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Batman vs Coringa. Provocações netzscheanas acerca da moral (página 3)


Partes: 1, 2, 3

A promessa é, portanto, um dever, uma dívida: é necessário ser fiel à palavra dada. Pensando na carga patrimonial herdada por Bruce de seus pais, tal promessa ganha maior peso. Não se trata apenas de uma promessa feita a duas pessoas às quais se tem amor, mas a todo um patrimônio construído por gerações.

Em Batman Begins, Alfred Pennyworth, o fiel mordomo, relembra que a mansão Wayne, abrigou seis gerações da família que é a mais tradicional de Gotham. Em outra ocasião, Thomas Wayne, o pai de Bruce, conta ao filho que construiu um sistema de transporte público barato para facilitar a locomoção da população mais pobre, assim como apresenta a torre Wayne, sede majestosa das empresas que leva o nome da família.

Em diálogo com Batman, Alfred critica os métodos perigosos dos quais o Morcego se utiliza e deixa bem clara a questão do patrimônio familiar tão pertinente à promessa. Alfred diz:

- Você está se perdendo dentro deste seu monstro..

- Estou usando esse monstro para ajudar outras pessoas, assim como meu pai fazia.

- Mas o ajudar de Thomas Wayne não era para provar algo para alguém. Inclusive a ele mesmo.

- É a Rachel Alfred, ela estava morrendo.

- Bem, nós dois nos importamos com a Rachel senhor, mas o que você faz precisa estar além disso. Não pode ser pessoal, ou você é apenas um vigilante.

- Fox ainda está aqui?

- Sim senhor.

- Precisamos mandar aquelas pessoas embora agora.

- Aquelas são convidadas de Bruce Wayne. Você tem um nome a manter.

- Não me importo com meu nome!

- Não é apenas o seu nome senhor. É o nome do seu pai! E isso é tudo que restou dele. Não o destrua. (NOLAN, 2005) [50]

 

Quando Nietzsche apresenta a relação entre credor e devedor e a aplica às relações que as comunidades primitivas mantinham com seus antepassados, é possível observá-la na postura que Batman possui para com seus pais e todo o patrimônio que deles herdou. Não se trata apenas de um patrimônio material, mas de todo um legado moral do qual a honra emerge como rendição de homenagem à memória dos antepassados com respeito e devoção a tudo que construíram.

Nietzsche afirma: "A convicção prevalece de que a comunidade subsiste apenas graças aos sacrifícios e realizações dos antepassados – e de que é preciso lhes pagar isso com sacrifícios e realizações: reconhece-se uma dívida [Schuld]" [51](GM II § 19) Da mesma forma que as primitivas comunidades tribais ofereciam realizações em louvor aos antepassados, Batman por meio do cuidado com o nome da família a ser zelado e da atenção em colocar as empresas Wayne nas mãos de administradores confiáveis, oferece à memória de seus pais o que a eles deve. Quando a mansão Wayne vem a baixo por conta de um incêndio provocado pelo rival Ra"s Al Ghul, Alfred afirma: "O legado Wayne é mais do que tijolos e argamassa"[52]. (NOLAN, 2005)

Assim como a realização em honra aos pais, o sacrifício pode ser compreendido, em Batman, como a atitude de abdicar-se de uma vida comum. Muitos privilégios poderiam ser aproveitados com a herança milionária que o órfão Bruce herdou sem esforço. Contudo, os benefícios luxuosos que o dinheiro poderia lhe dar, são sacrificados para sua secreta missão, sua promessa. Um Bruce Wayne que ostenta luxo e poder é apenas um homem que encena um personagem para esconder sua identidade secreta. Poderíamos até dizer que seu rosto verdadeiro é a própria máscara de morcego, uma vez que ela representa e define suas ações. Batman afirma: "Não é o que eu sou por baixo, mas o que eu faço que me define". [53](NOLAN, 2005)

A promessa engloba, portanto, as realizações de honra, o sacrifício da herança, e a luta contra o crime. Todos voltados para a memória dos pais, o nome da família, seus antepassados. O peso desta promessa faz de Batman um homem pesado, sério e sombrio. Ele não se dá a luxos. Seus relacionamentos pessoais e amorosos são muito conturbados [54]Para Batman existe um foco, um objetivo que precisa ser realizado. Sua disciplina no treinamento físico e intelectual é impecável.

 

3.2 Credor/devedor: Gotham e seus produtos

Levando em consideração a lógica estabelecida entre credor/devedor e a ideia de Nietzsche em ver a comunidade como o grande credor que pune seus membros uma vez que quebram o contrato e, portanto, passam a ser devedores, a cidade de Gotham City não apenas se engrandece no ofício de credor como também serve os melhores e mais inusitados devedores. Em Gotham, as dívidas sobressaem-se em relação às punições do credor. Gotham, como narrada nas HQs, é um "chão fecundo para o sofrimento e a injustiça" [55]"onde o crime e a alta sociedade vivem promiscuamente e tudo está à venda" [56]"um covil de iniqüidade" [57]

O maior detetive dentre os heróis, o mais inteligente, o planejador por excelência da Liga da Justiça[58]também se apresenta como o castigador nesta cidade incrível: o causador do medo aos infratores que causam medo às vítimas.

Negro contra um fundo de logomarcas tão grandes quanto casas, um espectador se encontra num parapeito de ferro e mármore a oitenta metros de altura no topo do Gotham Center. Ele se cobre de sombras, lê os sinais fumacentos observando as luzes de carros que saem da barriga da Besta. Ele sente o cheiro da noite e suas nove milhões de vidas, inspira seus feromônios, sua química, suas emoções individuais levadas como moléculas de odor na respiração da cidade. Ele se funde em sua transpiração, em sua força animal, sente o gosto de seu humor, de seus metais.

Batman sente o cheiro de medo acima de tudo. O medo está subindo das ruas da mesma forma que bexigas sobem em correntes de ar quente. Um esmagador. Como um antílope nas savanas, os cidadãos de Gotham podem sentir um predador acordando faminto, vagando no perímetro onde as coisas selvagens estão... (MORRISON, 2007, p. 54)

 

Batman usa o castigo em dois sentidos sob a perspectiva de sua promessa: como compensação pela perda que sofreu, a de seus pais, e compensação pelos crimes cometidos contra as leis de Gotham. Esta última, é claro, apresenta-se como complemento e extensão da primeira, uma vez que a promessa consiste em "limpar Gotham do mal que tirou suas vidas". (LOEB, 1998, p.00)

Compreendendo a cidade de Gotham como o credor e seus membros criminosos como o devedor (GM II § 9), percebe-se que Batman se posiciona como força inibidora máxima dos que devem à cidade e o fato de que o Estado democrático não dá conta de fazer frente aos infratores por meio das forças oficiais de segurança, a democracia é suspensa dando lugar à força que se mostra competente, o produto de Gotham: Batman.

No filme Batman: O Cavaleiro das Trevas (2008), em uma conversa à mesa, a bailarina russa Natascha questiona o promotor de justiça de Gotham, Harvey Dent: "Eu falo de um tipo de cidade que idolatra um vigilante mascarado". Dent responde: "Gotham City é orgulhosa de ter um cidadão comum que se levanta para fazer o que é certo". Natascha insiste: "Gotham precisa de heróis como você, eleitos oficiais, não um homem que pensa estar acima da lei...". Bruce Wayne interfere cinicamente: "Exatamente! Quem indicou o Batman?". Dent argumenta: "Nós indicamos! Todos nós que ficamos parados deixando que a escória tome controle de nossa cidade". Natascha tenta pela última vez: "Mas isso é uma democracia Harvey!". Dent afirma: "Quando seus inimigos chegavam aos portões, os romanos suspendiam a democracia e apontavam um homem para proteger a cidade. Não era considerado honra, era considerado um serviço público". (NOLAN, 2008)

Com relação ao castigo, Nietzsche demonstra dois sentidos históricos para o ato de castigar que corroboram com os sentidos de Batman, usados em sua metodologia de combate ao crime, a saber: "Castigo como inspiração de temor àqueles que determinam e executam o castigo (...) Castigo como criação de memória, seja para aquele que sofre o castigo – a chamada "correção" –, seja para aqueles que o testemunham". (GM II § 13)

Amarrar um criminoso pelos pés e puxá-lo até as alturas de um prédio, jogar outro de uma altura suficiente para que as pernas sejam quebradas, pendurá-los de cabeça para baixo, pelados e machucados, são técnicas de tortura para conseguir informações, imprimir medo ou artifício para intimidar outros bandidos. Técnicas usadas por Batman.

Com tudo isso, em Batman Begins, o Morcego prendeu toda a máfia italiana que dominava a cidade, em Batman: O cavaleiro das Trevas foi possível entregar à polícia 549 criminosos de uma só vez com a ajuda do promotor Harvey Dent. "Pense em tudo que você poderia fazer com 18 meses de ruas limpas?" Disse Dent ao prefeito de Gotham que por sua vez o alerta: "Todos eles virão atrás de você agora. Não apenas a Máfia: políticos, jornalistas, policiais. Qualquer um cuja carteira começar a ficar mais leve. Você está preparado para isso?". (NOLAN, 2008)

Com estes dois exemplos, podemos afirmar que: o espírito de "justiça" de Batman que também é compartilhado pelo promotor Harvey Dent e o fiel comissário Gordon foi capaz de empreender tal façanha da "justiça". É uma vitória significativa. De fato os criminosos puderam ser presos, puderam pagar pela dívida usurpada de acordo com as leis jurídicas e no entendimento do direito penal. A cidade é recompensada pelo dano que sofreu: a compensação do credor é efetivada. Mas o problema em tudo isso é apontado no alerta do prefeito e também com Nietzsche. Tanto o castigo quanto a prisão dos criminosos são garantias de uma Gotham City "melhor"?

Nietzsche atenta para uma pretensa utilidade atribuída ao castigo que encontra crédito na consciência popular. É a ideia de que o castigo venha a servir como promotor do sentimento de culpa e a partir disso obter do criminoso um arrependimento, uma recuperação.

(...) sem hesitação poderemos afirmar que o desenvolvimento do sentimento de culpa foi detido, mais do que tudo, precisamente pelo castigo – ao menos quanto às vítimas da violência punitiva. Não subestimemos em que medida a visão dos procedimentos judiciais e executivos impede o criminoso de sentir seu ato, seu gênero de ação, como repreensível em si: pois ele vê o mesmo gênero de ações praticado a serviço da justiça, aprovado e praticado como boa consciência: espionagem, fraude, uso de armadilhas, suborno, toda essa arte capciosa e trabalhosa dos policiais e acusadores, e mais aquilo feito por princípio, sem o afeto sequer para desculpar, roubo, violência, difamação, aprisionamento, assassínio, tortura, tudo próprio dos diversos tipos de castigo – ações de modo algum reprovadas e condenadas em si pelos juízes, mas apenas em certo aspecto e utilização prática. (GM II § 14)

E complementa: "(...) de fato, por muitíssimo tempo os que julgavam e puniam não revelaram consciência de estar lidando com um "culpado". Mas sim com um causador de danos, com um irresponsável fragmento do destino". (GM II § 14)

Do mesmo modo, a ideia de justiça, pensada nos moldes de Batman e Harvey Dent, seria, para Nietzsche, um ideal característico do ressentimento: uma vingança, portanto. Pois "não surpreende ver surgir (...) tentativas como já houve bastantes (...) de sacralizar a vingança sob o nome de justiça – como se no fundo a justiça fosse apenas uma evolução do sentimento de estar-ferido – e depois promover, com a vingança, todos os afetos reativos". (GM, II § 11)

Batman pretende vingar-se e se ilude com a ideia de "um lugar melhor", estático, no qual crianças não são ofendidas, violentadas, exploradas e nem perdem os pais. Pois para Nietzsche, como função básica, "a vida atua ofendendo, violentando, explorando, destruindo, não podendo sequer ser concebida sem esse caráter". (GM II § 11)

Mesmo a criação do Estado, já que falamos em comunidade, para Nietzsche, foge à ideia de contrato pacífico:

(...) algum bando de bestas louras, uma raça de conquistadores e senhores, que, organizada guerreiramente e com força para organizar, sem hesitação lança suas garras terríveis sobre uma população talvez imensamente superior em número, mas ainda informe e nômade. Deste modo começa a existir o "Estado" na terra: penso haver-se acabado aquele sentimentalismo que o fazia começar com um "contrato". (GM II § 17)

Justamente por que:

"Para uma filosofia centrada na noção de vontade de poder, não é pelo medium pacificador de um contrato social fundante, nem como resultado de um progresso natural ou lógico da espécie humana, que se institui o estado, mas sim a partir de relações de domínio" (GIACOIA, 2008, p. 209)

Contudo, Batman impõe ordem em Gotham. Sua luta é contínua, nunca definitiva. Ela encontra conflitos também com o Estado uma vez que "se sobrepõe na luta contra o crime" [59]e consequentemente deixa clara a incapacidade ou a falta de interesse das autoridades de segurança. Um diferencial importante deixado exposto em Batman: O Cavaleiro das Trevas é sua posição insistente com relação à Gotham e sua promessa: "Ele é um guardião silencioso, um protetor zeloso: um Cavaleiro das trevas" [60]

Além de ter um sentido de fidelidade à palavra proferida aos pais, a promessa de Batman precisa de um fundamento. Um fundamento que a preceda, portanto, um princípio, no qual, mesmo com tudo e todos o influenciando para quebrar a palavra, ele persista inabalável. Este princípio é o valor moral. Valor que seu maior inimigo tentará atacar com deboche e crueldade: o Coringa.

3.3 Esquecimento e crueldade

Para compreender essa luta de valores entre Batman e Coringa é preciso inseri-los, estes personagens emblemáticos, na lógica de valoração que a Genealogia da Moral de Nietzsche apresenta, justamente por conta de sua pertinência quanto às disposições axiológicas que permanecem na cultura ocidental. Tais disposições se enxertam nas produções artísticas que procuram, nem todas, atender à demanda de entretenimento requerida pela sociedade.

Com relação às Histórias em Quadrinhos, por volta dos anos de 1950, nos Estados Unidos, quadrinhos de horror causaram comoção na sociedade sendo que o Congresso americano determinou a criação de um código no qual todos os editores de revistas em quadrinhos deveriam seguir.

Uma cláusula-chave do Código de Quadrinhos original declarava que: "Em todos os casos, o bem deve triunfar contra o mal e o criminoso [será] punido por suas más ações". Apesar de o código perder sua relevância com o passar do tempo, foi efetivo durante décadas, impondo restrições básicas ao conteúdo e ao tom da história. Qualquer um que conheça o histórico do Código pode ser tentado a dizer que os super-heróis tradicionais "se tornavam bons" apenas porque os protagonistas nos quadrinhos tinham de ser criados em conformidade com o Código. (BRENZEL, 2009, p. 147-148)

 

Mesmo com a restrição legal, é interessante perceber que as pessoas se interessavam pelos bons heróis, senão não teriam feito tanto sucesso, os leitores não teriam comprado. O foco é observar que o bem é preferência hegemônica na cultura, "ou seja, nós, o público, pagamos pelos super-heróis bons e os aceitamos". (BRENZEL, 2009, p. 148)

De acordo com Nietzsche, como já visto anteriormente, as noções de bem e mal são concepções posteriores às de bom e ruim. Estas nascem a partir de uma valoração ativa, sob o poder dos fortes em cunhar nomes tendo a eles mesmos como referência de valoração. Aquelas nascem como reação às forças dominadoras da valoração forte, a partir do ressentimento dos fracos que, por vingança, atribuem valor negativo ao forte, tresvalorando o valor inicial.

Fica claro, portanto, que o motivo pelo qual a preferência da maioria por heróis que se adaptam à concepção de bem e mal, se dá, de modo geral, por conta da hegemonia dessa concepção que possui preeminência na cultura atual. O que é pertinente na análise de Nietzsche a respeito da moral é a possibilidade de trocar a perspectiva unilateral que a moral vigente impõe e vislumbrar o outro lado numa atitude de curiosa e instigante pesquisa.

Na lógica editorial apresentada acima, Batman é tido como um super-herói, enquanto o Coringa é tratado como um super vilão. A dicotomia é clara: herói e vilão equivalem a bem e mal respectivamente. Logo se vê que o enxerto cultural/moral é feito aos personagens. Mas, tais atribuições atualmente não são tão cristalizadas, os dois pólos não estão bem definidos. No último filme sobre Batman, por exemplo, o Morcego não sai vitorioso e o Coringa não é derrotado. O que se tem é uma complexa relação entre esses dois antagonistas mortais, na qual a própria ideia de vitória não fica clara, mas, trataremos deste filme, em específico, mais tarde.

No entanto essa é a percepção de quem vê de fora. É o espectador quem faz esse tipo de juízo. É o público que enxerga a complexidade e a analisa. O que nos interessa aqui, é analisar a visão dos personagens. É o fenômeno de suas performances que será útil para este trabalho, justamente por se tratar de um tema polêmico e delicado. Com isso cabe a pergunta: Batman vê a si mesmo como bom e ao Coringa como mal? E o Coringa? Ele se vê como mal e ao Batman como bom? Talvez outra pergunta englobe mais a questão: Batman e Coringa qualificam suas próprias atitudes como saudáveis a si mesmos?

Sem dúvida Batman adere ao tipo de valoração tida por Nietzsche como escrava, que nasce do ressentimento, precisamente reativa. Sua promessa: "Fiz uma promessa no túmulo dos meus pais... Eu jamais descansaria enquanto não limpasse Gotham do mal que tirou suas vidas". (LOEB, 1998, p.00) O mal, para Batman, aparece como algo que precisa ser limpo, exterminado, combatido.

Em outra ocasião ele afirma: "E eu juro, pelo espírito de meus pais, vingar a morte deles e devotar o resto de minha vida combatendo todos os criminosos". (Detective Comics # 33, 1939 apud JENSEN, 2008, p. 86) Aqui, o combate é contra todos os criminosos. Vê-se, portanto, uma equivalência no objeto a ser combatido: criminosos e mal se fundem, são os alvos de Batman. Mesmo que Batman não tenha se vingado diretamente de seus pais, ou seja, não tenha tirado a vida do assassino, é possível falarmos de um desdobramento da vingança, uma espécie de canalização na qual o rosto do assassino é visto, por Batman, em todos os outros criminosos. A adesão de Batman ao cumprimento da lei penal torna-se expressão de uma vingança imaginária.

A rebelião escrava da moral começa quando o próprio ressentimento se torna criador e gera valores: o ressentimento dos seres aos quais é negada a verdadeira reação, a dos atos, e que apenas por uma vingança imaginária obtém reparação. (GM I § 10)

 

Esta afirmação de Nietzsche se acopla perfeitamente à atitude de Batman, aliás, à sua não atitude. Sua verdadeira vingança não é possível, ele não pode cobrar com a mesma moeda aquilo que foi tirado de si. O assassino fugiu, nunca foi encontrado, seu devedor é nulo.

Em Batman Begins, o diretor Christopher Nolan, remexe a ferida de Batman. Lá o assassino é Joe Chill e ele é preso pela polícia. No julgamento do criminoso, Bruce Wayne comparece e leva consigo uma arma. Sua intenção é matar o assassino de seus pais. Mas a máfia italiana chega à frente e o elimina com um tiro a queima roupa. Sua verdadeira reação é negada, seu querido ato de vingança não é realizado. Batman apenas o imagina sob as formas da lei penal e do castigo[61]Sua missão como guardião de Gotham é uma longa estratégia de vingança que é conduzida por um ódio entranhado: todo criminoso é Joe Chill.

Batman diz: "Quando eu era menino, meu pai e minha mãe foram assassinados diante dos meus olhos. Dediquei minha vida a deter esse criminoso, independentemente da forma ou rosto que ele tenha. De fato, a forma não tem importância" [62]A forma não tem importância porque ele já transpôs, de maneira imaginativa, seu alvo perdido para todos os criminosos de Gotham.

Para Nietzsche "A moral escrava sempre requer, para nascer, um mundo oposto e exterior, para poder agir em absoluto – sua ação é no fundo reação". (GM I § 10) A reação de Batman é conduzida por seu ódio. Sua promessa é feita, também, motivada por ódio. Sua memória é marcada pela dor e pelo sofrimento. Nietzsche escreve um retrato perfeito do homem ressentido que equivale em todos os detalhes ao Batman:

(...) o homem do ressentimento não é franco, nem ingênuo, nem honesto e reto consigo. Sua alma olha de través, ele ama os refúgios, os subterfúgios, os caminhos ocultos, tudo escondido lhe agrada como seu mundo, sua segurança, seu bálsamo; ele entende do silêncio, do não esquecimento, da espera, do momentâneo apequenamento e da humilhação própria. (GM I § 10)

Já falamos da inteligência de Batman e sua habilidade com a estratégia e planejamento. Nietzsche relaciona tal capacidade aos homens ressentidos:

Uma raça de tais homens do ressentimento resultará necessariamente mais inteligente que qualquer raça nobre, e venerará a inteligência numa medida muito maior: a saber, como uma condição de existência de primeira ordem. (GM I § 10)

O Coringa é totalmente o oposto do Batman com relação à valoração. Ele assume o crime como valor bom. É necessária uma troca de perspectiva para considerar a maneira do Coringa. Aquele conceito bom e ruim é a perspectiva do Coringa, que nasce, no entendimento de Nietzsche, com os senhores, os poderosos.

Nietzsche fala que

 

toda moral nobre nasce de um triunfante Sim a si mesma (...) ele age e cresce espontaneamente, busca seu oposto apenas para dizer Sim a si mesmo com ainda maior júbilo e gratidão – seu conceito negativo, o "baixo", "comum", "ruim", é apenas uma imagem de contraste, pálida e posterior, em relação ao conceito básico, positivo, inteiramente perpassado de vida e paixão, "nós, os nobres, nós, os bons, os belos, os felizes!" (GM I § 10)

É certo que seu passado é tão trágico quanto o de Batman: era um artista frustrado que não conseguia emprego e depois perde a esposa grávida em um acidente doméstico. Contudo sua atitude diante da tragédia não é reativa. Ele não é marcado por essa dor, o sofrimento não é encontrado em sua memória. Ele não possui memória, não faz promessas: ele simplesmente esquece. Não há ressentimento, portanto. O Coringa dirá: "Eu não guardo rancor" [63]Sua atitude é ativamente deveniente. Não possui local fixo ou fundamento para suas atitudes, ele apenas faz. Seu passado? Ele explica: "Se eu vou ter um passado, prefiro que seja de múltipla escolha! Ah, ah, ah!" [64]

Em Asilo Arkham ele é entendido da seguinte forma:

O Coringa é um caso especial. Muitos de nós acreditam que ele está além de qualquer tratamento. Na verdade, não estamos sequer certos de que ele possa ser definido como insano. (...) É bem possível que estejamos diante de um caso de super-sanidade. Uma nova e brilhante modificação da percepção humana. Mais adequada à vida urbana no fim do século vinte (...) Diferente de você ou de mim, o Coringa não parece ter controle sobre as informações sensoriais que recebe do mundo externo. Por isso, alguns dias ele é um palhaço infantil. Outros, um psicopata assassino. Ele não tem verdadeira personalidade. Ele cria uma diferente por dia. O Coringa se vê como o mestre do desgoverno, e o mundo como um teatro do absurdo. [65]

 

Em outra ocasião, Batman fala sobre o Coringa: "Ele mudou novamente. Você sabe como ele muda depois de alguns anos. (...) Ele não tem nenhuma personalidade real, lembre-se, apenas uma série de "superpersonas"" [66]Esta ideia justifica o próprio nome do Coringa que é associada à carta do jogo de baralhos que se instala a vários tipos de disposições dentro de um jogo.

A figura do homem nobre é muito bem levantada por Nietzsche. Atribuamos tal figura e perspectiva de valoração ao personagem Coringa. Aquele que promete, que dá sua palavra e a lança para o futuro na esperança de cumpri-la, seria, para Nietzsche, um dispéptico, um doente no qual a seriedade e o peso de seu fardo o impedem de rir. O Coringa pergunta: "Porque tão sério?" [67]Não há dispepsia aqui, não há o que ficar digerindo, nutrindo-se com veneno:

Não conseguir levar a sério por muito tempo seus inimigos, suas desventuras, seus mal feitos inclusive – eis o indício de naturezas fortes e plenas, em que há um excesso de força plástica, modeladora, regeneradora, propiciadora de esquecimento (...) Um homem tal sacode de si, com um movimento, muitos vermes que em outros se enterrariam; apenas neste caso é possível, se for possível em absoluto, o autêntico "amor aos inimigos". (GM I § 10)

E de fato o Coringa ama o Batman. Ele diz: "Mesmo que me levassem bem alto, num helicóptero. E alinhassem todos os corpos no chão, todos dispostinhos num adorável padrão geométrico, não ia adiantar nada. Eu perdi a conta dos mortos. Mas você, não. Você não perdeu. Eu te amo por isso". (MILLER, 1986)

Lembrando o que Nietzsche falou, "Fechar temporariamente as portas e janelas da consciência, para que novamente haja lugar para o novo (...) eis a utilidade do esquecimento" (Gm II § 1), o Coringa se recria a todo o momento, ele abre espaço para o novo no qual uma memória apenas seria impedimento. Ele não rumina sentimentos de ódio, não se lembra de dores. Ele dirá:

Lembrar é perigoso... eu vejo o passado como um lugar cheio de ansiedade. O "pretérito imperfeito", como você chamaria. Ah, ah, ah, ah! As memórias são traiçoeiras! Num momento, você está perdido num carnaval de prazeres, com o aroma da infância, os neons da puberdade... No outro, elas te levam a lugares onde a escuridão e o frio trazem à tona coisas que você gostaria de esquecer! As memórias podem ser vis, repulsivas, brutais... como crianças. Ah, ah, ah! Mas podemos viver sem elas? A razão se sustenta nelas. Não encarar as memórias é o mesmo que negar a razão! Mas e daí? Quem nos obriga a ser racionais? Não há cláusula de sanidade. Assim, quando você estiver dentro de um desagradável trem de recordações, seguindo pra lugares do seu passado onde o riso é insuportável... lembre-se da loucura. Loucura é a saída de emergência! Você só precisa dar um passo pra trás e fechar a porta com todas aquelas coisas horríveis que aconteceram... presas lá dentro... pra sempre. (MOORE, 1988)

O roteirista de quadrinhos Grant Morrison (2007), faz uma bela descrição da disposição psíquica do Coringa em O Palhaço à Meia Noite.

Talvez ele seja uma nova mutação humana, fruto das águas industriais pegajosas, gerado num mundo de cancerígenos brilhantes e chuvas ácidas. Talvez ele seja o modelo do multihomem do século 21, embaralhando egos como um funcionário de cassino embaralha cartas, para aliviar os choques e trabalhar alguma alquimia que possa talvez transformar o chumbo da tragédia e horror no cruel e caótico ouro da gargalhada do amaldiçoado. Talvez ele seja especial e não apenas um homem terrivelmente amedrontado e mentalmente doente, viciado num interminável ciclo de violência autodestrutiva. Coisas mais estranhas já aconteceram (MORRISON, 2007)

Na história da descrição acima o Coringa está fugindo do Asilo Arkham e decide trocar de personalidade. Assim como um artista reinventa uma obra já existente e velha, o Coringa se olha no espelho e decide não apenas trabalhar um novo rosto, mas também uma nova postura. Pega um bisturi e se mutila extendendo um grande sorriso em sua bochecha. A recriação psíquica também é descrita por Morrison.

O seu corpo entra em convulsão. Suas entranhas se apertam como se forças gravitacionais tivessem conspirado e se moldado para fazê-lo se ajoelhar. Então, ele deita de lado, gemendo horrivelmente. Seu gemido é o sinal, o rádio, o novo som de si sendo projetado como uma frequência. "Eu sou uma barata!", ele grita, e primeiro move uma perna, depois a outra, interpretando um cancã de contrações, dores de trabalho de parto e nascimento enquanto o alarme do Asilo dispara loucamente. "La cucaracha! La cucaracha! A dor é terrível! Eu quero morfina! Estou tendo um filho!", ele ofega, depois gargalha, depois tosse, como uma dançarina de cabaré dando à luz um asno no palco. "La cucaracha-hahahahaha!" Vozes múltiplas do Coringa disputam seu controle conforme ele se prepara para dar à luz a si mesmo como a Palavra de Deus invertida. O seu único arrependimento é que Batman não está aqui para testemunhar este acontecimento obsceno, sua exuberante patologia em pleno florescimento (MORRISON, 2007)

O Coringa é um assassino: "Eu agora faço o que outras pessoas apenas sonham. Eu faço arte... até alguém morrer. Eu sou o primeiro artista homicida do mundo totalmente em exercício" [68]Ele é cruel, sádico e impiedoso. Ele surrou um dos Robins com um pé de cabra e o explodiu [69]atirou a queima roupa em Bárbara Gordon deixando-a paraplégica, torturou psicologicamente o comissário Gordon mostrando as fotos de sua filha nua e agonizante [70]arrancou a pele de um homem deixando-o apenas com os músculos à mostra [71]envenenou milhares com o seu gás do riso e etc. Tudo isso sem qualquer tipo de remorso.

Quando Nietzsche usa a fábula dos cordeiros e das aves de rapina (GM I § 13), seu foco é tratar a força de expressão ativa presente nas aves de rapina levando em conta a falta do sujeito atuante que seria culpável de acordo com a perspectiva das ovelhas. Ele afirma que: "Exigir da força que não se expresse como força, que não seja um querer-dominar, um querer-vencer, um querer-subjugar, uma sede de inimigos, resistências e triunfos, é tão absurdo quanto exigir da fraqueza que se expresse como força". (GM I § 13)

Essa afirmação coloca as aves de rapina dentro de um campo de atuação na qual elas não podem escolher serem fortes ou fracas: elas simplesmente são fortes e expressam essa força por meio do ataque às ovelhas. A ideia de sujeito livre, que decide atacar ou não, seria, para Nietzsche, uma ficção inventada pelas ovelhas para que as aves de rapina recuem no ataque. Ou seja, a criação da alma é uma ficção criada pelos fracos para imputar nos fortes um sentimento de culpa.

O sujeito (ou falando de modo mais popular, a alma) foi até o momento o mais sólido artigo de fé sobre a terra, talvez por haver possibilitado à grande maioria dos mortais, aos fracos e oprimidos de toda espécie, enganar a si mesmos com a sublime falácia de interpretar a fraqueza como liberdade, e o seu ser-assim como mérito. (GM I § 13)

Sem sujeito/alma não pode haver o que culpar. Não há quem, apenas o que: a saber, a ação, o fazer. Se o Coringa tivesse de culpar-se pelos atos de crueldade que praticou, ele deveria culpar uma multidão de superpersonas que criou ao longo de sua vida. No caso do Coringa deveria haver vários sujeitos atuantes, várias almas: uma legião! As ovelhas amedrontadas, conscientes de sua derrota olham para um tipo como o Coringa e o nomeiam como mau: "Eu apenas faço as coisas"[72], dirá o Coringa.

 

Esta "audácia" das raças nobres, a maneira louca, absurda, repentina como se manifesta o elemento incalculável, improvável, de suas empresas (...), sua indiferença e seu desprezo por segurança, corpo, vida, bem-estar, sua terrível jovialidade e intensidade do prazer no destruir, nas volúpias da vitória e da crueldade – para aqueles que sofriam com isso, tudo se juntava na imagem do "bárbaro", do "inimigo mau", como o "godo", o "vândalo". (GM I §11)

 

Reparemos nesta fala do Coringa pronunciada a um policial: "Você quer saber por que eu uso uma faca? Armas são muito rápidas. Você não consegue saborear todas as pequenas... emoções" [73]Agora a fala das aves de rapina na fábula de Nietzsche: "nós nada temos contra essas boas ovelhas, pelo contrário, nós as amamos: nada mais delicioso do que uma tenra ovelhinha". (GM I § 13)

Zombaria e crueldade se casam nestas duas falas. A alegria do cômico mistura-se com o sofrimento alheio. A satisfação no fazer sofrer do Coringa tem sido sua marca. Ele possui uma arte de fazer seus crimes terem uma teatralidade. Gotham City [74]é a cidade de criminosos teatrais: Mulher Gato, Pingüim, Charada, Duas Caras, Espantalho, Senhor Frio, Hera Venenosa, Crocodilo, Chapeleiro Louco, Cara de Barro, Scarface, Ventríloquo. Todos artistas do crime. Promotores da diversão e da criatividade no fazer sofrer tendo o Coringa na vanguarda.

Dentre todos estes personagens, eis que surge a seriedade encarnada: Batman, o homem morcego que procura evitar e lutar contra toda essa barbárie que assola Gotham. Contudo, as salas de cinema vibraram quando Batman arremessou um homem de um prédio com altura suficiente para que ele quebrasse as pernas e na agonia da dor pudesse confessar uma informação. Batman derrama bastante sangue também: ele castiga. "Sem crueldade não há festa: é o que ensina a mais antiga e mais longa história do homem – e no castigo também há muito de festivo!". (GM II § 6)

Nietzsche fala em uma "crescente espiritualização e "divinalização" da crueldade, que atravessa toda a história da cultura superior (e até a constitui, num sentido significativo)." (GM II § 6) Em Além do Bem e do Mal, ele fala do ingrediente constitutivo da tragédia deixando a tese de que o animal selvagem não está morto.

(...) eis a minha tese; esse "animal selvagem" não foi abatido absolutamente, ele vive e prospera, ele apenas – se divinizou. O que constitui a dolorosa volúpia da tragédia é a crueldade; o que produz efeito agradável na chamada compaixão trágica, e realmente em tudo sublime, até nos tremores supremos e mais delicados da metafísica, obtém sua doçura tão-só no ingrediente crueldade nele misturado. O que o romano, na arena, o cristão, nos êxtases da cruz, o espanhol, ante as fogueiras e as touradas, o japonês de hoje, quando corre às tragédias, o operário de subúrbio parisiense, com saudade de revoluções sangrentas, a wagneriana que, de vontade suspensa, "deixa-se tomar" por Tristão e Isolda – o que todos eles apreciam, e procuram beber com misterioso ardor, é a poção bem temperada da grande Circe "crueldade". (ABM § 229)

3.4 Judéia vs Roma: Batman vs Coringa

Nas obras A Piada Mortal, O Palhaço à Meia Noite e Batman: O Cavaleiro das Trevas temos o confronto entre Batman e Coringa são elevados a graus extremos, onde os dois personagens se encontram numa agonia filosófica, num dilema trágico no qual sangue e gargalhadas se entrelaçam de maneira paradoxal.

Estes dois antagonistas traduzem um confronto épico. No entanto, não se pretende aqui elencar mocinho e bandido, herói e vilão, o bem e o mal. Este maniqueísmo parece há muito ter sido superado. Trata-se de observar, através da filosofia nitzscheana, concernente à visão do filósofo a respeito do que ele chamou de preconceitos morais [75]os mitos de Batman e Coringa.

A primeira obra, A Piada Mortal, inicia-se com a seguinte fala de Batman direcionada ao Coringa:

Olá, eu vim conversar. Estive pensando muito ultimamente. Sobre você e eu. Sobre o que vai acontecer com a gente no fim. Vamos matar um ao outro, não? Talvez você me mate. Talvez eu te mate. Talvez mais cedo. Talvez mais tarde. Eu só queria estar certo de ter realmente tentado mudar as coisas entre nós. Só uma vez. (MOORE, 1988)

Interessante perceber a consciência de Batman em se dirigir ao seu maior inimigo e cogitar a possibilidade de uma trégua. Mais tarde ele é ainda mais direto:

Eu não quero machucar você! Não quero que nenhum de nós mate o outro no fim... Mas estamos esgotando as alternativas e ambos sabemos disso! Talvez tudo dependa desta noite. Talvez esta seja nossa última chance de parar. Se você não aproveitar, entraremos numa rota suicida que levará nós dois à morte. Não precisa terminar assim. Não sei o que tirou você dos trilhos mas... quem sabe? Talvez eu também tenha estado lá também. Talvez eu possa ajudar. Podíamos trabalhar juntos. Eu podia reabilitar você. Não precisa ficar sozinho. Não precisamos nos matar. (MOORE, 1988)

Esta consciência de um perigo maior, ou seja, do perigo da morte iminente, desta força pavorosa que é a morte, é sentida pelo órfão Bruce Wayne que logo a quer afastar. A luta de Batman também é contra a morte: essa força agressiva, impiedosa, injusta, incontrolável que tira a vida daqueles aos quais se tem amor, afeto. Batman tenta estar no controle da vida, quer apartar de si o sofrimento que a morte de seus pais lhe causou, contudo, a morte aparece em seu caminho sempre.

O filósofo francês Gilles Deleuze, leitor de Nietzsche, define a consciência nestes termos:

Em Nietzsche, a consciência é sempre consciência de um inferior em relação ao superior ao qual se subordina ou "se incorpora". A consciência nunca é consciência de si, mas consciência do um eu em relação ao eu que não é consciente. Não é consciência do senhor, mas consciência do escravo em relação a um senhor que não tem de ser consciente. "A consciência habitualmente só aparece quando um todo quer subordinar-se a um todo superior... A consciência nasce em relação a um ser de que nós poderíamos ser função" [76]É assim o servilismo da consciência: testemunha apenas "a formação de um corpo superior". (DELEUZE, ANO, p. 62)

O fato de Batman ter consciência da morte é justamente porque ela é não consciente. A morte é senhor enquanto Batman é escravo. Por isso ele tem consciência dela. Mas, e o Coringa? Qual sua relação com a morte? A princípio, é lícito dizer que ele não a teme. Na HQ O Cavaleiro das Trevas, o roteirista Frank Miller desenha uma luta forte entre Batman e Coringa, na qual Batman contorce o pescoço do Coringa quase o levando à morte. Coringa diz: "Eu estou muito desapontado com você, querido. O momento era tão perfeito e você não teve coragem. Estou paralítico. Uma pressãozinha a mais e eu teria..." [77]Em outra ocasião ele chegar a pedir que o Batman o acerte com o bat-pod ao que o Morcego desvia. [78]

O Coringa é autodestrutivo, não se importa em morrer, contudo se satisfaz e tem muito prazer em viver a vida de várias maneiras, recriando-se a cada momento, testando possibilidades. De certa forma, dentre estas várias possibilidades de acoplagem, próprias de uma carta coringa no baralho, uma delas é a de se colocar como não consciente, justamente a mesma falta de consciência tratada por Deleuze logo acima. O Coringa adentra no território do não controle, no caos, alternando-se entre agente e produto do caos. Muitas vezes, também, agindo como o próprio caos, precisamente nos momentos denominados como loucura, insanidade: não consciência. [79]

É difícil a observação desta alternância entre estados, mas, uma passagem pelas histórias mostra bem tais saltos, próprias de uma personalidade ativa, deveniente, aberta ao novo, repentina, incalculável, improvável, indiferente, com "intensidade do prazer em destruir, nas volúpias da vitória e da crueldade". (GM I § 11) O Coringa afirmará: "Aquilo que não te mata simplesmente te faz mais estranho" [80]

"O que é ativo? Tender para o poder" [81]Apropriar-se, apoderar-se, subjugar, dominar são as características da força ativa. Apropriar-se quer dizer impor formas, criar formas explorando as circunstâncias [82]Nietzsche critica Darwin, porque este interpreta a evolução, e mesmo o acaso na evolução, de um modo completamente reativo. Admira Lamarck, porque Lamarck pressentiu a existência de uma força plástica verdadeiramente ativa, primeira em relação às adaptações: uma força de metamorfose. Acontece em Nietzsche o mesmo que na energética, aí se chama "nobre" à energia capaz de se transformar. O poder de transformação, o poder dionisíaco, é a primeira definição de atividade. (DELEUZE, ANO, p. 66)

Enquanto a morte é senhor e Batman escravo, o Coringa é senhor com a morte: eles são amigos, pares, por isso não se temem. Neste ponto, parece ficar clara nossa pretensão em associar a força ativa ao personagem do Coringa em toda sua capacidade expansiva, criativa e exploratória e caótica. Parece estar clara também a compreensão de Batman como a força contrária, reativa, dependente da força Coringa, nobre em sua atividade de transformação.

 

Mas sempre que marcarmos assim a nobreza da ação e a sua superioridade sobre a reação, não devemos esquecer que a reação designa tanto um tipo de forças como a ação: simplesmente, as reações não podem ser concebidas, nem cientificamente concebidas como forças, se não as referirmos às forças superiores que são precisamente de um outro tipo. Reativa é uma qualidade original da força, mas que só pode ser interpretada enquanto tal em relação ao ativo, a partir do ativo. (DELEUZE, ano, 66)

O Coringa, dentro da noção nitzscheana de confronto moral, no qual a valoração escrava contrapõe a valoração do senhor, é o antípoda perfeito para o Batman se colocarmos ambos dentro de cada valoração e estabelecermos a dominação e prostração próprias das forças ativas e reativas respectivamente. O diretor Christopher Nolan entendeu algo disso. Em entrevista ele afirma: "Penso que o Coringa é a resposta lógica para um personagem como o Batman".[83] Talvez, ele precisaria apenas inverter a posição das forças: o Batman é a resposta lógica para um personagem como o Coringa. Responder é sempre uma reação. Batman responde ao crime enquanto o Coringa diz: "Saúde ao crime!" [84]

Nietzsche verá na tresvaloração dos valores, uma vitória do tipo de valoração escrava, sendo que existe, ainda, uma luta entre os dois tipos e atribui nome à luta: Roma contra Judéia.

Pois os romanos eram os fortes e nobres, como jamais existiram mais fortes e nobres, e nem foram sonhados sequer: cada vestígio, cada inscrição deles encanta, se apenas se percebe o que escreve aquilo. Os judeus, ao contrário, foram o povo sacerdotal do ressentimento par excellence, possuído de um gênio moral-popular absolutamente sem igual (...) Quem venceu temporariamente, Roma ou Judéia? Mas não há dúvida: considere-se diante de quem os homens se inclinam atualmente na própria Roma, como a quintessência dos mais altos valores – não só em Roma, mas em quase metade do mundo, em toda parte onde o homem foi ou quer ser domado – diante de três judeus, como todos sabem, e de uma judia (Jesus de Nazaré, o pescador Pedro, o tapeceiro Paulo e a mãe do dito Jesus, de nome Maria). Isto é muito curioso: Roma sucumbiu, não há sombra de dúvida. (GM I § 16)

Vejamos a luta traduzida para os quadrinhos, para as telas de cinema, sob as formas de sanidade contra loucura. Deixemos que os antagonistas falem. O Coringa diz ao Batman:

Só é preciso um dia ruim para reduzir o mais são dos homens a um lunático. Essa é a distância entre o mundo e eu... apenas um dia ruim. Você teve um dia ruim uma vez não é? Eu sei como é. Agente tem um dia ruim e tudo muda. Senão, porque você se vestiria como um rato voador? Seu dia ruim o deixou tão louco quanto qualquer um. Só que você não admite. Prefere continuar fingindo que a vida faz sentido... que vale a pena todo esse esforço! Você me dá vontade de vomitar! Queria saber qual é a sua. O que fez você ficar desse jeito? Namorada estuprada por viciados, talvez? Irmão esquartejado por assaltantes? Aposto que alguma coisa assim... do gênero. Foi assim que aconteceu comigo, sabe... Bem, eu não tenho certeza absoluta. Algumas vezes me lembro de um jeito. Outras vezes, de outro... Se eu vou ter um passado, prefiro que seja de múltipla escolha! Ah, ah, ah! Mas meu ponto é... meu ponto é... eu fiquei louco. Quando vi que piada de mau gosto era este mundo, preferi ficar louco. Eu admito! E você? Você não é nenhum burro, não é imbecil! Só precisa ver a realidade. Sabe quantas vezes estivemos perto da terceira guerra mundial? Sabe? Sabe o que disparou a última grande guerra? Uma discussão sobre quantos postes telegráficos a Alemanha devia aos seus credores de guerra! Postes telegráficos! Ah, ah, ah, ah, ah! É tudo uma piada! Tudo pelo que as pessoas lutam e dão valor não passa de uma monstruosa e insensata anedota! Então, porque você não vê o lado engraçado? Porque não está rindo? (MOORE, 1988)

Batman responde à questão:

 

Porque eu já ouvi isso antes e não foi engraçado da primeira vez. Talvez pessoas comuns não se quebrem à toa. Talvez agente não precise ficar caído no chão só porque levou um tombo. Talvez a fraqueza seja só sua. Talvez seja apenas você o tempo todo. (MOORE, 1988)

Batman pronuncia muito talvez. Seu comedimento é interessante. Na HQ Coringa de Brian Azzarello, um Coringa recém saído do Asilo Arkham, aterroriza Gotham. Ele fala ao Batman:

Você exibe sua vergonha como um distintivo porque não tem colhões pra conseguir um de verdade. É... olha pra você... Desesperado pra ser temido... quer ser visto como um monstro vestido de preto. Porém deixa essa janelinha. Um vislumbre da perfeição por baixo. Óbvia... A beleza bem delineada... não é o queixo, a boca de um monstro... Porque deixa que vejam? Me conta porque? (AZZARELLO, ANO, P)

A resposta de Batman: "Pra zombar de você". Na mais recente longa-metragem sobre Batman, os antagonistas são colocados frente a frente num diálogo revelador [85]O Coringa inicia:

- Aqueles tolos da Máfia querem você morto para que as coisas voltem a ser do jeito que eram. Mas eu sei a verdade. Não há volta. Você mudou as coisas para sempre.

- Então porque você quer me matar?

(Risadas do Coringa)

- Eu não quero te matar! O que eu faria sem você? Voltar a roubar os negociantes da Máfia? Não, não, não, não! Você... você me completa!

- Você é lixo que mata por dinheiro.

- Não fale como um deles, você não é![86] Mesmo se quisesse ser. Para eles você é apenas uma aberração, como eu. Eles precisam de você agora, mas quando não precisarem mais eles vão te lançar fora como a um leproso. Veja, as morais deles, o código deles... é uma piada ruim, caída ao primeiro sinal de problema. Eles apenas são bons na medida em que o mundo os permite ser. Eu te mostro: quando as fichas caírem, essas "pessoas civilizadas" irão comer umas às outras. Veja! Eu não sou um monstro! Eu apenas estou a frente da curva (...) Você tem todas essas regras! Você pensa que elas irão te salvar?

- Eu tenho apenas uma regra.

- Oh e esta é a regra que você terá que quebrar para saber a verdade!

- Qual é?

- Que a única maneira sensata de viver neste mundo é sem regras e esta noite você irá quebrar a sua única regra. (NOLAN, 2008)

Esse diálogo oferece ponto de engate crucial para a culminância da relação entre Batman e Coringa. É aqui que o problema filosófico na moral encontrará seu ponto máximo. É aqui que o Coringa começa sua intensa empresa sádica e filosófica de colocar o Batman contra a parede. O Batman não mata: eis a sua única regra. Em Batman Begins ele diz: "Não sou um carrasco". Em Ano Um suas palavras são: "Não sou assassino".

Até que ponto o Morcego pode ser conduzido sem que rompa com seus princípios morais? Sua promessa é baseada em um valor moral que sendo quebrado esse valor, não matar, ele simultaneamente cumpre a promessa feita aos pais "limpar Gotham City do mal" e quebra seu princípio mesmo. Ou seja: matar criminosos é a única forma de "limpar Gotham City do mal", uma vez que a lei penal não resolve, mas este ato aniquila seu princípio moral. Dito de outra forma: seu princípio moral contradiz a possibilidade de cumprir a promessa feita aos pais. Está dada a tragédia.

Vejamos o discurso niilista do próprio Batman em Mais Sombrio que a Morte de Bruce Jones:

Existe escuridão maior que a morte? Gotham City, minha cidade. Ame-a ou deixe-a. Só não fique indiferente. Entretanto, ultimamente venho pensando no que faz falta. Estranho, não? Falta algo aqui? Gotham tem os melhores espetáculos, a melhor comida e serve o melhor do crime. O que falta é a música. Claro que temos nossa própria produção musical. Mas se você pensa em Nova York, pensa logo em Sinatra. (...) Mas e Gotham? Nada. Silêncio. Preto profundo. Impenetrável. Escrevem-se canções sobre amor, dor de cotovelo e perdas. Mas nenhuma sobre desesperança, sobre o fundo do poço da derrota ou a morte lenta da alma. Talvez seja a visão daquela moça fugidia e sofrida, talvez seja ver a futilidade de mais um grupo de vândalos somando sua cota de marginalidade e ódio a uma cidade outrora gloriosa. Talvez seja mais um blecaute em mais um verão já sufocante de umidade e desumanidade. Mas alguma coisa hoje me deixa vazio e morto por dentro, como em nenhuma outra noite. Algo que nenhuma letra de música pode abranger. Não há letra que aplaque todas as noites solitárias... de observar e esperar sozinho. Tão só quanto aquela garota ameaçada... ou mesmo seus agressores. Tudo culmina numa vida inteira de vigilância vazia, espera vazia e, no fim das contas, violência vazia. Na vazia jornada de volta para casa e para a cama mais vazia ainda. Existe escuridão maior que a morte? Eu creio que existe. (JONES, 2006, p. 03-07)

Esta tragédia do homem morcego é percebida pelo Coringa que não hesita em ir direto à ferida de seu inimigo. Na HQ Morte em Família, o Coringa mata o pupilo de Batman, o Robin Jason Todd [87]Contudo, misteriosamente, anos depois, Jason Todd volta à vida. Em Acerto de Contas com a Morte, o Robin ressuscitado prende o Coringa e coloca Batman em um dilema: tirar a vida do Coringa definitivamente. Eis a conversa dos três:

Batman- Eu sei que falhei com você. Mas eu tentei salvá-lo Jason.

Robin- É por isso que você acha que estamos aqui? Por você ter me deixado morrer? Eu não sei o que torna o seu julgamento pior. Sua culpa ou seu antiquado senso moral. Bruce, eu te perdôo por não ter me salvado. Mas por que... por que em nome de Deus? Ele ainda está vivo?

Coringa- Agora temos uma festa legal! Todos juntos outra vez! Quem tem uma câmera? Drácula, você deve ter uma digital nessa loja de ferramentas que usa na cintura. Primeiro, tire uma de mim e do garoto. Depois, você e eu. Depois, nós três. Então, uma com o pé de cabra [88]

Robin- Ou você fica quieto ou eu meto uma bala na sua boca.

Coringa- Estraga prazer. Não vai comer bolo!

(...)

Robin- Eu pensei... eu pensei que depois de me matar... você não o deixaria machucar mais ninguém. Se tivesse sido você quem ele deixou em agonia. Se ele tivesse levado você deste mundo... eu não teria feito outra coisa nesta vida além de caçar este lixo e mandar o desgraçado pro inferno.

Batman- Você não entende. Acho que nunca entendeu.

Robin- O quê? O seu código moral não permite isso? É difícil demais "passar do limite"?

Batman- Não. Santo Deus... não. Seria fácil demais. Tudo que eu sempre quis fazer foi matá-lo. Por anos não houve um único dia sem que eu me imaginasse agarrando-o, levando-o e passando um mês inteiro fazendo-o sofrer as torturas mais terríveis e excruciantes do mundo. Tudo isso para no final ele estar surrado, despedaçado e mutilado... implorando, gritando... no pior tipo de agonia, indo de encontro a uma monstruosa morte.

Coringa- Ah entendi, eu pensei nisso também!

Batman- Eu o quero morto, talvez mais do que eu jamais quis qualquer coisa. Mas se eu fizer isso, se eu me permitir me rebaixar a esse ponto... eu nunca voltarei.

Robin- Por quê?

Batman- O que?

Robin- Porque todo escoteiro fantasiado sempre diz isso? "Se eu passar do limite não há volta?". Eu não estou falando em matar o Pingüim, ou o Espantalho, ou o Cara de Barro. Nem o Charada ou Dent... estou falando dele. Só dele. (WINICK, 2006)

Batman não fere seus princípios. Ele não define o que vai encontrar ao ultrapassar a linha. Porque não há volta? Ele não responde. O Coringa ri disso. Em Batman o Cavaleiro das Trevas, o diálogo final entre os dois, encerra uma espécie de conclusão para os antípodas. Após conseguir se livrar do Coringa, Batman o lança do alto de um prédio. Enquanto cai, o Coringa dá gargalhadas de satisfação como que provando sua teoria: o Batman mata, ele quebra seu princípio moral. Esta constatação é inclusive mais importante para o Coringa do que o fato de que está caindo de um prédio e em segundos irá morrer. Contudo, Batman lança seu bat-arpão e draga o Coringa de volta. Vejamos o que ele diz:

 

Oh você... você não poderia me soltar, poderia? Isto é o que acontece quando uma força irrefreável encontra-se com um objeto imóvel. Você verdadeiramente é incorruptível, não é? Você não me matará por causa de um utópico senso de retidão própria e eu não te matarei porque você é divertido demais. Eu penso que você e eu estamos destinados a fazer isso para sempre. (NOLAN, 2008)

Em O Palhaço à Meia Noite, Grant Morrison encerra sua obra apresentando um Coringa definitivamente feliz em olhar para Batman e enxergar a beleza do único ser capaz de completá-lo. Aqui fica expresso o que Morrison chamou de "A Insuportável Necessidade de Batman e Coringa" [89]O príncipe palhaço do crime diz a Batman:

Todos me perguntavam, "O que faz o Coringa rir?", e eu apontava para você. Todos nós ríamos de você e de seus estúpidos batbrinquedos pelas suas costas. Nós dois tentando encontrar significado num mundo sem sentido! Por que ser um pária desfigurado quando posso ser um notório Deus do Crime? Por que ser um órfão quando se pode ser um super-herói? Você não pode me matar sem se tornar como eu. Eu não posso te matar sem perder o único ser humano que pode comigo. Isto não é irônico? (MORRISON, 2007)

O Batman não mata o Coringa por conta de seus princípios morais que, até onde vimos, se baseiam em algo incerto: Batman fala de não ultrapassar linha, mas não especifica. Em outra situação dirá que o criminoso precisa ser julgado [90]Um julgamento que se desdobra em aplicação de penas/castigos que não reabilitam. Quando em Batman Begins, Bruce escolhe não matar um criminoso, alegando que ele precisa ser julgado, Ra"s Al Ghul interfere: "Por quem? Burocratas corruptos? Os criminosos zombam das leis da sociedade. Você sabe disso mais que a maioria". (NOLAN, 2005) A esse argumento Bruce abaixa a cabeça, literalmente.

Há uma ocasião em que Batman argumenta os motivos por não matar. No filme Batman Eternamente, o primeiro Robin, Dick Grayson, quer tirar a vida do assassino de seus pais, na ocasião, Harvey Dent, o Duas Caras. Batman diz ao garoto:

Então você está querendo tirar uma vida? Então vai acontecer desta forma: você mata. Mas sua dor não morre com Harvey, ela cresce. Então você sai pela noite para encontrar outro rosto, e outro, e outro. Até que em uma terrível manhã você acorda e percebe que sua vida inteira se tornou vingança. E você não saberá por que. (BURTON, 1995)

Analisemos imediatamente uma narração de Batman há pouco citada:

Tudo culmina numa vida inteira de vigilância vazia, espera vazia e, no fim das contas, violência vazia. Na vazia jornada de volta para casa e para a cama mais vazia ainda. Existe escuridão maior que a morte? Eu creio que existe. (JONES, 2006, p. 03-07)

 

Segundo a perspectiva de Nietzsche, levando em conta o castigo, a relação credor/devedor e a tartufice do ressentido, as citações acima expressam a mesma coisa. A questão aqui não é o matar, mas a vingança. Entre a seqüência de "vários rostos que se mata" na primeira citação e a sequência de "várias noites com vigilância vazia" da segunda, não há diferença. Matar como vingança equivale a cumprir a lei como vingança.

Se limpar o mal de Gotham, consiste em colocar criminosos na cadeia para que sejam condenados à prisão sem que haja arrependimento dos atos praticados, ou seja, sem que haja o arrependimento pretendido pela penalização, é o mesmo que, de acordo com o dito popular, tapar o sol com uma peneira. É certo que a prisão, assim como o castigo, podem manter a ordem por um determinado tempo e em determinado espaço, mas não resolvem o problema querido pela moral: melhorar o homem dito mau, melhorar o mal de Gotham.

Tão pouco a chamada "educação dos bons costumes" que pretende domesticar e suprimir os instintos, ou seja, a vontade de potência, resolveria. Por que "todos os instintos que não se descarregam para fora voltam-se para dentro". (GM II § 16) Toda "a hostilidade, crueldade, o prazer na perseguição, no assalto, na mudança, na destruição – tudo isso se voltando contra os possuidores de tais instintos: esta é a origem da má consciência". (GM II § 16) Má consciência que se expressa em Batman que quando olha para o Coringa e lembra-se de todas as coisas que seu inimigo mau lhe fez, simplesmente volta toda a carga de ódio e crueldade contra si mesmo. Falta-lhe coragem, porque é covarde. Na precisão dos dois termos, sem tresvaloração. Coragem como força, bravura, intrepidez. E covardia como medo, timidez, fraqueza. Pois para Batman seu mérito e louvor na ação são bons enquanto os atos do Coringa são maus.

 

Se os oprimidos, pisoteados, ultrajados exortam uns aos outros, dizendo, a vingativa astúcia da impotência: "sejamos outra coisa que não os maus, sejamos bons" E bom é todo aquele que não ultraja, que a ninguém fere, que não ataca, que não acerta contas, que remete a deus a vingança, que se mantém na sombra como nós, que foge de toda maldade e exige pouco da vida, como nós, os pacientes, humildes, justos" – isto não significa, ouvido friamente e sem prevenção, nada mais que: "nós, fracos, somos realmente fracos; convém que não façamos nada para o qual não somos fortes o bastante"; mas esta seca constatação, esta prudência primaríssima, que até os insetos possuem (os quais se fazem de mortos para não agir "demais", em caso de grande perigo), graças ao falseamento e à mentira para si mesmo, próprios da impotência, tomou a roupagem pomposa da virtude que cala, renuncia, espera, como se a fraqueza mesma dos fracos – isto é, seu ser, sua atividade, toda a sua inevitável, irremovível realidade – fosse um empreendimento voluntário, algo desejado, escolhido, um feito, um mérito. (GM II § 13)

Por outro lado o Coringa não mata o Batman, simplesmente porque se o fizer, estará eliminando um de seus pares, talvez o único: "Quanta reverência aos inimigos não tem um homem nobre! – e tal reverência é já uma ponte para o amor... Ele reclama para si seu inimigo como uma distinção, ele não suporta inimigo que não aquele no qual nada existe a desprezar, e muito a venerar!". (GM I § 10)

O Coringa venera a incorruptibilidade moral de Batman e zomba dela, pois é o único que pode estar a seu nível e ser chamado, com reverência, de inimigo: "Em contrapartida, imaginemos "o inimigo" tal como o concebe o homem do ressentimento – e precisamente nisso está seu feito, sua criação: ele concebeu "o inimigo mau", "o mau", e isto como imagem equivalente, um "bom" – ele mesmo". (GM I § 10) Batman não venera o Coringa, ele o quer longe. Não só o Batman, mas toda a cultura hegemônica que teme os vândalos, os bárbaros, a vida. E assim, Batman sempre se esforça em prender o Coringa. Pois quanto mais esforço em direção ao nada, mais engraçada será a piada.

Gostaríamos de finalizar com uma piada contada pelo Joker [91]

Escute só... tinha dois caras num hospício.

Uma noite eles decidiram que não queriam mais viver lá...

E resolveram escapar para nunca mais voltar.

Aí, foram até a cobertura do Asilo e viram, ao lado,

O telhado de um prédio apontando para a lua...

Então, um dos sujeitos saltou sem problemas pro outro telhado,

Mas seu amigo se acovardou...

É...ele tinha medo de cair.

Aí o primeiro cara teve uma ideia.

Ele disse: "Ei! Estou com minha lanterna aqui.

Vou acendê-la sobre o vão dos prédios,

E você atravessa pelo facho de luz!"

Mas o outro sacudiu a cabeça e disse:

"O que acha que eu sou? Louco?

E se você apagar a luz quando eu estiver no meio do caminho?"[92]

"Vida..." "... e morte."

"A piada..." "... e o fim da piada" [93]

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A filosofia nitzscheana é tão dura quanto atrativa. O confronto icônico entre Batman e Coringa traduz um dilema moral que perpassa a história da humanidade e que por falta de conhecimento e honestidade é ignorado. A indiferença perante as possibilidades limitam horizontes e de certa maneira causam sofrimentos desnecessários. O filósofo que não ama a sabedoria acaba por se tornar escravo dela ao invés de ser senhor com ela: amiga dela, portanto.

Parece haver ter-se deixado de lado preconceitos com relação a quadrinhos e heróis, tidos, com bastante freqüência, como destinados para o público infantil exclusivamente. A pertinência do tema da moral nesse tipo de mídia é sintoma de um cerceamento social e de uma canalização dos instintos que encontram na arte sua possibilidade de expressão.

Com relação ao cinema: há muito se fala de moral, ela está escancarada nas telas. Contudo, existe um tipo de tartufice social e econômica que reduz as obras cinematográficas a meras fontes de entretenimento e lucro, como se entre elas e o cotidiano civil existisse uma corroboração pacífica. É preciso olhar por cima e ser honesto consigo mesmo para ver os sintomas e a emergência de uma guerra.

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MALLOY, Daniel P. Os melhores... amigos (?) do mundo: Batman, Super-Homem, e a natureza da amizade. In: IRWIN, William (org.). Batman e a filosofia. São Paulo: Madras, 2008.

MILLER, Frank. Batman: Ano Um. São Paulo: Panini Comics, 1987.

_____________. O cavaleiro das trevas. São Paulo: DC Comics, 1986.

MOORE, Alan. A piada mortal. São Paulo: Panini Comics, 1988.

MORRISON, Grant. Asilo Arkham. São Paulo: Abril Jovem, 1990.

_____________. O palhaço à meia-noite. São Paulo: Panini Comics, 2007.

MORRIS, Matt. Batman e amigos: Aristóteles e o círculo interno do Cavaleiro das Trevas. In: IRWIN, William (org.). Super-heróis e a filosofia. São Paulo: Madras, 2009.

SPANAKOS, Tony. Governando Gotham. In: IRWIN, William (org.). Batman e a filosofia. São Paulo: Madras, 2008.

STARLIN, Jim. Morte em família. São Paulo: Panini Comics, 1988.

WINICK, Judd. Ajuste de contas com a morte. São Paulo: Panini Comics, 2006.

VIDEOS

BERKOWITZ, Stan. Superman e Batman: Inimigos públicos. Warner Brothers, 2009.

BURTON, Tim. Batman. Warner Brothers, 1989.

NOLAN, Christopher. Batman Begins. Warner Brothers, 2005.

___________________. Batman: O cavaleiro das trevas. Warner Brothers, 2008.

SCHUMACHER, Joel. Batman Eternamente. Warner Brothers, 1995.

DOCUMENTÁRIO: Batman Desmascarado. History channel, 2008.

ANEXOS

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ANO UM

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MORTE EM FAMÍLIA

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A PIADA MORTAL

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O CAVALEIRO DAS TREVAS

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O CAVALEIRO DAS TREVAS

Agradecimentos

Eis nosso canto de gratidão!

A meus pais pela roupa do Batman e pelo acesso que me deram à cultura e ao amor.

A meu irmão que comigo brincava de Jaspion.

Ao baby pela bochecha gostosa!

Ao David pelo Wolverine e os X-Men.

A meu primo Milton Júnior pelos Power Rangers, Cavaleiros do Zodíaco e afins.

Ao Ítalo pelas conversas de portão e Ano Um.

Ao Eudesmar SC pelas reflexões sobre o Coringa.

À Madelon pelo Kiss e pelos beijos.

À família Palopoli pelo carinho.

Ao Riso e à Márcia pela alegria.

Ao Mário, Cecília e Nicolas pelas portuguesadas.

À Dilma e ao Serra por me manterem firme no voto nulo.

À galera da faculdade pela comédia filosófica.

Aos postulantes de 2010 pela cabulosidade intrínseca.

Ao Frei Rogério por Deleuze, Foucault e tudo mais.

Ao Zé por tudo que ele sabe

Ao Joel pelo crescimento filosófico compartilhado. Um verdadeiro Alfred!

À minha Dani Dani por me manter sorrindo.

A Sion pela esperança.

E ao nome de Jesus que ainda brilha

Dedicatória

A Bob Kane, Bill Finger, Grant Morrison, Alan Moore,

Frank Miller, Jeph Loeb, Jerry Robinson e Christopher Nolan

por suas mentes.Que inveja!

A Tim Lee e Scott Williams por terem deixado Hush cabulosa!

Ao Nietzsche pela sacada!

E a Heath Ledger pela coragem!

 

Autor:

Paulo Vinícius Souza Machado Vinícius Machado

vinicius.robin[arroba]gmail.com

Prof. Rogério Pereira Xavier

FACULDADE PAULO VI

MOGI DAS CRUZES – SP

2010


[1] Exceto no seriado "Batman" de 1966 estrelado por Adam West e produzido por William Dozier, no qual era apresentada uma estética "camp", infiel ás pretensões originais de Bob Kane e Bill Finger (COSTA, 2001). Ver contraste de personalidade entre Batman e Superman por exemplo.

[2] Os anos trinta marcaram um período de instabilidade econômica nos Estados Unidos devido á grande quebra (Crack) da bolsa de valores de Nova York em 1929. Também se via um clima de medo na sociedade: a II Guerra Mundial era iminente. O nacional socialista Adolf Hitler, líder da Alemanha, invadiu, em 1939, a Polônia dando início á guerra.

[3] A promessa de Batman será exaustivamente citada. Ela será relacionada com a filosofia de Nietzsche ao longo do terceiro capítulo, por conta de sua pertinência á constituição moral do personagem.

[4] A mnemotécnica será tratada no segundo capítulo com base nas propostas de Nietzsche.

[5] "Justice is about harmony. Revenge is about you making yourself better. Which is why we have an impartial system". (NOLAN, 2005)

[6] Cf.: Ano Um de Frank Miller (1987) e Batman Begins de Christopher Nolan(2005).

[7] "People need dramatic examples to shake them out of apathy. And I can't do that as Bruce Wayne. As a man. I'm flash and blood. I can be ignored, I can be destroyed. But as a symbol... As a symbol I can be incorruptible. I can be everlasting (...) Something elemental, something terrifying. (NOLAN, 2005)

[8] "Bats frighten me. It's time my enemies shared my dread". (NOLAN, 2005)

[9] JONES, 2006.

[10] MILLER 1987.

[11] "- But first, you must demonstrate your commitment to justice. No. I'm no executioner. Your compassion is a weakness your enemies will not share. That's why it's so important. It separates us from them. You want to fight criminals? This man is a murderer. This man should be tried. By whom? Corrupt bureaucrats? Criminals mock society's laws. You know this better than most. (.) I will go back to Gotham and I will fight men like this. But I will not become an executioner." (NOLAN, 2005)

[12] "The man who laghs", filme de Paul Leni. é uma adaptação do romance homônimo de Victor Hugo. (www.cineplayers.com/filme.php?id=981)

[13] No baralho, a carta possui a função de mudar de valor de acordo com as pretensões do jogador ou com as disposições do jogo. Ela pode preencher o lugar de qualquer outra carta. (Melhoramentos, 1988)

[14] "I now do what other people only dream. I make art... until someone dies. I am the world's first fully-functionning homicidal artist". (BURTON, 1989)

[15] Do inglês smile que significa "sorriso". Trata-se de um produto químico que contrai os músculos faciais no formato de um sorriso constante.

[16] "Some men aren't looking for anything logical, like money. They can't be bought, bullied, resoned or negociated with. Some men just wanna watch the world burn". (NOLAN, 2008)

[17] Famoso asilo de Gotham City que abriga os "criminosos insanos" que Batman prende.

[18] Nome dado ao herói ou heroína que assume o posto de parceiro de Batman. Mais conhecidos: Dick Grayson, Jason Todd, Timothy Drake e Carrie Kelley.

[19] BORBA, 1988, p. 335

[20] "You want order in Gotham... Batman must take off his mask and turn himself in. Oh, and everyday he doesn't, people will die. Starting tonight. I'm a man of my word!" (NOLAN, 2008)

[21] Promotor de Justiça de Gotham City. Posteriormente se transformará em inimigo de Batman, também conhecido como Duas Caras.

[22] Amiga de infância de Bruce Wayne. Bruce irá se apaixonar por ela.

[23] "There's only minutes left. So you're gonna have to play my little game if you wanna save one of them.(.) Killing is making a choice.(.) Choose between one life or the other: You're friend, the district attorney, or his blushing bride-to-be". (NOLAN, 2008)

[24] "You have nothing, nothing to threaten me with. Nothing to do with all your strength". (NOLAN, 2008)

[25] "I had a vision of a world without Batman. The Mob ground out a little profit and the police tried to shut them down one block at a time. And it was so. boring. I've had a change of heart. I don't want Mr. Reese spoiling everything... but why should I have all the fun? Let's give someone else a chance. If Coleman Reese isn't dead in 60 minutes. then I blow up a hospital". (NOLAN, 2008)

[26] "Tonight, you're all gonna be a part of a social experiment. Through the magic of diesel fuel and ammonium nitrate, I'm ready right now to blow you all sky-high. If anyone attempts to get off their boat, you all die. Each of you has a remote to blow up the other boat. At midnight I blow you all up. If, however, one of you presses the botton, I'll let that boat live. So who is it gonna be? Harvey Dent's most-wanted scumbag collection or the sweet and innocent civilians? You choose! Oh, and you might wanna decide quickly because the people on the other boat may not be quite so noble". (NOLAN, 2008)

[27] "No one wants to get their hands dirty. Fine. I'll do it. Those men on that boat? They made their choices. They chose to murder and steal. It doesn't make any sense for us to have to die too". (NOLAN, 2008)

[28] "You don't wanna die... but you don't know how to take a life. Give it to me. These men will kill you and take it anyway. Give it to me. You can tell them I took it by force. Give it to me, and I'll do what you should've did 10 minutes ago". (NOLAN, 2008)

[29] "Do you wanna know why I use a knife? Guns are too quick. You can't savor all the little emotions. You see. in their last moments people show you who they really are". (NOLAN, 2008)

[30] "My father was a drinker and a fiend. And one night, he goes off crazier than usual. Mommy gets the kitchen knife to defend herself. He doesn't like that... not one bit. So, me watching, he takes the knife to her, laughing while he does it. He turns to me and he says: 'why so serious?' He comes at me with the knife: 'why so serious?' He sticks the blade in my mouth: 'Let's put a smile on that face'". (NOLAN, 2008)

[31] "I had a wife. She was beautiful. (.) Who tells me I worry too much. Who tells me I ought to smile more. Who gambles and gets in deep with the sharks. One day they carve her face. And we have no money for surgeries. She can't take it. I Just wanna see her smile again. I Just want her to know that I don't care about the scars. So. I stick a razor in my mouth and do this to myself. And you know what? She can't stand the sight of me. She leaves. Now I see the funny side. Now I'm always smiling". (NOLAN, 2008)

[32] "Do I really look like a guy with a plan? You know what I am? I'm a dog chasing cars. I wouldn't know what to do with one if I caught it. (.) I Just do things! The Mob has plans. The cops have plans. Gordon's got plans. You know, they're schemers. Schemers trying to control their little worlds. I'm not a schemer. I try to show the schemers how pathetic their attempt to control things really are". (NOLAN, 2008)

[33] "Look what I did to this city with a few drums of gas and a couple of bullets. You know what I noticed? Nobody panics when things go 'according to plan'. Even if the plan is horrifying. If tomorrow I tell the press that, like, a gangbanger will get shot. or a truckload of soldiers will be blowing up. nobody panics. Because it's all part of the plan. But when I say that one little old mayor will die. well, then, everyone loses their minds. Introduce a little anarchy... upset the stablished order... and everything becomes chaos. I'm an agent of chaos. Oh, and you know the thing about chaos? It's fair". (NOLAN, 2008)

[34] O termo origem precisa ser tomado com cuidado para estar de acordo com uma genealogia. Segundo Michel Foucault, Nietzsche, enquanto genealogista, rejeita o uso de Ursprung por designar uma origem da essência, do descobrimento de algo imóvel, um princípio, um fundamento e, por tanto, não histórico. "Termos como Entestehung ou Herkunft marcam melhor do que Ursprung o objeto próprio da genealogia". (FOUCAULT, 2007, p. 20) Herkunft: proveniência. "A pesquisa da proveniência não funda, muito pelo contrário: ela agita o que se percebia imóvel". (FOUCAULT, 2007, p. 21) Para Entestehung temos emergência, o ponto de surgimento, o qual vem á luz após uma luta. "A emergência se produz sempre em um determinado estado das forças (...) é portanto a entrada em cena das forças". (FOUCAULT, 2007, pp. 23-24)

[35] Conferir documento da Comissão Teológica Internacional: Em busca de uma ética universal, novo olhar sobre a lei natural. (2008) O documento pretende a consideração de uma solidariedade global da qual a unidade do gênero humano seria seu fundamento.

[36] Dos psicólogos ingleses, genealogistas da moral, cujo expoente maior é Paul Rée com o livro A origem das impressões morais de 1877.

[37] Cf. ABM § 260

[38] "Aber es gibt kein solches Substrat; es gibt kein "Sein" hinter dem Tun, Wirken, Werden; "der Täter" ist zum Tun bloss hinzugedichtet - das Tun ist alles. Observe-se que a mesma palavra foi traduzida como "o fazer" e "a ação". Trata-se do verbo tun ("fazer"; do, em inglês), transformado em substantivo no texto, e por isso escrito com maiúscula (todo verbo pode ser substantivado no alemão). Os outros verbos ai substantivados, termos importantes em Nietzsche, são wirken - "atuar, operar, causar um efeito" - e werden - "devir, vir a ser, tornar-se" (Paulo César de Souza, nota 17 da primeira dissertação de Genealogia da Moral, p. 154).

[39] Cf. Rm 9, 1-5.

[40] Se levarmos em conta o fenômeno da expansão marítima globalizada na qual a Igreja terá acesso aos novos continentes explorados, firmando a catequese cristã aos nativos.

[41] GIACÓIA, 2008, p. 198.

[42] A vontade de nada é tratada por Nietzsche na terceira dissertação de Genealogia da Moral, na qual o ideal ascético é visto como aquele que dá sentido ao sofrimento do homem, mesmo que esse ideal resulte em nada, daí a frase: "o homem preferirá ainda querer o nada a nada querer". (GM III § 28)

[43] Cf. O Mercador de Veneza de William Shakespeare. (Século XVI)

[44] À citação em francês: "Faire le mal pour le plaisir de le faire: literalmente, 'fazer o mal pelo prazer de fazê-lo'; segundo Colli e Montinari, trata-se de uma citação do romancista Prosper Merimée, extraída de Lettres á une inconnue, I, 4 (Paris, 1874). (GM, p. 156)

[45] Esse "eu", deve ser compreendido como aquele sujeito atuante da força, acreditado pelas ovelhas como alvo de culpabilização. Para Nietzsche este sujeito não existe. (Cf. GM I § 13)

[46] Tanto o Superman quanto a Mulher Maravilha possuem as cores azul claro e vermelho em seus uniformes que remontam á bandeira norte americana. O uniforme do Flash é todo ele em vermelho.

[47] Referimo-nos ás abordagens de Batman em Hollywood e nas campanhas publicitárias cujos fatores heróicos e fantásticos sobressaem-se. Por exemplo: em Batman Begins, por mais que o filme tenha se aproximado mais das abordagens feitas nas HQs, o diretor Christopher Nolan preferiu centralizar a história na temática do medo anulando a promessa.

[48] Lex Luthor: principal inimigo de Superman. Louis Lane: a repórter do Planeta Diário, namorada e futura esposa de Clark Kent, o Superman.

[49] No cinema, é mais comum encontrar um Batman com senso de humor, que faz piada. As HQs o mostram mais centrado, mais sombrio.

[50] - You're getting lost inside of this monster of yours. - I'm using this monster to help other people, just like my father did. - But Thomas Wayne helping others wasn't about proving anything to anyone. Including himself. - It's Rachel Alfred, she was dying. - Well we both care for Rachel sir, but what you're doing has to be beyond that. It can't be personal, or you're just a vigilante. - Is Fox still here? - Yes sir. - We need to send these people away now. - Those are Bruce Wayne's guests. You have a name to maintain. - I don't care about my name! - It's not just your name sir. It's your father's name! And it's all that's left of him. Don't destroy it. (NOLAN, 2005)

[51] "'Culpa' e 'dívida': em alemão há uma só palavra para as duas, Schuld. Ter presente essa identificação é essencial para acompanhar o argumento de Nietzsche. E é bom recordar, a propósito, a mudança introduzida na oração do 'Padre Nosso' pela igreja Católica: 'perdoai nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores' deu lugar a 'perdoai nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido'". (Nota 04 de GM II)

[52] The Wayne legacy is more than bricks and mortar. (NOLAN, 2005)

[53] It's not who I am underneath, but what I do that defines me. (NOLAN, 2005)

[54] Com relação ás amizades e amores de Batman, conferir artigo de Matt Morris Batman e amigos: Aristóteles e o círculo interno do cavaleiro das trevas em Super Heróis e a Filosofia, 2009.

[55] (NOLAN, 2005)

[56] (MORRISON, 2007)

[57] Den of iniquity. (GALE, 1999, p.40)

[58] Liga formada pela união de heróis da DC Comics tendo Superman, Batman e Mulher Maravilha como líderes.

[59] Batman Desmascarado (Batman Unmasked). Documentário exibido por History Channel em 2008.

[60] He's a silent guardian, a watchful protector: a Dark Knight. (NOLAN, 2008)

[61] No alemão Bestrafung designa tanto castigo quanto pena.

[62] (Justiça, 2006, apud, JENSEN, 2008, p. 87)

[63] (LIEBERMAN, 2006, p. 28)

[64] (MOORE, 1988)

[65] (MORRISON, 1990)

[66] (MORRISON, 2007).

[67] "Why so serious?". (NOLAN, 2008)

[68] (BURTON, 1989)

[69] (STARLIN, 1988)

[70] (MOORE, 1988)

[71] (AZZARELO, 2009)

[72] "I just do things". (NOLAN, 2008)

[73] NOLAN, 2008

[74] Explicar a escolha do nome Gotham.

[75] Cf. GM p. 08

[76] Esta citação, Deleuze a retira da obra de Nietzsche Vontade de Potência, II, § 227.

[77] MILLER, 1986

[78] Nome da motocicleta usada por Batman.

[79] Com relação ao caos, verificar o final do primeiro capítulo no qual apresentamos os quatro dilemas aos quais o Coringa submete o Batman e a cidade de Gotham. é precisamente nesta posição de agente do caos que haverá a possibilidade de entendê-lo como uma força nobre não consciente.

[80] Whatever doesn't kill you simply makes you stranger. (NOLAN, 2008)

[81] Vontade de Potência, II § 43

[82] ABM § 259 e Vontade de Potência II § 63

[83] Batman Desmascarado

[84] MOORE, 2008

[85] Este filme rendeu um Oscar póstumo ao ator Heath Ledger pela interpretação do Coringa. Antes do lançamento do filme nos cinemas, o ator australiano foi encontrado morto no quarto de um hotel nos Estados Unidos, por conta de uma overdose de medicamentos ansiolíticos.

[86] Refere-se aos policiais.

[87] Nesta HQ o público participou da escolha do final. Eles tinham que telefonar e escolher se Robin morreria ou não. A maioria quis a morte de Jason Todd.

[88] Foi com um pé de cabra que o Coringa surrou e matou Jason Todd em Morte em Família.

[89] MORRISON, 2007.

[90] NOLAN, 2005.

[91] Coringa em inglês. Joke: piada. Joker: piadista.

[92] MOORE, 1988.

[93] MORRISON, 2007.

Partes: 1, 2, 3


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