio, 1965), que dá um quadro bem nítido de suas origens portuguesas. Para os efetivos militares no século XIX veja os dados coligidos por Olavo Brasil de Lima Jr., e os constantes nos Relatórios da Administração do Ministério da Guerra. 0 exército nacional quase nunca esteve em perfeita harmonia com a elite civil, que tratou sempre de controlar sua expansão pela criação da Guarda Nacional, no século passado, e das policias estaduais durante a República Velha. Esta história tem, evidentemente, implicações profundas para a compreensão das relações entre civis e militares no Brasil desde o período regencial.

33. Dados para a equivalência entre moedas brasileira e inglesa são econtrados em Olivar Onody, A Inflação Brasileira, Rio de Janeiro, 1960.

33. Os Donos do Poder, pp. 141 e seguintes.

34. Dados levantados e analisados por Maria Antonieta Parahyba, em "Abertura Social e Participação Política no Brasil" (1870 a 1920), neste volume.

35. Dados levantados por Sérgio da Rocha Souza.

36. Para um bom resumo do período veja o trabalho de Maria do Carmo Campello de Souza, "O Processo Político Partidário da Primeira Republica", em Manuel Dias e outros, Brasil em Perspectiva, pp. 163-226. A obra clássica sobre o período é, certamente, de José Maria Bello, História da República, São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1940

37. Veja o quadro 3 de Maria Antonieta Parahyba em "Abertura Social e Participação Política no Brasil", neste volume.

38. A importância do papel político do Exército na Primeira República é uma destas grandes realidades que não encontra cabida em análises meramente classistas do período. A excelente compilação de documentos da época por Edgard Carone (A Primeira Republica, texto e contexto, São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1963). não deixa de evidenciar o importante papel dos militares no período, mas a passagem dos textos à interpretação do contexto não é tão fácil. Uma das quatro partes do livro é dedicada às forças armadas no período. O epílogo, entretanto, tem estas forças armadas como o grande ausente: "A implantação da República é o gesto de uma classe, reivindicação de um grupo em desenvolvimento (. . . ) "A Primeira Republica é o período em que os senhores do café ascendem ao poder, alcançam sua plenitude e depois declinam para seu ocaso." "O governo é a representação de uma (classe) apenas; outras vivem em processo de margínalização" etc. A Primeira República p. 288.

39. Mário Wagner Vieira da Cunha, em seu importante O Sistema Administrativo Brasileiro, considera que a autonomia dos Estados é bastante alta no inicio, caindo, depois da primeira guerra, em função da mudança do centro econômico mundial para os Estados Unidos. "O poder destes grupos (locais de poder), reconhecido na Monarquia, amplia-se na República a ponto de livremente contraírem os Estados empréstimos no estrangeiro, de cobrarem impostos de exportação. criarem barreiras fiscais inter-estaduais e manterem suas próprias forças armadas" (p. 16). A transferência do centro dinâmico da economia mundial para os Estados Unidos, no entanto, fez com que surgisse a "necessidade de um entendimento de nação a nação, caindo quase em desuso o apelo a banqueiros particulares. A conquista da presidência da República apresentou-se como necessidade ineludível para a garantia econômica das oligarquias estaduais" (O sistema Administrativo Brasileiro, Rio, Centro Brasileiro de pesquisas Educacionais, 1963, pp. 19-20).

40. Quanto à ausência da presidência significar ausência de poder está ainda para ser visto. De acordo com a proposição de Mário Wagner Vieira da Cunha, o governo central teria se transformado em objeto de posse essencial para a oligarquia paulista. no inicio dos anos vinte. Diminuída a autonomia estadual, seria necessário ver se os grandes Estados não passaram a controlar de maneira sistemática alguns postos-chave para seus interesses dentro da administração federal. Manuel Olympio Romeiro, Oficial de Gabinete do Ministério da Fazenda no governo Artur Bernardes (1922-4), sai em campo para defender São Paulo das acusações de "filho pródigo da União" e sustenta, com dados abundantes, que, enquanto São Paulo contribuía com um terço, aproximadamente. da receita federal, "é forçoso reconhecer que o Estado de Minas Gerais é, na União Brasileira, o que maiores encargos acarreta aos cofres federais, sendo, portanto. na realidade, aquele que mais pesado se torna ao Tesouro Nacional". Cf. M. Olympio Romeiro, São Paulo e Minas na Economia Nacional, Empresa Gráphica "Revista dos Tribunaes". São Paulo, 1930, p. 4. O autor é ainda testemunha dos conflitos entre a economia paulista e Artur Bernardes em relação à política de valorização do café, levando a que a economia paulista executasse diretamente esta política sem o apoio e mesmo com a relutância do governo federal. É evidente, se isto é assim, que o governo central tinha importância distinta para os dois grandes Estados. Para Minas, dependente do sistema de cooptação, a dependência já era grande na década de 20, mas São Paulo ainda reservava grandes áreas de ação autônoma. Por isto é que. quando São Paulo se rebela mais tarde contra a administração central, esta rebeldia assume o tom de um conflito entre São Paulo vs. Minas, conflito que já se prenuncia no trabalho de Olympio Romeiro.

41. José Carlos Macedo Soares, Justiça - A Revolta Militar em São Paulo, Paris, Imprimèrie Paul Dupont, 1925, 43 p. 12.

42. Dados elaborados em "O Contexto Politico da Revolução de 30", neste volume. É bem sabido que as eleições para este período não refletem os "verdadeiros" sentimentos da população, dados tanto os baixos níveis de participação quanto os altos níveis de fraude. Eles indicam, no entanto, as dimensões da comunidade política e o grau de abertura do sistema à manifestação de oposições.

43. E. E. Schattschneider, The Semi-Sovereign People (Holt, Rienhart e Winstor, 1960), capitulo 1.

44. Benedito Valadares descreve desinibidamente seu papel nos esforços de subjugar a elite política mineira à vontade de Vargas, tanto quanto seu papel na luta contra São Paulo. Veja Benedito Valadares, Tempos Idos e Vividos (Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1966) e meu comentário em Dados 6, 1969.

45. Uma destas pessoas era o gaúcho João Neves da Fontoura, líder da Aliança Liberal. Outro foi o paulista Júlio de Mesquita Filho. Veja João Neves da Fontoura, Memórias, vol. II, "A Aliança Liberal e a Revolução de 30" Porto Alegre, Editora Globo, 1963.

46. Simon Schwartzman, "Desenvolvimento e Abertura política". Dados 6. 1969.

47. Esta distinção é sugerida por Anatol Rapoport ("Two views of Conflict: the Cataclysmic and the Strategic Models", em Proceedings of the International Peace Research Assocíation, Van Gorcum-Assen, Holanda, 1966) como uma forma de contrastar as teorias de jogo com as teorias de tipo Richardson sobre conflitos internacionais.

48. Este ponto é discutido explicitamente por Vera Maria Pereira em relação à interpretação que Faoro dá da vida econômica do Império: "se a tese de Faoro para o período imperial, especialmente para sua segunda metade, é a de que o Estado Patrimonial, através do estamento burocrático, controla inteiramente a economia, e por suas interferências é que o sistema se expande, a tese que propomos é diversa. O Estado não tem condições financeiras para orientar a economia, para investir em atividades modernizadoras; não tem condições políticas externas para decidir sobre alternativas econômicas e não tem condições políticas internas para assumir o controle do sistema, embora tenha condições administrativas bastante desenvolvidas para exercer um mecanismo de repressão, no sentido de impedir o desenvolvimento de uma "independência" político-econômica dos novos setores latifundiários-mercantís em expansão". Isto parece ser mais verdade a respeito da economia rural de exportação que a respeito dos esforços de industrialização e terciarização no século XIX A história de Mauá parece indicar a existência de uma forte interdependência entre a iniciativa privada e incentivos governamentais ou sua falta. Veja entre outros Anyda Marchant, Viscount Maua and the Empire of Brazil (Berkeley and Los Angeles: The Unlversity of California Press, 1965).

49. Theodoro J Lowi chama a atenção paia dois tipos distintos de funções dos partidos políticos e, podemos generalizar, dos sistemas de participação social. A primeira é uma função "constituinte", que tem que ver com a estrutura do regime, e menos com seu funcionamento efetivo. A segunda função é a de "policy~making", relacionada com a condução efetiva da coisa pública. A tese de Lowi é que esta função de execução politico-administrativa nem sempre coexiste com a outra, e a ausência da função executiva é o que diferencia o sistema partidário norte-americano em relação aos dos países da Europa Ocidental. A "eficácia" de um sistema de participação deve ser medida de forma independente nestas duas dimensões. É possível considerar, assim, que o sistema partidário da Primeira República foi eficaz no primeiro sentido, mas não no segundo, o inverso tendo ocorrido com o Estado Novo. O populismo, em suas duas versões, tende a submeter a função constituinte a grandes oscilações, ao tempo em que reduz a função de "policy-making". Cf. Theodoro J. Lowi, "Party, Policy and Constitution in America", em W. Nisbet Chambers e W. Dean Burham, The American Party Systems - Stages of Political Development, Oxford University, Free Press, 1967.

Simon Schwartzman
simon[arroba]schwartzman.org.br
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