O uso de refrigerantes e a saúde humana

Enviado por Mauro Fisberg


1. Introdução

Entre os principais temas polêmicos encontrados no estudo da alimentação do ser humano, um dos mais controversos é o uso do refrigerante por crianças e adolescentes. Nunca, provavelmente, houve tanta discussão entre pediatras, nutricionistas, nutrólogos e outros profissionais da saúde sobre um produto que, seguramente, é de grande aceitação entre os consumidores.

Se, por um lado, a indústria de refrigerantes tem as maiores vendas registradas em todo o setor alimentício, esta bebida, composta na maior parte das vezes por um extrato vegetal ou suco de frutas, gaseificada artificialmente, adoçada por açúcar ou outros edulcorantes, é, sem sombra de dúvida, pouco compreendida pelos profissionais da área da saúde. Inúmeros alimentos artificiais, industrializados há anos, têm livre trânsito nas clínicas, consultórios e ambulatórios ou são pouco combatidos por estes mesmos profissionais, que rechaçam de forma cabal o uso de uma bebida que, na realidade, é utilizada para seu uso próprio, sem qualquer restrição. A análise da literatura e dos conceitos transmitidos de forma anedótica, ou pouco séria, sobre o papel dos refrigerantes na nutrição humana mostra que os principais fatos apontados por estudiosos refletem pontos de vista transmitidos há anos, com pouca base científica e mostram muito mais o modo de pensar individual de cada profissional, que a fria dedução de aspectos científicos. Na maior parte dos protocolos experimentais relacionados ao uso de refrigerantes, verifica-se a dificuldade clara em separar fatores de risco, analisar variáveis de confusão ou o isolamento de possíveis erros amostrais. Alguns aspectos da composição dos refrigerantes podem ser avaliados e questionados por usuários e estudiosos: se a bebida é gaseificada e se isto é inadequado, por que não nos manifestamos contra a utilização universal da água mineral com gás?

Se a bebida é adicionada de açúcar ou sacarose, por que temos argumentos contrários ao uso das mesmas bebidas adicionadas de edulcorantes distintos, naturais ou artificiais, como o sorbitol, aspartame e outros? Se a bebida é calórica, por que nada referimos em relação a alimentos líquidos naturais, tão ou mais energéticos? Se o preconceito é a industrialização, a artificialização de sabores, por que permitimos o uso contínuo de outros grupos alimentares, sem qualquer problema? O mesmo poderia ser dito do uso de corantes, estabilizantes e outros elementos. Por que o alimento mais vendido em todo o mundo, em quase todos os países, em todas as regiões, regimes políticos e tendências, é tão pouco analisado, com praticamente nenhum estudo de longa duração ou metanálise? Cremos que, antes de tudo, exista pouco conhecimento. A postura agressiva de fabricantes e da mídia e a universalização de um conceito essencialmente do mundo ocidental gerou, com certeza, os chamados "anticorpos" por parte dos profissionais da saúde. Estes mesmos profissionais poucas vezes têm idéia de que refrigerantes, na verdadeira função de aliviar a sede, são usados desde a antigüidade. Em inúmeras civilizações da antigüidade, vinho diluído com hidromel e água, cervejas e extratos vegetais eram servidos de uma ou outra forma, para crianças de variadas idades, com o objetivo de aumentar a oferta hídrica ou mesmo como forma de recompensa. Em todas as regiões do mundo, diferentes preparações de bebidas não lácteas têm sido utilizadas, com o objetivo de oferecimento líquido, como forma de hospitalidade ou como complemento a refeições. Chás, tônicos, emulsões, xaropes, néctares e outros tipos de alimentos foram sendo modificados de várias maneiras e ofertados a crianças, adolescentes e adultos. No final do século XIX e princípio do século XX são registrados os primeiros relatos de distribuição maciça de bebidas baseadas em extratos de noz de cola adicionadas de água e adoçantes. A partir daí, o mundo ocidental verificou o aumento extraordinário da difusão de diferentes bebidas gaseificadas artificialmente, com inúmeras marcas e apresentações. O uso universalizado destes refrigerantes, chegando a remotas regiões do planeta, mostra sua aceitação globalizada. E se iniciam os problemas. Estudos têm relacionado o uso de refrigerantes ao aumento de peso, ao aumento de cáries dentárias e à baixa utilização de alimentos fonte de cálcio, com subseqüente aumento da osteoporose e do diabetes, dados esses ainda controversos. Ao passo que associações do uso de refrigerantes com celulite subcutânea, estrias, alterações gastrointestinais e outras não apresentam qualquer comprovação científica. Analisar os aspectos nutricionais e de saúde relacionados ao consumo de refrigerantes é uma das tarefas mais complexas que temos visto no campo da nutrição clínica aplicada e da epidemiologia. Vários fatores inter-relacionados fazem com que a análise dos fatos científicos seja dificultada - a enorme conjugação de fatores de confusão, a impossibilidade de isolar variáveis em estudos com seres humanos e, especialmente, a tarefa hercúlea que é realizar estudos bem conduzidos, de forma prospectiva e neutra, por longos anos, em diferentes populações e diferentes grupos etários. Os refrigerantes, diferentemente de outros grupos de alimentos isolados, têm sofrido a pressão de grandes grupos científicos, comerciais, industriais e de agências governamentais, talvez por seu envolvimento gigantesco com diferentes grupos etários e a enorme diversidade de bebidas disponíveis. Os refrigerantes apresentam o maior volume em vendas em todo o mundo, dentro do campo dos alimentos e seguramente isto gera uma enorme repercussão contrária a interesses multinacionais. No entanto, ater-se aos fatos científicos é a melhor maneira de tentar entender as principais relações entre o consumo de refrigerantes e possíveis repercussões na saúde humana. O presente trabalho tem o objetivo de avaliar a literatura científica sobre refrigerantes, seus usos e possíveis efeitos colaterais e analisar criticamente os aspectos não comprovados desta utilização, especialmente na população em geral. Assim, abordaremos a legislação e analisaremos aspectos da sua composição, características nutricionais e os principais fatores de risco associados a possíveis afecções crônicas e agudas, relacionados ao uso dos refrigerantes por crianças, adolescentes e adultos. Temas polêmicos devem ser abordados e estudados de maneira isenta e sem preconceitos. Esperamos com isto abrir a discussão.

2. Legislação

O decreto nº 2.314, de 4 de setembro de 1997(1), regulamenta a Lei nº 8.918, de 14 de julho de 1994, que dispõe sobre padronização, classificação, registro, inspeção, produção e fiscalização de bebidas. Para os refrigerantes dietéticos, além do decreto acima citado, há ainda a Instrução Normativa nº 30, de 27 de setembro de 1999, da Secretaria de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura e do Abastecimento(2), que é um Regulamento Técnico para Fixação dos Padrões de Identidade e Qualidade para a Bebida Dietética e a de Baixa Caloria, que são fixados em concordância com as normas de competência do Ministério da Saúde. Exclui-se a bebida especialmente formulada para reposição energética, vitamínica, hidroeletrolítica e outras destinadas a fins dietéticos específicos.

1. Refrigerante

Conceitos e composição

Refrigerante é a bebida gaseificada obtida pela dissolução, em água potável, de suco ou extrato vegetal de sua origem, adicionada de açúcares.
Entende-se por bebida todo produto industrializado, destinado à ingestão humana, em estado líquido, sem finalidade medicamentosa ou terapêutica e por suco, a bebida não fermentada, não concentrada e não diluída, obtida da fruta madura e sã, ou parte do vegetal de origem, por processo tecnológico adequado.

A bebida deve conter obrigatoriamente a matéria-prima natural, responsável por sua característica organoléptica; caso contrário, deve ser denominada de "artificial", seguida da expressão "sabor de". Se, por outro lado, contiver matéria-prima natural e for adicionada de corante e aromatizantes artificiais, em conjunto ou separadamente, deverá conter no rótulo as expressões "colorida artificialmente" ou "aromatizada artificialmente".

A água destinada à produção de bebida deve ser limpa, inodora, incolor, não conter germes patogênicos e observar o padrão de potabilidade.

O refrigerante deve ser obrigatoriamente saturado de dióxido de carbono, industrialmente puro, não sendo permitida a associação de açúcares com edulcorantes hipocalóricos e não calóricos na sua fabricação.

A bebida não alcoólica que, em sua composição, contiver ou for adicionada de cafeína (trimetilxantina), natural ou sintética, não deve ter o limite de cafeína superior a 20 mg/100 ml do produto a ser consumido.

· Refrigerantes de laranja, tangerina e uva: devem conter no mínimo 10% em volume do respectivo suco na sua concentração natural.

· Refrigerantes de limão ou soda limonada: devem conter, obrigatoriamente, no mínimo 2,5% em volume de suco de limão.

· Refrigerante de guaraná: deve conter, obrigatoriamente, uma quantidade mínima de 2 centésimos de grama de semente de guaraná (gênero Paullinia) ou seu equivalente em extrato, por 100 ml de bebida.

· Refrigerante de cola: deve conter semente noz de cola ou extrato de noz de cola.

· Refrigerante de maçã: deve conter no mínimo 5% em volume em suco de maçã.

· Água tônica de quinino: é o refrigerante que contiver, obrigatoriamente, de 3 a 5 mg de quinino ou seus sais, expressos em quinino anidro, por 100 ml de bebida.

· Soda: é a água potável gaseificada com dióxido de carbono, com uma pressão superior a 2 atmosferas, a 200C, podendo ser adicionada de sais.

2. Bebida dietética e bebida de baixa caloria

Conceitos e composição

Bebidas diet e light apresentam características de composição e qualidade comparáveis à bebida convencional, exceto quanto ao teor de açúcares (monossacarídeos e dissacarídeos) e quanto aos aditivos adicionados.

· Bebida dietética ou bebida diet: é a bebida não alcoólica e hipocalórica, que deve ter o conteúdo de açúcares adicionado normalmente na bebida convencional, inteiramente substituído por edulcorantes hipocalóricos ou não calóricos, naturais ou artificiais, com teor de açúcares (monossacarídeos e dissacarídeos) inferiores a 0,5 g/100 ml de bebida pronta para o consumo. No refrigerante dietético é tolerada a presença de mono e dissacarídeos acima deste limite, quando provenientes exclusivamente da adição do suco de fruta na sua concentração natural, não sendo, portanto, considerados açúcares adicionados.

· Bebida de baixa caloria ou bebida light: é a bebida não alcoólica e hipocalórica, que deve ter o conteúdo de açúcares adicionado normalmente na bebida convencional, inteiramente substituído por edulcorantes hipocalóricos e não calóricos, naturais ou artificiais, exceto para o preparado sólido para refresco, que poderá ter o conteúdo de açúcar parcialmente substituído por edulcorantes hipocalóricos e não calóricos, naturais ou artificiais e cujo teor calórico não ultrapasse 20 Kcal/100 ml da bebida.

No rótulo das bebidas diet e light deve constar a declaração do seu valor calórico por unidade de embalagem, o nome do edulcorante por extenso, sua respectiva classe e quantidade, em mg/100 ml de produto. Na declaração dos aditivos deverão ser indicados a sua função principal e seu nome completo ou seu número no INS - Sistema Internacional de Numeração, Codex Alimentarius FAO/OMS.

3. Açúcares

s açúcares fisiologicamente mais importantes e mais utilizados são os monossacarídeos (glicose, galactose, frutose) e os dissacarídeos (lactose, sacarose e maltose).

4. Edulcorantes hipocalóricos ou não calóricos, naturais ou artificiais

Os edulcorantes hipocalóricos ou não calóricos, naturais ou artificiais podem ser empregados isoladamente ou associados entre si, obedecido o limite máximo, definido em legislação específica (Resolução - RDC nº 3, de 02/de janeiro/01: Regulamento Técnico que aprova o uso de aditivos edulcorantes, estabelecendo seus limites máximos para os alimentos", da Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde)(3). Vale ressaltar que a legislação brasileira utiliza as informações geradas pelo JECFA - Joint Expert Committee on Food Additives and Contaminants, criado pela Food and Agriculture Organization - FAO e World Health Organization - WHO(4), para elaborar os limites toxicológicos e as normas de identidade e pureza de aditivos alimentares e contaminantes presentes nos alimentos. A Ingestão Diária Aceitável - IDA é um limite toxicológico que representa a quantidade de uma substância, expressa em mg/kg corporal, que pode ser ingerida diariamente, sem provocar dano a saúde humana (Tabela 1).

Na Tabela 2 estão apresentados alguns tipos de refrigerantes vendidos no país, com suas composições aproximadas.


Página seguinte 

Monografías Plus



As opiniões expressas em todos os documentos publicados aqui neste site são de responsabilidade exclusiva dos autores e não de Monografias.com. O objetivo de Monografias.com é disponibilizar o conhecimento para toda a sua comunidade. É de responsabilidade de cada leitor o eventual uso que venha a fazer desta informação. Em qualquer caso é obrigatória a citação bibliográfica completa, incluindo o autor e o site Monografias.com.