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Pedagogia e teatro para crianças e jovens: de ferramenta à experiência cênica (página 2)


Esse fato evidencia que o teatro ainda é visto de forma segmentada e nem sempre o universo infantil retratado nas peças, abrange também o juvenil. Este último, permanece, na maior parte das vezes, como em um movimento de resistência, isoladamente, sob forma de projetos que, tem de ir até o público destinado, como é o caso do Projeto Boca de Cena, realizado pelo CBTIJ e que têm, entre apresentações, bate-papos e oficinas, o objetivo de dar continuidade à formação de platéias, focando na figura dos jovens. Há também os projetos-escolas como o trabalho da companhia teatral ENSINOEMCENA que percorre SESCs e escolas com peças que abordam conflitos típicos de jovens como Mãe, eu vou ser mãe, que trata da gravidez da adolescência (ou seja, mantendo uma forte idéia didática)[1].

O teatro infantil vem ganhando força em seu próprio desejo de crescimento. O teatro começou a ser praticado em casa, pelas próprias crianças, para as suas próprias famílias. Aos poucos, começou a ter visibilidade também em escolas, sendo utilizado largamente como recurso colaborativo ao aprendizado. Com o passar do tempo, saiu das salas de aula e passou a ser tratado como arte nos palcos brasileiros. Surgiu a necessidade de haver um teatro infantil, a mesma evidência já havia sido notada há muito tempo para os adultos, mas sempre faltou, em um teatro voltado para jovens:

O adolescente nunca chegou a ter um produto teatral a ele exclusivamente dirigido, que pudesse ter sua especificidade contestada. Quando a especificidade aparece, tende a ser aceita em termos de um público de crianças, ou a ser negada em favor de um produto cultural que possa ser decodificado por pessoas de todas as idades. (PUPO, 1991, p. 37)

Problematizando essa disparidade entre teatro infantil e juvenil, este trabalho busca investigar brevemente o panorama histórico sobre o teatro infantil, onde se pode vislumbrar importante trajetória de amadurecimento – produção que se sofistica, mas que, evidentemente ainda convive com experiências bastante primárias – que contrapondo-se às escassas experiências no teatro juvenil. Subsidiado pelos estudos de Desgranges (2002) sobre a pedagogia do espectador, esta pesquisa passa a dialogar com entrevistas realizadas com jovens que já tiveram alguma iniciação no campo teatral na escola. De forma a delinear o perfil do jovem contemporâneo, que tipo de teatro eles tendem a assistir, que tipo de relação eles tem com a cultura em geral e sobretudo, tentar entender como anda a relação do jovem espectador com a arte teatral contemporânea.

Partindo do pressuposto de que essa relação teatro-jovem se apresenta como enfraquecida, busca-se investigar, através de uma pesquisa quantitativa realizada por adolescentes que possuem aulas de teatro em escolas, onde os jovens se fortalecem em termos culturais e de entretenimento.

1. MAIS DO QUE UMA FERRAMENTA PEDAGÓGICA – o teatro infantil

De acordo com Maria Lúcia Pupo em No Reino da Desigualdade, 25,7% da produção textual das peças analisadas por ela se dirigem para todos os públicos, por mais que sejam apresentados em horários de peças infantis; 7,1% foram escritas estritamente para jovens, e outros 7,1% foram escritas para crianças e jovens. Esse percentual, um tanto já ultrapassado, dá a idéia da época de maior produção textual para crianças e jovens que foi a década de 1970. Porém, ainda partindo da análise da autora, os espetáculos destinados a todas as idades claramente eram específicos para crianças devido, principalmente, à temática abordada. Partindo desse problema constata-se que os autores ainda buscam uma definição em relação ao teatro para jovens, pois os próprios autores escrevem acreditando que será possível abranger todos os públicos, o que de fato não é ocorre.

O teatro para crianças também teve, e ainda tem seus erros e dificuldades, porém fica clara a sua evolução em termos dramatúrgicos e a preocupação de como chegar até a criança; é clara a intensão de como trabalhar a questão de forma didática e ao mesmo tempo artística. Partindo da trajetória do teatro para crianças, é possível perceber que algumas falhas dessa prática podem indicar um possível hiato relacionado ao teatro juvenil.

No fim do século XIX e na primeira década do século XX, Coelho Neto (romancista, teatrólogo, orador, jornalista e algumas vezes tratado como educador) escreveu uma peça para crianças onde o tema era a língua pátria em detrimento da língua francesa, muito utilizada no Brasil da época, e possuía claramente o sentido de instruir: "Ele usou suas peças como verdadeira espada contra maus costumes, contra a falta de amor à pátria e sobretudo, à falta de textos para crianças." (BENEDETTI,1964,p.82) Coelho Neto, percebia que o teatro infantil era um bom instrumento educativo-reflexivo. Em 1905 ele e Olavo Bilac publicaram o primeiro volume de teatro infantil, peças que podem ter sido datadas de 1800, mas que foram reunidas e publicadas somente em 1905. Todas elas possuíam um cunho didático e Coelho Neto, já nessa época, gritava por um teatro de melhor qualidade, com um maior repertório de cenas para as representações escolares:

Não era nada incomum que pessoas ligadas à educação escrevessem peças para representações escolares. Uma pesquisa nessa direção encontrara um número surpreendente de títulos. Desde que se organizaram as primeiras instituições escolares, e até antes disso, o teatro era visto como meio eficiente de educação. (CAMPOS, 1998, p. 63)

Por mais que os escritores destinassem tais peças ao uso educativo, o teatro feito em casa pelas crianças, para os seus familiares parece ter ocorrido frequentemente. Em 1899 Figueredo Pimentel publica Theatrinho Infantil tipicamente para ser encenado em casa, como um jogo, uma brincadeira e é apresentado como:

[...] collecao de monólogos, diálogos, scenas-comicas, dramas, comedias, operetas etc (em prosa e verso) próprias para serem representadas por crianças de ambos os sexos, dispensando-se despezas com scenarios, vestimentas e caracterização, collecionadas por Figueredo Pimentel. (PIMENTEL apud CAMPOS, 1998, p. 64)

O teatro infantil quase sempre escrito em verso, num vocabulário complexo e adulto; essas peças porém, eram para ser representadas por crianças. Torna-se evidente o interesse por tratar do teatro infantil e ao mesmo tempo, evidencia-se a falta de compreensão do universo infantil, principalmente por conta da linguagem rebuscada e a ausência de uma linguagem. A Carta, de Coelho Neto, deixa evidente a estranheza de ser um texto voltado para o universo infantil e que tem como personagem um analfabeto que recebe uma carta da mãe e não tem condições de ler.

Carlos Góis também escrevia para crianças e se importava em educar através de operetas que falavam, em sua grande parte, sobre a fraqueza humana. Dentre seus escritos para crianças, havia um monólogo que o autor restringiu a ser declamado por crianças de cinco anos, o que representa claramente a falta de entendimento desta fase da vida. Atualmente, crianças de cinco anos ainda não estão alfabetizadas e certamente ainda não havia se encontrado uma organicidade que equiparasse a idade e fase da criança com os textos a serem declamados ou interpretados, por mais que Carlos Góis escrevesse textos curtos, tais monólogos não pareciam ser adequados para a interpretação de uma criança.

De fato, as crianças da primeira metade do século XX não eram vistas como as crianças de hoje. Aparentemente, nessa época, a criança não era entendida com tanta especificidade. Torna-se evidente que os textos eram voltados mais para o universo adulto do que para crianças em si: peças representadas por crianças para adultos verem. A criança era tratada como um devir adulto. Não se preocupavam se a criança estava entendendo o que via ou o que lia. Não havia nenhum interesse pela fluidez da imaginação ou algum apontamento para um universo maravilhoso; entendia-se apenas que o recurso didático-teatral cabia ao nicho infantil, mas não sabiam exatamente como aplicá-lo. Diante deste fato, as crianças permaneciam indo ao teatro adulto, ainda que fossem em sua minoria:

De modo geral, na primeira metade do século, o que se tem é absoluta escassez de publicações ou realizações no teatro para crianças. Os meninos de boa família, quando interessados em teatro, compareciam diretamente as sessões para adultos. [...] No Rio de Janeiro, na década de 30, Henrique Oscar ia com o pai ver as revistas do Teatro Recreio e, diz ele, "não entendia metade das piadas". (CAMPOS, 1998, p. 66)

Não houve uma preocupação, nos anos seguintes, em tornar o teatro infantil em teatro profissional, em tese, buscava-se alargar o teatro infantil amador, feito em escolas e em casa, tentando imitar os moldes profissionais, com seus respectivos figurinos e cenários.

Em 1937, se estabelece a Comissão de Teatro Nacional, incentivada pelo Estado, que tinha como um dos principais objetivos pensar o teatro para crianças com mais afinco. Dentre algumas propostas a serem pensadas constava: a permissão para que o teatro para crianças e adolescentes fosse representado tanto por crianças quanto por adultos; que a vivência da representação durante a infância trouxesse uma visão futuro-profissional para as artes teatrais; que o teatro infantil fosse uma potente ferramenta educativa, prestando não só à formação artística como também trabalhando na formação do caráter; que fosse fomentada a literatura teatral infantil e que também deveriam ser incentivadas peças teatrais infantis em todas as escolas. Por fim, o conselho propunha que as peças de teatro infantis representadas fora da escola, fossem vistas com cuidado, de forma que se transformassem também em diversão pública. Essa comissão, por mais que não tenha conseguido atingir todos os seus objetivos, foi um marco para o teatro infantil, demonstrando a transição entre teatro amador e teatro como modalidade, trazendo a idéia de que o teatro infantil deveria ser pensado e incentivado, tentando se afirmar como arte autônoma.

Foi através de uma apresentação austríaca da peça Juca e Chico que o teatro infantil começou a traçar seus rumos na contemporaneidade. Um velho empresário carioca sentiu desejo de colocar em cena um espetáculo nos moldes da montagem austríaca e convidou Maria Lucia Benedetti para fazê-lo em 1948. A então recente dramaturga – já que sua experiência em teatro era sumariamente como espectadora – foi assistir à peça e notou que se pautava basicamente em pantomimas com poucas palavras em uma cena de muita movimentação.

Maria Lucia Benedetti acreditou que através de um diálogo humorístico, um possível teatro para crianças surtiria efeito: "Tendo assumido o compromisso de fazer uma peça, tomei a deliberação de jogar com o diálogo o mais possível dentro das limitações da compreensão das crianças." (BENEDETTI, 1964, p. 104) Com essa linha de pensamento escreveu O Casaco Encantado, uma peça completa, dividida em três atos. Sobre a sua nova descoberta Maria Lucia Benedetti disse: "Tinha sido lançado o teatro para crianças fora dos moldes habituais. Nem escolar, nem amadorístico, mas o teatro como espetáculo de arte." (BENEDETTI,1964,p. 105)

O empresário acabou deixando seu projeto de lado e o Casaco Encantado caiu nas mãos dos melhores artistas de teatro daquela época: os Artistas Unidos (tendo como a personagem da mulher do mágico, Elizabeth da Inglaterra ou Henriette Morineau, uma das divas da companhia). O teatro infantil profissional ganhou reconhecimento, encontrando o seu sucesso junto à conjuntura do teatro moderno brasileiro, que no final dos anos 20 tem como idéia disseminar a cultura teatral de forma a ampliar platéias através de peças de boa qualidade crendo que essas seriam mais eficientes quanto à formação de público. O objetivo do teatro em se popularizar fomentou o aparecimento de novas montagens para o teatro infantil visto que as crianças seriam o futuro público do teatro:

Desde a década de 30 e cada vez mais a partir dos anos 50, os discursos correntes sobre o papel do teatro infantil insistem em um aspecto: o da formação de platéias mais amplas e mais sensíveis, contribuindo assim para afirmação e o aperfeiçoamento do nosso teatro. (CAMPOS, 1998,p. 68)

O teatro infantil ganhou o prestígio e o incentivo de atores, dramaturgos, críticos e demais intelectuais. Dessa forma, começaram a surgir concursos de teatro infantil com jurados de grandes nomes e premiação em dinheiro, como a Lei Jorge Lima em 1950 instituída pela Prefeitura. Havia premiação em dinheiro para os três primeiros lugares e o primeiro lugar teria seu livro publicado como uma edição especial da Prefeitura e distribuído à bibliotecas e escolas (públicas ou particulares), ou seja: o acesso ao teatro infantil seria para todos. A iniciativa foi vista com grande mérito na medida em que o divertimento para crianças era extremamente escasso. A lei promovia o aumento da produção textual para essa faixa e também o aumento do nível dos textos por parte dos autores, o que acabava consequentemente, atraindo o publico tanto pela qualidade dos textos quanto pelo fato de ser um concurso acirrado e fomentado.

Em 1962, surgiu o primeiro curso de teatro infantil, que formava professores especializados em literatura infantil; teatro infantil; marionetes, mamulengos, sombras e em psicologia infantil. Começando portanto, um pensamento mais aprofundado sobre o tema:

Mas, não se tratava apenas de um estudo ligeiro das principais obras da literatura infantil. Era preciso um pouco mais. Ir às raízes e fazer uma viagem longa e interessantíssima através dos tempos. Cumprindo esse dever, verificou-se que também a psicologia infantil deveria ser examinada ao menos de leve. (BENEDETTI, 1964,p.112)

Leis de incentivo e cursos voltados para a especialização demonstram que o teatro infantil passou de teatro feito dentro de casa à arte a ser pensada. Começaram a surgir dramaturgos especializados, que por sua vez, compreendiam o universo da criança, ainda que essa visão de mundo precisasse ser muito mais explorada. O primeiro passo da valorização do teatro infantil perante a sociedade estava imposto, sua importância foi compreendida e muito bem aceita pelo publico tanto adulto, quanto infantil. A criança encontrou seu lugar como espectadora de respeito e distinguiu-se claramente o teatro infantil do teatro escolar.

Pensar nos aspectos psicológicos da criança também foi um grande passo para captar as verdadeiras necessidades desse público. Não era um teatro apenas didático, como acreditava Coelho Neto, era um teatro que mesclava o pedagógico, o psicológico e a arte teatral em si, tudo dissolvido sob forma de representação. A criança se torna público expressivo e preocupante do teatro:

[...] Escrevi peças para que crianças fossem espectadores e não atores. Acho que o publico infantil precisa de espetáculos e é nessa direção que movo os meus esforços [...] Uma coisa é ver o espetáculo. Outra é fazê-lo. Por isso mesmo perguntam se sou contra a atuação de crianças. Em absoluto. Mas as crianças precisam ter peças e papéis que coadunem com suas idades e aproveitamento escolar. A pedagogia moderna aconselha insistentemente essa forma de desenvolvimento intelectual da criança. (BENEDETTI apud CAMPOS, 1998, p. 64)

Daí por diante, o teatro para crianças foi aos poucos tentando se moldar à própria figura da criança. Maria Clara Machado, na década de 1950, foi um marco em termos de textos de boa qualidade, com mensagens intrínsecas que atraiam tanto os pais quanto as crianças. Deixou-se de ver a criança como "bobinha", uniram-se linguagens (como a de bonecos e a musical com atores) e se trouxe a idéia de uma trama mais consistente e menos didaticamente explícita.

Porém, ao se aproximar da contemporaneidade, começou a haver a percepção de que o teatro infantil ainda precisava evoluir. Os textos mantinham equívocos constantes como o maniqueísmo; relações preconceituosas; peças e temas constantemente repetidos; o predomínio da moral; conflitos mal estabelecidos que se desencadeavam somente através da palavra; a ausência de contradições; a movimentação desenfreada em cena; a equivocada participação do público, o aparecimento freqüente de personagens estereotipados e pouco complexos. A partir de sua análise em No Reino da Desigualdade, Pupo (1991) diz:

Assim, aqui no período analisado, apesar desse teatro ter o seu espaço de atuação relativamente garantido, a especificidade da dramaturgia infantil, não lhe assegura um nível de qualidade enquanto criação artística. Muito pelo contrário, essa especificidade parece dificultar a plena realização de uma prática teatral conseqüente. (PUPO, 1991, p.148)

O teatro infantil especifica-se desde o início de sua trajetória. Percebeu-se a necessidade de haver um teatro voltado para a criança, já que era estranho para a mesma freqüentar o teatro de adulto. Apareceram recursos didáticos que seriam úteis à formação infantil e notou-se que o teatro poderia facilmente dar conta como entretenimento. A comissão de teatro nacional de 1937 traz à tona a necessidade da criança ir ao teatro e bate o martelo em relação ao teatro como boa ferramenta educativa. Maria Lucia Benedetti inaugura o teatro para crianças especificamente dentro da compreensão das crianças. Campos (1998) e a sociedade constatam que o teatro infantil é importante para a formação de platéias. Surge o primeiro curso de teatro infantil totalmente pautado na literatura e na psicologia infantil. O teatro para crianças claramente vai se especializando cada vez mais na figura criança, se rotulando e se fechando em uma categoria fixa.

Não se citou um teatro que pensasse tanto em crianças, quanto em jovens, ou em um teatro para todos, que conseguisse abarcar crianças, jovens e adultos. O teatro, que poderia ser infanto-juvenil ou livre acabou seguindo por uma classificação única e cômoda. O teatro infantil esqueceu, durante boa parte do seu tempo, de ser verdadeiramente teatro e gradualmente, começou a se encaixar nos moldes comerciais:

Na medida em que se autoproclama especificamente infantil ou infanto-juvenil, esse teatro vem quase sempre renunciado a cumprir um papel mais relevante, que possa distingui-lo do âmbito do simples divertissement promovido pela televisão, por exemplo. (PUPO, 2005, p.35)

Dramaturgos e encenadores contemporâneos como Ilo Krugli, Karen Acioly, Vladmir Capella, o grupo XPTO, dentre outros, tentam resistir às classificações mercadológicas e começam a questionar os moldes do teatro infantil. O público, de acordo com eles, não deve ser visto como mero espectador, se tornando um contribuinte significativo ao fazer teatral e à realização do espetáculo. A estrutura italiana, que separava palco e platéia, promovendo ilusão passa a ser questionada, estreitando o contato entre ator / público. Baseado nos formatos do teatro brasileiro moderno, o teatro infantil não deixa de seguir as tendências, visto que era de grande valia estar constantemente pensando sobre o contato com um público de tão difícil contenção e de extrema importância para o teatro. A verdadeira função do texto para a arte teatral infantil também estava sendo questionada; surgiram as possibilidades de usá-lo, de fragmentá-lo ou de abandoná-lo completamente. Foca-se na concepção dos espetáculos, nos signos, nos trabalhos corporais e técnicas, nas luzes, sons e imagens. O teatro infantil, pautado em textos se enfraquece e tenta se fixar em poesias, em imaginação, em jogos e principalmente como experiência transformadora, sem a necessidade de um entendimento uníssono, de forma a aproximar novamente o teatro infantil do adulto, almejando transformá-lo em universal.

De qualquer forma, durante a trajetória histórica do teatro infantil, pouco ouviu-se falar na figura do jovem e a sua possível e igualitária importância para o teatro. Se fechar em teatro infantil, automaticamente afasta a figura dos adolescentes desse tipo de peça, estes, possivelmente, já não desejam ver um teatro voltado para crianças. Ainda hoje vemos jornais e revistas que separam a sessão dos espetáculos de teatro entre infantil e adulto ( anexo 2), alguns colocam infanto- juvenil, porém a maioria das peças listadas são infantis (anexo 1) .Raramente observa-se um caderno de cultura que coloque as peças por ordem alfabética, sem distinções.

Ainda hoje, apesar evoluções, a figura do adolescente não foi pensada com especificidade. Diante disso, como aproximá-los do teatro?

2. OS JOVENS E A EXPERIÊNCIA NA ESCOLA – uma lacuna a preencher

"O gosto por uma cultura artística, contudo, se constrói desde a infância. Aproximar crianças e adolescentes das atividades teatrais é de fundamental importância, se quisermos pensar em formar espectadores. (Desgranges, 2002, p.33)

O teatro infantil tem cunhado em seu nome, o pressuposto de que é débil, infantilizado, simples, incompleto e adequado à figura da criança. Teatro é teatro. A busca de uma linguagem específica para crianças pode em determinados casos cercear a dimensão artística do teatro. O teatro dito infantil não possui o mesmo reconhecimento de um teatro para adultos podendo ser classificado pelo senso comum – como diz Desgranges – um "subproduto artístico". Segregar o teatro em categorias enfraquece, de certa forma a arte teatral como um todo. O teatro visivelmente é entendido como mercadoria, mercadoria para divertir as crianças, mercadoria para divertir os adultos; e sobram os adolescentes que ficam nesse intermédio, com peças mais ou tão fracas quanto às infantis.

Plantar a semente do teatro dentro da criança é, de fato, de grande importância para o fortalecimento deste como um todo, assim como é importante a aula de teatro no dia-a-dia da criança, pois, entendendo o teatro podemos formar novos atores, novos diretores, novos espectadores e fortalecendo essa arte. O teatro não sobreviveria se fosse só um mero divertimento adulto. Nas décadas de 1960 e 1970, como vimos no primeiro capítulo, começou-se a pensar na figura da criança e atribuir importância a ela. Surgiram os espetáculos teatrais específicos para crianças, em que se se buscava uma linguagem própria e uma maior compreensão deste universo para poder atingí-los. Nesse período surgiram diversos autores e diversas montagens voltadas para esse público. Foi o boom do teatro infantil.

Uma vez que o público infantil passa a ser reconhecido teatralmente como um público adulto em potencial, há de se pensar como sustentar a semente que foi implantada na infância: Será que os jovens assistem peças infantis? Qual o produto teatral direcionado ao jovem? Será que os adolescentes que assistiram a peças teatrais na infância permanecem tendo gosto pelo teatro?

Ao se pensar sobre o público de teatro, chega-se a conclusão que um público instruído, entendido, capacitado artisticamente é a alma da sustentação da nossa arte. Há de se validar as aulas de teatro – que muitas vezes são entendidas apenas como meras apresentações de festas temáticas – mas que por muitas vezes são experiências únicas e que permitem a compreensão e a transformação do sujeito que antes era alienado sobre as questões teatrais em um sujeito que conhece os bastidores, que já leu um texto dramaturgico, que já atuou e participou de um processo, mínimo que seja, de direção.

No livro A Pedagogia do Espectador, Flávio Desgranges fala de estratégias de formação do espectador e da importância da experiência cênica para a construção de um pensamento crítico em relação à arte:

Um dos eixos da formação que se pode oferecer à criança espectadora consiste em fornecer os instrumentos conceituais necessários ao despertar de seu espírito critico. De simples consumidor de espetáculos, ela pode tornar-se capaz de formular e sustentar suas apreciações. Trata-se de iniciar o público infantil na linguagem específica da criação teatral, a fim de fomentar , por meio do espetáculo, sua reflexão. Compreende-se, assim, a formação de espectadores como a aplicação de procedimentos destinados a criar o gosto pelo teatro e ressaltar necessidade e a importância da arte [...] (Desgranges, 2002, p.34) (grifo meu)

Ao se pensar em teatro, em prática teatral, pode-se afirmar que o público, assim como o palco, os atores, diretores, cenógrafos, iluminadores, todos, são importantes para que o teatro efetivamente aconteça. O que se deseja investigar mais precisamente nesta pesquisa é o público, uma esfera sensível desse todo que tende, atualmente, a ser esquecida em prol de um produto mercadológico; de peças de teatro que seguem o modo da propaganda, da cultura áudio-visual; um teatro mais para ser vendido do que preocupado com suas possibilidades artísticas. O teatro passa a ser um produto a ser comprado pelo espectador. O que pode estar acarretando um processo de esvaziamento desta arte? Há de se buscar entender, perante esse constante esvaziamento das salas de espetáculo, se o hábito de ir ao teatro está sendo cultivado.

Por sua vez, o foco desta pesquisa é o jovem. O jovem está em um momento intermediário da vida: entre a infância e a fase adulta e, em relação ao teatro, podemos dizer que é possível que grande parte desses jovens, quando criança, tenham tido algum contato com o teatro. Afinal, os pais costumam levar seus filhos para atividades culturais e, naturalmente julgam que é estimulante e importante para a criatividade e desenvolvimento da criança. Só que a partir do momento que os pais começam a perder o controle dos filhos, na medida em que eles vão crescendo, se torna complexa a compreensão por parte dos mesmos de que o teatro ou qualquer outra atividade artística, é interessante, desenvolve pensamento, e de alguma forma, é importante.

Desgranges cita em seu texto uma interessante pesquisa acerca da necessidade de se cultivar o hábito em diversos eventos dentre música, museus e inclusive teatro. Para o pesquisador, a idade em que estamos mais abertos ao teatro seria dos doze aos quinze anos, faixa de idade tipicamente adolescente:

Evoco um estudo do sociólogo holandês T.Kamphorst, que investigou a maneira pela qual o público adulto tinha sido sensibilizado pela primeira vez para diversos eventos. Ele calculou, em seguida, as chances de um adulto ir "x" vezes ao concerto ou ao teatro, em função da idade em que havia socializado para esse evento. Os resultados são bastante interessantes. Em se tratando de um concerto, e mostra que, se não tivermos adquirido o hábito entre cinco e os oito anos, teremos muita dificuldade em ir a um concerto de música clássica mais tarde. No que concerne aos museus, [o hábito se adquire] entre oito e doze anos; no que se refere ao teatro, entre doze e quinze anos;[...] mesmo sabendo que não há idade precisa para estarmos mais abertos, existem determinados períodos em que estamos mais receptivos que outros. (DESGRANGES apud Saez, 2002, p.34)

A questão fica mais interessante quando se coloca em evidência a necessidade de manter esse hábito através de um olhar entendido sobre o assunto. Não gosta de teatro quem não entende o teatro, quem não consegue embarcar no caleidoscópio de signos que o espetáculo se propõe a nos apresentar, porém, é necessário formar esse olhar caleidoscópico. É tão importante as crianças criarem gosto pelo teatro quanto terem um entendimento sobre esta arte. Em tese, uma coisa depende da outra.

Por que motivos o jovem permanece indo ao teatro? Porque motivos ele nunca vai ou nunca foi? Por que motivos ele deixa de ir? O teatro parece perder para as novelas, para as telas, para internet. Segundo Desgranges, estamos vivendo num mundo da imagem e tal fato pode deturpar a percepção do espectador visto que este, recebe uma enxurrada de signos dados através da maré de programas e propagandas que seduzem imediatamente e não permitem ao menos, que o espectador faça escolhas, pense, interprete, crie, "influenciando seu modo de relação com a espetacularidade e seu horizonte de expectativa" (2002, p.38).

Percebe-se no nosso próprio cotidiano que os amigos fora do círculo teatral, não têm o hábito de ir ao teatro; há aqueles que já foram uma vez e possuem uma memória do que aconteceu, há aqueles que foram e não lembram, há muitos que foram quando criança, mas posteriormente deixaram de ir. Poucos são os que efetivamente vão e sabem conversar sobre uma peça. O fato é que as nossas salas de teatro carecem de público e as pessoas não costumam destinar um momento do seu tempo livre para ir ao teatro e com freqüência citam visitas esporádicas, o que demonstra a falta de hábito. Hábito este que pode ser cultuado desde a infância ou que pode surgir de repente, aparecer durante a vida. Pretende-se aqui analisar jovens, estes que estão entre a infância e a fase adulta e que já possuem discernimento para optar por suas atividades. Quer-se saber se os jovens assistiam teatro quando criança, se o hábito está começando a ser criado e fincando suas raízes[2]

É nesse ponto que o trabalho se sustenta: na iminência do espectador do presente se tornar espectador do futuro. A resposta dos jovens espectadores estes, no caso, formados pelas escolas e salas de teatro, pode indicar que provavelmente, no futuro ele será um espectador do teatro adulto e que num futuro mais distante, irá levar seus filhos, causando, portanto, um ciclo que mantém viva a arte teatral.

O complicado é que essa ida ao teatro tende a diminuir logo depois da infância, o que talvez comprove que o jovem até deseja ir ao teatro, mas não sabe ao certo o que ver, fica confuso diante das classificações, que raramente dizem juvenil ou infanto-juvenil.

As crianças querem deixar o mais rápido possível de ver teatro infantil, querem fazer tarefas de pessoas mais maduras e onde o teatro se enquadra? Os jovens atuais vivem em um meio informatizado; já não existe a carência de informações. Todo mundo sabe de tudo. O teatro para ensinar já não tem mais o mesmo efeito. O que vale mesmo é a essência do teatro, o gosto pela experiência artística. Pena que poucos são os grupos que se arriscam a destinar espetáculos dessa natureza para jovens e crianças.

A escola, além de milhares de responsabilidades, tem a necessidade de formar não só o aluno para prestar vestibular, mas também um cidadão. O ensino escolar deve conter em seu currículo o ensino das artes e também uma sensibilização dos alunos. O teatro também se fortalece na abertura de escolas para o ensino das artes. As aulas de teatro dadas nas salas de aula podem ser um start para um futuro artista ou espectador. Porém, muitas vezes, as instituições escolares acreditam que levar peças à escola é suficiente para ocorrer a aproximação sujeito / teatro e não pensam que é fácil o aluno estabelecer uma relação de imposição ao ver uma peça que não foi por ele escolhida e muitas vezes que nem é do interesse deles. É necessário ensinar a entender o teatro. Não adianta colocar a arte garganta abaixo de alunos que nunca tiveram um íntimo contato com o teatro, pois isso pode ser traumático. A escola deve ser cautelosa, pois uma primeira relação negativa com o teatro pode vir a acarretar um futuro parecer deturpado sobre a arte.

Continuando o comentário acima, não sabemos em que medida, as peças de má qualidade afetam o parecer da criança sobre o teatro, mas sabemos que provavelmente aqueles que tiveram ou tem um primeiro contato negativo com o teatro tendem a não voltar, acreditando que a próxima experiência será tão ruim quanto a primeira. Projetos-escola parecem ser rentáveis para grupos de artistas, porém a escola deve entender que teatro dentro da escola não se efetiva apenas na esfera do didático. Teatro é arte! Com freqüência, esquecem-se do cunho artístico não só do teatro, mas da arte em geral, para poder atribuir a importância em outros pilares, na maioria dos casos, didático, útil. O teatro tem fim em si mesmo e não pode se menosprezar o fato de este ser artisticamente interessante para crianças e jovens. Porém, não é o que tem acontecido atualmente. As peças para crianças e jovens têm admitido, com freqüência, temas lógicos, e, ainda que dissolvidos, tendem a ser didáticos e de má qualidade. Não se pode deixar de pensar este público como espectadores que devem ter a capacidade de compreender e questionar as peças.

Bertolt Brecht, no final da década de 1920, junto com outros pensadores teatrais, começa a se questionar sobre a passividade do público diante de um espetáculo teatral. O diretor alemão propunha a quebra da quarta parede, e conseqüentemente, a quebra do efeito ilusionista que o teatro provocava. Ou seja, ele acreditava que o espectador não deveria assistir à peça apenas para contemplá-la, mas sim para pensar, para criar. Brecht e seu teatro épico buscavam não permitir que o espectador se esquecesse que estava assistindo a uma peça de teatro. Os atores não se metamorfoseavam em seus personagens, a peça muitas vezes não possuía um caráter contínuo, fragmentava-se, utilizava-se de recursos como placas com dizeres, o personagem se referia a si na terceira pessoa, os atores experimentam a pele de outro personagem numa mesma trama.

Brecht, ao raciocinar o teatro épico, concluiu que era de extrema importância a função do espectador, e que era nele que o fato artístico se encerrava. O público, além de contemplar a peça de teatro, deveria também estabelecer alguma relação crítica com a mesma. Não cabia mais ao teatro, nesse período, de acordo com Brecht, que o espectador só recebesse informações, se identificasse com o herói, se consternasse com ele e ficasse feliz com o seu final feliz. Cabia ao espectador moderno entender o conflito do personagem principal, que já não é mais o herói, e sim um ser passível de transformações, de mudanças. Cabia a ele também buscar entender possíveis caminhos que esse personagem pudesse seguir e, principalmente, questionar tanto as atitudes do personagem, quanto o tema da peça, ou as relações entre a montagem e o diretor. O teatro épico era um teatro político. O que importava era que o espectador ficasse instigado, incomodado com algo que ali viu e assim, refletisse sobre a sua situação atual de vivência. Dessa forma, jogo teatral que envolve "autor / contemplador / obra" estaria portanto, efetivado.

Estamos em 2011. Brecht se preocupava, nas décadas de 1920 e 1930, em não esconder os mecanismos cênicos, desnudando o evento teatral. Provavelmente deve ter sido um baque para a população da época um teatro contra a ilusão. Hoje porém, vivemos em um mundo de informações de fácil acesso. Ninguém mais se impressiona ao saber como as coisas são feitas, é muito mais complexo efetuar o efeito ilusório no mundo da nanotecnologia, do 3D, dos recursos holográficos. Um dos alunos aqui analisado respondeu à pesquisa, ao dizer sobre o que faltava no teatro para que este fosse mais interessante, citou hologramas; ou seja, para ele, assistir seres humanos reproduzindo outra realidade, era coisa do passado.

Reproduzir uma realidade não é mais função do teatro atualmente. O teatro contemporâneo não envolve um texto, uma ação única, ou qualquer coisa que remeta a uno ou linear. Ele envolve multiplicidade, polifonias, misturas, e, cabe ao espectador vivenciar a experiência e fazer escolhas; ou seja, não é mais necessário entender, mas é preciso apreender, optar, criticar, selecionar e tirar o que dali se refere ao seu universo, o que dali o movimenta e assim se transformar.

Durante todo o trabalho, buscou-se pensar sobre a permanência do hábito de se ir ao teatro, acreditando que o público jovem de hoje, será o público do teatro adulto de amanhã. A verificação é válida, porém, não se encerra nela mesma. É necessário saber se os alunos entrevistados entendem o teatro. Porém, a pesquisa não dá conta totalmente dessa informação. É fato que não necessariamente os jovens de hoje irão ao teatro amanhã, não se deposita essa responsabilidade a estes, porém é possível diagnosticar a possibilidade de eles permanecerem freqüentando o teatro, partindo do pressuposto que eles são espectadores formados pela vivência em sala de aula e pelas respostas que dão a respeito das peças que vêem. Mesmo assim, não é possível fazer nenhuma afirmação de que somente os jovens formados irão ao teatro quando adultos. Esse pensamento é muito relativo, pois a qualquer momento, um jovem, uma criança ou um adulto pode se sentir tocado pela arte e tal fato não pode ser analisado quantitativamente, fugindo portanto, da nossa capacidade de apreensão destas informações.

3. UM ESTUDO DE CASO[3]

Depois da investigação sobre o teatro infantil e a importância da permanência desta experiência no processo formativo do jovem, esta pesquisa vai buscar perceber se os jovens que possuem experiência de aulas de teatro na escola, consequentemente, estão indo ao teatro. Quer-se saber em que lugar está o teatro depois da infância. Quer-se descobrir, a partir da amostra a ser analisada, se o teatro permeia as duas fases da vida desses jovens e se terá potencial para permear a fase adulta.

Para isso, foi elaborado um questionário, composto de perguntas claras, fechadas, com alternativas e outras, abertas, onde poderia se responder livremente. Tentou-se estabelecer apenas dados quantitativos. Nas perguntas abertas optou-se por observar as respostas mais citadas ou semelhantes e agrupá-las de forma a criar um único grupo maior, tentando seguir a mesma linha das respostas dadas.

Tal questionário, foi respondido por pessoas de idades variadas que se auto-consideraram adolescentes ou pré-adolescentes, para que não se entrasse na questão psicológica, ou mais aprofundada, sobre qual idade seria a adolescência, que possui diversas vertentes e é tão divergente. Foi principalmente necessário, que os entrevistados já tivessem tido a vivência do momento da infância, por isso, os que se consideraram crianças automaticamente foram descartados da pesquisa.

A pesquisa foi realizada em escolas tanto públicas quanto particulares, sendo Santos Anjos e Escola Parque, particulares e Escola Municipal Minas Gerais e Escola Municipal Marechal Estevão as públicas. E abrangeu alunos dos seguintes bairros do Rio de Janeiro: Barra da Tijuca, Botafogo, Centro, Copacabana, Engenho da Rainha, Flamengo, Gávea, Grajaú, Humaitá, Inhauma, Ipanema, Jardim Botânico, Lagoa, Leblon, Madureira, Pilares, Santa Teresa, São Conrado, Tijuca, Tomas Coelho, Urca, Usina e Vila Isabel. Há um desequilíbrio em relação ao numero de alunos entrevistados da zona sul (112 entrevistados) e da zona norte (146 entrevistados) em contraposição, as da zonas oeste (16 entrevistados) e Centro (3 entrevistados) do Rio de Janeiro. Cinco pessoas não responderam à questão relacionada ao bairro que vivia. Diante deste primeiro fato, não trataremos aqui, especificamente da facilidade ou dificuldade de acesso às salas de espetáculo ou sobre a relação de número de salas de espetáculo por bairro. Porém, de forma alguma podemos deixar de evidenciar que a Zona Sul e Centro do Rio de Janeiro possuem um número muito superior de salas de espetáculo em comparação com as Zonas Norte e Oeste.

Realizar essas pesquisas em escolas apresentou facilidades e dificuldades. Foi difícil encontrar abertura por meio das escolas públicas do Rio de Janeiro. Foi dada a proposta, pela Secretaria de Educação, de reformular os questionários segundo interesses próprios, porém, preferiu-se manter os objetivos iniciais. Além disso, encontram-se obstáculos por parte de todas as escolas, em geral, no sentido da disponibilidade de horário para a aplicação dos questionários. Os professores que colaboraram com esta pesquisa lecionam teatro nas respectivas escolas e eles aplicaram, pessoalmente, em suas aulas (antes ou após), pois demonstraram interesse pela pesquisa e apresentaram dificuldades diante da participação direta do pesquisador na escola. Neste caso, o pesquisador não teve nenhum contato direto com as escolas abordadas.

Como a pesquisa foi aplicada com alunos do ensino médio, em síntese, foram entrevistados 30 alunos de 11 anos; 62 de 12 anos; 36 de 13 anos; 64 de 14 anos; 67 de 15 anos; 20 de 16 anos e 2 de 17; e um de 18 anos. Sendo 133 meninos e 148 meninas e um aluno que não identificou o sexo, num total de 282 adolescentes ou pré-adolescentes.

Oitenta e nove desses alunos são do Colégio Santos Anjos localizada na Tijuca, 122 da Escola Parque localizada na Gávea; 62 da Escola Municipal Marechal Estevão localizado no Engenho da Rainha e 9 da Escola Municipal Minas Gerais na Praia Vermelha. Totalizando 211 alunos de escolas particulares e 71 de escolas públicas.

É perceptível que o resultado dessa pesquisa não pôde ser feito através de comparações entre: alunos de escolas publicas e particulares; zonas; meninos e meninas; idades e entre escolas, por conta do desequilíbrio numérico existente. Assume-se, portanto, o caráter heterogêneo da pesquisa por um lado e por outro homogeniza-se a pesquisa a partir do momento em que se observa o jovem de forma igualitária, sendo, sumariamente necessário à essa análise ser adolescente ou pré-adolescente e ter aulas de teatro na grade curricular ou vínculo contínuo com um projeto. Como o caso dos alunos da Escola Municipal Minas Gerais que em parceria com a Biblioteca da UNIRIO e com os alunos / professores da Escola de Teatro desenvolvem atividades teatrais semanais. Cem por cento dos entrevistados se auto-intitulam adolescentes ou pré-adolescentes e possuem aulas de teatro semanalmente.

Buscou-se saber como os jovens preenchiam as suas horas livres na infância de forma a entender um pouco sobre a infância contemporânea. Afinal, as crianças já nascem inseridas no meio tecnológico e é interessante entender como isso reverbera nessa idade e principalmente, no caso dessa pesquisa, futuramente. Tentou-se entender a relação do jovem com a infância: se ele teve a oportunidade de brincar de piques, de bola; se brincava em casa de jogos de tabuleiro ou de vídeo-game; se costumava ler ou ir ao cinema, teatro; se praticava esportes, viajava ou assistia televisão e ficava no computador.

Como o objetivo principal é tratar da relação do jovem com o teatro, deseja-se saber com freqüência o jovem ia ao teatro quando criança e com que freqüência ele vai ao teatro.Desse modo, pode-se fazer uma análise comparativa entre as duas freqüências de modo a perceber se essa freqüência tende a aumentar, diminuir ou permanecer. Assim podemos analisar o hábito de ir ao teatro dos jovens abordados.

Para traçar uma análise comparativa, analisam-se também os hábitos de leitura, de ir a museus e de ouvir música a fim de entender através de outros indicadores culturais, se há uma problemática geral em termos de cultura ou se é apenas o teatro que carece de público. Ainda nas análises de freqüência, objetiva-se entender qual a relação do jovem com a internet e se essa relação pode estar refletindo nas demais freqüências. Será que o jovem atual busca mais a internet do que lê livros?

Acreditando que os jovens abordados possuem uma forte relação com TV, telas e monitores, pergunta-se quais os programas de televisão eles preferem assistir dentre: séries, desenhos, filmes, novelas, esportes, jornal, música, culinária e um espaço aberto para escreverem o programa que desejarem.

Deseja-se saber se os jovens gostam de teatro, porque gostam e o que o teatro precisaria ter para se tornar mais interessante. Diante de tais respostas, podemos descobrir se as aulas de teatro e as idas às salas de espetáculo têm construído uma visão crítica nesse jovem. Ainda pensando nessa visão crítica, pergunta-se sobre os tipos de peças que mais gostam de assistir. A fim de entender também que tipo de teatro o jovem contemporâneo tem necessidade de assistir.

Busca-se entender através da memória deles, o valor dado às apresentações que eles assistem, podendo perceber se o teatro lhes marcou a vida ou apenas aconteceu e foi esquecido; diante disso questiona-se sobre o nome da última peça que assistiram e diante dessas respostas poderemos compreender mais profundamente que tipo de espetáculo o jovem tem assistido.

É importante indagar se os jovens acham que existe diferença entre teatro para adulto e para jovens, almejando encontrar algum direcionamento para o entendimento do teatro para todos os públicos ou pelo contrário, se os jovens acham que há ou deve haver um teatro específico para a sua respectiva faixa de idade estando, portanto, pautado nos ideais comerciais restritivos atuais.

Por fim, procura-se saber o que os jovens mais gostam de fazer nos tempos livres de forma a compreender melhor as formas de diversão do jovem atual, sempre estabelecendo uma comparação com as freqüências dos indicadores culturais analisados anteriormente.

4. ANÁLISE QUANTITATIVA DOS DADOS

A primeira questão relacionada propriamente aos hábitos do jovem é o dado numero seis (anexo 3). Pergunta-se sobre como o jovem ocupava as suas horas livres na infância a fim de sabermos quais eram os hábitos infantis do jovem de hoje (gráfico 1). A maior parte dos jovens respondeu que preenchiam o tempo livre assistindo televisão (filmes, desenhos, séries...), que resultou em 225 respostas. Em segundo lugar encontra-se o cinema, com 176 respostas e em terceiro lugar os esportes, com 174 respostas. Em ultimo lugar ficou o museu, com apenas 25 respostas marcadas e logo em seguida o teatro, com 58 marcações.

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Gráfico 1

O questionário perguntava aos jovens sobre a freqüência de ida ao teatro na infância e na época atual. No passado (gráfico 2), 68 pessoas disseram que nunca foram ao teatro, 95 pessoas que raramente iam ao teatro, 52 pessoas disseram quem iam ao teatro de vez em quando, 50 algumas vezes, 9 marcaram o campo de muitas vezes e 4 marcaram o campo de sempre. Logo, a maior parte deles raramente ia ao teatro quando criança. Já a freqüência atual (gráfico 3) se diferencia pela sua menor variação: 46 pessoas nunca vão ao teatro, 70 raramente vão ao teatro, 50 pessoas indicaram que vão ao teatro de vez em quando, 56 algumas vezes, 46 muitas vezes e 14 sempre.

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Gráfico 2 Gráfico 3

Portanto, assim como no passado, a maioria dos jovens freqüenta raramente o teatro. É importante ressaltar também que o numero de pessoas que vão muitas vezes ao teatro aumentou bruscamente, assim como as freqüências nunca e raramente diminuíram, comparando o passado com o presente.

Ao comparar separadamente, cada freqüência, ou seja, ao diagnosticar se eles tendem a ir mais ou menos ao teatro com o passar do tempo, observa-se um resultado um tanto contraditório (gráfico 4) : 154 alunos indicaram que a freqüência quando criança era maior do que a atual, 81 alunos que essa freqüência permaneceu a mesma e 47 alunos que a freqüência aumentou com o passar dos tempos.

Monografias.comGráfico 4

Para se ter uma noção sobre o entendimento cultural desses jovens, foram analisadas as constâncias nos seguintes indicadores culturais: literatura, museus e música.

Ao comparar o indicador literatura (gráfico 5) , percebe-se que a maioria dos jovens lêem livros algumas vezes, contando com 89 respostas e portanto 32% dos entrevistados[4]Em segundo lugar, aparecem juntos muitas vezes e de vez em quando, com 17 % e portando 50 e 51 respostas marcadas. Conclui-se assim, que o público analisado tem uma leitura mediana.

Monografias.comGráfico 5

Em relação à ida aos museus (gráfico 6) percebeu-se que a maior parte dos alunos responderam que iam raramente aos museus, contando com 39% das respostas (113 respostas). Em segundo lugar vêm as respostas indicadas por de vez em quando , com 21% logo seguido do nunca, com 60 respostas e portanto 21 % das respostas recolhidas. Os campos menos marcados foram os do sempre e muitas vezes (10 respostas), ambas com 4% do total. A freqüência desses alunos em museus é comprovadamente baixa.

Monografias.comGráfico 6

Avaliou-se a freqüência da música na vida do jovem (gráfico 7) e concluiu-se que 229 (82%) dos entrevistados alegaram que sempre escutam música; em segundo lugar contam-se 35 respostas (12%) relacionadas a muitas vezes. O campo relacionado aos que nunca escutam música só contou com uma resposta. Esse resultado indica que a música consegue abranger bem o publico jovem, que a música faz parte da vida do jovem.

Monografias.comGráfico 7

Analisou-se também a influência da internet no cotidiano do adolescente (gráfico 8) e comprovou-se que possui intensa presença no cotidiano do jovem totalizando 198 (71%) dos entrevistados com respostas indicando que sempre escutam musica, em segundo lugar conta-se 56 (20 %) respostas com muitas vezes. Só duas pessoas marcaram o campo relacionado a nunca acessar a internet.

Monografias.comGráfico 8

Perguntou-se qual o programa favorito o jovem costuma assistir na TV (gráfico 9) , a fim de estabelecer o perfil televisivo do adolescente (poderiam ser marcadas mais de uma alternativas): 251 alunos responderam que costumam assistir a séries na TV. Em segundo lugar encontram-se os desenhos, com 204 respostas, em terceiro lugar estão os filmes, com 155 respostas. Em quarto lugar estão as novelas com 125 respostas, em seguida, com 113 respostas estão os programas de esportes. Com 111 marcações encontram-se os jornais. Em últimos lugares estão: a música, com 77; culinária, com 31 e 25 com outros. Esse resultado mostra que os jovens de hoje se interessam pelas as linguagens representacionais seja através de séries, animações, filmes ou novelas.

Monografias.comGráfico 9

Perguntou-se sobre o gosto do jovem pelo teatro (gráfico 10) e 226 alunos alegaram que gostam de teatro, o que corresponde a 80 % das entrevistas realizadas. Quarenta e oito alunos não gostam de teatro (17%). Seis alunos não responderam e dois deram outras respostas. Conclui-se que o jovem tem interesse pelo teatro em sua grande maioria.

Monografias.comGráfico 10

Em seguida, perguntou-se por que o jovem gosta de teatro (gráfico 11) ou se não gosta, o que o teatro precisaria ter para ser mais interessante (gráfico 13). Essas respostas suscitaram pensamentos muito abertos e dentre os mais citados deles, pudemos dividir os seguintes grupos: porque é ao vivo (comparações entre teatro e cinema, teatro e TV, apontamentos sobre o realismo que o teatro propõe e etc.); porque é divertido (engraçado, humor, etc.), respostas vazias (que indicam o grau de complexidade da pergunta); porque é interessante; porque é legal; por que é cultura. E também se subdividiram respostas que enfatizavam o que o teatro precisaria ter ou ser para ser melhor como: mais comédia (diversão, humor...); mais ação, mais suspense...De acordo com o gosto da amostra pelo teatro, as respostas que indicavam o que o teatro precisaria ter para ser mais interessante foram bem inferiores numericamente do que os que responderam por que gostam. O resultado obtido não é 100% correto por conta das respostas poderem muitas vezes, ser dúbias e terem sido talvez enquadradas em uma divisão divergente do objetivo do entrevistado. Portanto, em uma estimativa, a maioria dos alunos (45 respostas relacionadas), gostam de teatro pelo fato de ele ser ao vivo, grande parte cita com essas mesmas palavras ou relaciona o teatro com o cinema/filme e o fato de o primeiro ser ao vivo. Em seguida, grande parte dos alunos cita o fato de o teatro ser uma boa diversão: 37 das respostas analisadas. Grande parte dos alunos (31) não respondeu absolutamente nada sobre essa questão o que indica que eles possam não vir a ter um pensamento formado sobre esse assunto.

Monografias.comGráfico 11

Os que apontaram melhoras para o teatro (gráfico 12) as relacionaram com o fato da necessidade de o teatro apresentar mais comédias ou ser mais divertido, que somam cerca de 20 respostas. Parte dos alunos apenas enfatizou o fato de não gostar de teatro porque não tem tempo, paciência ou simplesmente não gostar (cerca de doze respostas). Os demais apontamentos sobre melhoras tiveram de três a uma respostas e citaram: mais emoção, mais musica, mais jogos, mais interação, mais ficção, dentre outros.

Monografias.comGráfico 12

Desejou-se saber qual eram os temas que o jovem gostaria de assistir no teatro (gráfico 13) e 174 alunos disseram que gostariam de assistir peças de comédia, 25 alunos responderam musicais, 20 alunos responderam romance. Em últimos lugares ficaram drama, improviso, infantil e stand up comedies. Os temas que mais agradam os jovens são as comédias e os musicais, talvez por conta de serem espetáculos grandiosos, bem divulgados e para todos os públicos.

Monografias.comGráfico 13

Ao perguntar sobre o nome da última peça que viram (gráfico 14), 146 alunos se recordaram do nome da ultima peça (50%), 110 não lembram, 19 alunos nunca foram ao teatro e 2 não responderam e 3 deram outras respostas. Observa-se que poucos alunos da amostra analisada nunca foram ao teatro, a maioria deles já teve algum contato com alguma peça teatral.A partir dessa resposta pode-se concluir que a metade dos analisados possuem registrado na memória o último espetáculo que viu demonstrando que tiveram interesse e atenção pelo que foi visto.

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Gráfico 14

Dentre os diversos nomes de peças respondidas (anexo 5), a mais citada delas foi Viajando Com as Regiões, peça que foi levada à escola Santos Anjos, com 10 respostas. Em segundo lugar encontrou-se A Noviça Rebelde e Confissões de Adolescente com 9 respostas e com 8 respostas encontrou-se a peça ( comédia de improviso). Cabe ressaltar que a maioria dessas peças citadas nos questionários respondidos partiu de alunos das escolas particulares da zona sul e norte, portanto com alto poder aquisitivo, alguns citam peças fora do Brasil e possuem um largo acesso ao teatro do mundo inteiro. A mais votada das peças foi a que fez parte de um projeto-escola, o que significa que o teatro foi à escola e não partiu da vontade do aluno assistir esse determinado espetáculo. A Noviça Rebelde é um musical para todas as idades e Confissões de Adolescente é uma peça tipicamente juvenil. é uma comédia baseada no improviso também de classificação livre.

O questionário consta de uma pergunta sobre a existência de diferenças entre teatro infantil e adulto (gráfico 15) a fim de descobrir se o jovem acredita que o teatro é para todos e não se mantém em cima de classificações ou se ele acha que existem claras diferença entre os dois tipos de teatro. Cento e sessenta e cinco alunos (58%) disseram que há diferenças entre teatro para jovens e para adulto. Noventa pessoas (32%) disseram que não há diferença. Onze alunos não souberam responder e 10 não responderam. Seis alunos deram respostas como depende, não muito e sim e não. A maioria deles, portanto, acredita que existe diferença entre esses tipos classificatórios de teatro.

Monografias.comGráfico 15

Segundo eles, essa disparidade se dá (gráfico 16), principalmente, por conta dos temas abordados (65 respostas). Acreditam que em peças para adulto fala-se coisas mais sérias, mais pesadas e coisas mais leves e cômicas num teatro voltado para jovens. Tiveram 33 respostas que diferenciavam os dois tipos de teatro por conta da linguagem. Trinta e um jovens disseram que a diferença se baseia na censura, ou seja, há coisas que os jovens não podem assistir como cenas de violência e sexo. Dezoito alunos não responderam essa questão. Dezesseis alunos responderam indicando a diferença através da complexidade das peças apresentadas para adultos e jovens. Seis alunos falaram que adulto gosta mais de teatro que os jovens. As demais respostas (duração, jovem gosta mais, jovem gosta de cinema e os que não sabem) tiveram apenas uma resposta. Essa pergunta era uma pergunta aberta e as respostas foram classificadas em grupos de respostas semelhantes dadas pelos alunos.

Monografias.comGráfico 16

Cabe aqui observar com louvor, a quantidade de pessoas que apontaram que não há diferença entre as duas classificações teatrais muitas vezes indicando que tudo é arte. Esses jovens provavelmente estão acostumados a ver peças de censura livre e não conseguem visualizam diferenças entre um teatro para o outro.

Para finalizar, perguntamos o que o jovem mais gosta de fazer nos tempos livres (anexo 6) e a resposta mais referida foi o uso de computador com 140 citações sejam elas internet, msn, orkut ou mesmo ficar no computador. Em seguida, os jovens responderam que gostam de sair conversar ou qualquer tipo de relacionamento com amigos (62 respostas citadas). Em terceiro lugar encontra-se assistir televisão com 58 respostas, seguido por ouvir música ou tocar música com 36 respostas. Praticar esportes (andar de bicicleta, academia e etc.) teve 34 citações, jogar vídeo-game 31, e ler 30. Dormir foi citada 21 vezes e ir ao cinema foi falado 18 vezes; ir ao teatro ou fazer teatro constou com 11 respostas. As demais respostas tiveram um numero menor de citações. Conclui-se portanto que a tarefa que o jovem mais gosta de executar em seus tempos livres é utilizar o computador.

CONCLUSAO

Diante dos resultados dos questionários pode-se afirmar que, no geral, os jovens atuais, sofrem uma influência muito forte dos meios televisivos e da internet desde a infância. Dessa forma certifica-se através da pesquisa, que quando criança, a maioria dos jovens respondeu que preenchia o seu tempo livre assistindo televisão. Em contrapartida, fica claro que não deixavam de lado passeios, jogos e o computador. Dessa forma, podemos concluir que os jovens analisados, em sua maior parte, têm uma relação muito forte com o meio televisivo. Esse fato pode reverberar na escolha das peças que costumam assistir, em sua maioria, peças divulgadas pela TV ou com atores reconhecidos por trabalharem na TV.

A relação desse jovem com o teatro durante a infância aparentemente parece ser frágil diante dos resultados obtidos. Em sua maioria, os jovens, raramente iam ao teatro. Fator que se observa semelhantemente na atualidade desses jovens. Terminantemente, o teatro pouco faz parte do cotidiano do jovem. E para agravar a situação, comparando as duas respostas observa-se que a freqüência tende a diminuir com o passar do tempo, tornando possível concluir que por mais que esses jovens tenham o incentivo de ir ao teatro por conta das aulas semanais nas escolas, o teatro não apetece o gosto deles. São jovens que possuem uma freqüência de leitura mediana, provavelmente por conta da obrigatoriedade das aulas de português ou por gosto próprio.

Em relação à ida aos museus, o jovem se apresenta como preguiçoso e esta atividade geralmente não os interessa. A maior parte deles apresenta uma forte dificuldade de se movimentar, de sair de casa, de brincar, de procurar o outro.

Em toda a pesquisa, os índices mais gritantes foram os relacionados à música e à internet. A maior parte dos alunos indicou que sempre ouve musica e sempre acessa a internet. Atualmente uma coisa está diretamente atrelada à outra, não há necessidade de sair de casa para ter acesso a música, é só utilizar a internet. Em poucos minutos é possível ter acesso a diversos álbuns completos. Os aparelhos de mp3 e celulares modernos permitem que o jovem carregue consigo grande quantidade de música. Pode-se observar que grande parte das pessoas que observamos nas ruas caminham com fones de ouvido. A facilidade de acesso à música, a transformou num vício e, ao mesmo tempo que a fortalece e a expande, a enfraquece por conta da pirataria. A música conseguiu se difundir com tanta rapidez e amplitude, que surgiram diversos grupos, de diversos ritmos, para diversos gostos. E o jovem, a cada dia que passa se torna um público mais fiel da música. Bandas tipicamente voltadas para os adolescentes ganham, atualmente, inúmeros prêmios musicais, se tornando tendência de moda e estilo, deixando claro que em relação a música, o jovem se demonstra ativo e contemplado.

O caso da internet se complica a partir do momento em que pensamos sobre a relação pessoal do jovem com o outro. Eles alegam que o que mais gostam de fazer nos tempos livres é ficar no computador; em seguida, com um número muito abaixo, eles optam por se relacionar com os amigos, dando a entender que possuem muito mais facilidade e se sentem muito mais confortáveis estando na internet, relacionando-se com as pessoas on line. Esses jovens se demonstraram individualizados desde a infância de forma a ter como suas principais práticas tarefas individualistas: ver televisão, ir ao cinema, ficar na internet... Os jogos, brincadeiras e conversas, logo em seguida se apresentam, mas em valores infinitamente menores. É como se as relações interpessoais estivessem se esvaecendo com o tempo, como se estivéssemos vivendo uma nova geração. No passado as crianças brincavam nas ruas, inventavam novas brincadeiras, havia a necessidade do outro. Hoje, as crianças já nascem no meio virtual, os jogos e as informações obtidas no computador são muito atraentes e em volume infinito. A necessidade de se relacionar permanece, mas a necessidade de estar efetivamente com o outro se perde gradativamente por conta das facilidades do meio tecnológico. Mauricio de Souza tenta colocar em uma mesma história o personagem do Cebolinha no presente e dialogando com o do futuro, graças à uma máquina do tempo. O Cebolinha atual se recorda de como eram as brincadeiras de criança no passado fazendo um contraponto com o presente:

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SOUSA, Uma aventura no Parque da Mônica, 2009, p.13.

Automaticamente, essa relação intensa dos jovens com a mídia reflete-se na sua relação com o teatro. A maioria dos alunos que responderam o porque de gostarem de teatro, indicaram o fato de ser ao vivo. É nesse ponto que o teatro ganha maior visibilidade; quanto mais as pessoas tendem a se distanciar do outro, mais tendem a ter necessidade de se aproximar e o teatro é uma arte peculiarmente viva, tem que haver troca entre palco e platéia: "O espectador da arte teatral é um espectador diferente dos outros tipos de arte por conta da sua efemeridade e por conta do contato palco e platéia. De todas as obras de arte o teatro talvez seja a que mais depende do público." (DESGRANGES, 2002, p.31).

Ao mesmo tempo, a tendência é que as pessoas se tornem mais sedentárias, preguiçosas, por conta da facilidade de acesso que a internet nos traz. Já não se precisa ir a bancos, nem comprar ingressos e passagens ao vivo. Não saímos mais para comprar cd"s e podemos freqüentar livrarias e museus do mundo inteiro virtualmente. Alguns grupos teatrais já possuem espetáculos ou cenas inteiros disponíveis no YouTube. Quando perguntamos sobre o nome da última peça que assistiram não sabemos mais exatamente aonde viram. Afinal, peças como Zenas Emprovisadas, Nós na fita, Comédia em Pé, diversas vezes citadas nessa pesquisa, estão disponíveis na rede. Não sabemos se eles saíram de casa para assistir ou se apenas viram algumas cenas e alegam que viram.

Essa idéia se torna mais gritante quando se observam os alunos que citam programas de TV ou filmes, em vez de nomes de peças: Quinta categoria, É tudo improviso e Hanna Montanna – o filme. Os dois primeiros são programas da MTV e da BAND, respectivamente, e se pautam em cima do improviso. Seriam jogos teatrais filmados; a platéia participa, e eles realizam jogos que envolvem a improvisação, as convenções teatrais são mantidas, mas ao mesmo tempo é televisionado. Difícil categorizar um programa como esses em teatro ou programa de TV. Mas fato é que os meios, principalmente os mais enfraquecidos, como o teatro, museu e literatura, tendem a se fundir à tecnologia para a própria sobrevivência.

A partir disso pode se concluir que o hábito de ir ao teatro tende a diminuir ou permanecer baixo conforme o passar do tempo. Apenas 17% da amostra indicaram aumento na freqüência. Sendo que é importante notar que essa freqüência é relativamente baixa tanto na infância quanto na adolescência. Naturalmente, por vontade própria, o jovem não tem o estímulo de ir ao teatro. É possível pensar que os jovens, por não terem poder aquisitivo, não teriam acesso ao teatro. No entanto, há teatro baratos e os estudantes pagam meia entrada. Porém, claramente, os jovens aqui relacionados assistem mais a peças divulgadas pela mídia, de grandes públicos, e com um elenco famoso, reconhecido, do que buscam por uma peça que confira com o seu ideal ou personalidade. Mais uma vez notamos como esses jovens estão vinculados fortemente à idéia televisiva.

Ainda nessa análise é importante ressaltar que muitos alunos indicaram que a última peça que assistiram foram projetos teatrais que foram às escolas e portanto, saindo desse meio que a televisão impõe. Assim é o exemplo de Viajando com as regiões. Ir até as escolas é um projeto de formação de público válido e considerado, mas não sabemos se as peças possuem qualidade artística o suficiente para manter os jovens como público ativo. Muitas vezes existe uma necessidade de pré-disposição para assistir a um espetáculo teatral e nem sempre é pensado por parte da escola, na escolha dos espetáculos e como ele se apresentaria diante do olhar dos jovens. A escola escolhe conforme o seu grau de importância. A seleção de uma peça para ir à escola é uma situação de extrema delicadeza:

Pesquisas demonstram que a maior parte das crianças, na França, especialmente as de baixa renda, travam o primeiro contato com o teatro na escola, o que torna relevante a atuação dessa instituição na mediação desse importante contato, especialmente sua responsabilidade acerca da qualidade dessa experiência, porque, quando o encontro com o teatro é encarado como um dever, uma obrigação escolar, essa aproximação pode tornar-se um momento profundamente desinteressante. (DESGRANGES, 2002, p.66-67)

O jovem contemporâneo quer ver peças de comédia, quer rir, mas em que medida eles conhecem outro lado? Em que medida eles conseguem compreender algo além da comédia? Algo diferente de comédia gera desconforto; porém, existem muitas peças, altamente críticas, que poderiam ser vistas por jovens, abortando uma plasticidade cênica, cenográfica e sonora, agradável para os olhos e corpo inteiro, envolvendo a participação direta dos espectadores, movimentando-os, saindo do espaço convencional. O teatro tem múltiplas possibilidades e, talvez, os jovens ainda não tenham tido contado com essas multiplicidades. A maior parte das peças que assistem, são em grandes casas de espetáculo, em palcos convencionais e atores metamorfoseados nos personagens. Longe do teatro proposto por Brecht na década de 1920 e longe do movimento teatral contemporâneo.

A maioria dos jovens diz que existe diferença entre o teatro que se destina a eles e aos adultos. Os jovens ainda estão muito presos aos temas, às classificações, às censuras, a complexidade. Só conhecem um teatro voltado tipicamente para eles. Um teatro com a linguagem juvenil, engraçado, sem temas que verdadeiramente lhe concernem. Fato que o jovem quer diversão, mas pode-se notar que os jovens não possuem uma visão ampla do que é teatro. Não experimentaram assistir peças diferenciadas para poder verdadeiramente concluir sobre o seu gosto. Eles conhecem sobre comédias e musicais, que é o que mais se sobressai no circuito teatral do Rio de Janeiro. Se por acaso eles estudam as diversas formas do fazer teatral em sala de aula, de alguma forma isso não está sendo reproduzido no seu dia-a-dia.

Há de se pensar também, que a quantidade de espetáculos voltados especificamente para esse público normalmente não ultrapassa os moldes convencionais de teatro. Alem disso, são escassos e dificilmente o jovem toma conhecimento. Há inúmeros espetáculos para todos os públicos, tanto que grande parte dos espetáculos citados era ou tipicamente adolescente ou, em sua maior parte, para todas as idades. O jovem está carente de um bom produto teatral voltado para eles. Está carente de um produto artístico instigante, que se coadune com o tempo deles, com a sua velocidade de pensamento, com a vida fragmentada que eles levam. É necessário aproximá-los do teatro; mas como? Se o teatro também se afasta deles!É necessário um estudo, assim como aconteceu com a figura da criança e o teatro. É necessário entender esse público, entender o que ele quer ver, artisticamente dizendo. Não apenas panfletariamente. Quer se ensinar com o teatro, sim, sempre, mas uma arte tão complexa não pode se afirmar apenas no seu cunho didático para se aproximar dos jovens. O teatro não pode ser visto, nesse caso, apenas como ferramenta e deve ser tratado como uma boa experiência. Certamente, os baixos valores de freqüência se relacionam inteiramente, não só com a televisão ou com a internet, mas também com a carência de produtos teatrais voltados para eles.

Torna-se necessário então, diante desses dados, pensar em que teatro o jovem contemporâneo gostaria de ver e estimular a produção teatral voltada para esse público de forma a preencher de fato o espaço vazio entre o teatro infantil e adulto ou equilibrando o termo " infanto-juvenil". Atribuindo igual valor, importância e estudo à essa classe tão carente e importante do público teatral brasileiro: o jovem.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ACIOLY, Karen. I catálogo livre do teatro. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2009.

BENEDETTI, Lucia. Aspectos do teatro infantil. Rio de Janeiro: SNT, 1969.

CAMPOS, Claudia Arruda. Maria Clara Machado.São Paulo: EDUSP, 1998.

DESGRANGES, Flávio. A Pedagogia do Espectador. São Paulo: Hucitec, 2003.

GOLDENBERG, Mirian. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em Ciências Sociais.Rio de Janeiro: Editora Record,1999.

HELIODORA, Bárbara. A grave responsabilidade do teatro infantil in Bárbara Heliodora- Escritos sobre Teatro.Org. Claudia Braga. São Paulo: Perspectiva, 2009.

KOUDELA, Ingrid Dormien. Jogos Teatrais. São Paulo: Pespectiva.2004

KUHNER,Maria Helena. Desafios Atuais. Disponivel em acesso em: outubro 2010

MACHADO, Maria Clara. Teatro infantil em Debate in Cadernos de teatro nº 59.Rio de Janeiro: O Tablado,1973.

O ESTADO DE SAO PAULO – CADERNO 2. Disponível em < http://www.cbtij.org.br/arquivo_aberto/somos_noticia/estado_dib_jul02.htm> acesso em: outubro de 2010

O GLOBO. Segundo Caderno: Rio Show. Rio de janeiro: 18 de junho de 2011

PREFEITURA DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO. Rio Mapa Cultural: Gonzaguinha. Rio de Janeiro, Maio de 2011, 48 p.

PUPO, Maria Lúcia de Souza Barros. No reino da desigualdade: teatro infantil em São Paulo nos anos setenta. São Paulo: Perspectiva,1991.

______. Fronteiras etárias no teatro: da demarcação à abertura, in KÜTNER, Maria Helena. O teatro dito infantil. Blumenau: Cultura em movimento, 2003.

SOUSA, Maurício. Uma aventura no parque da Mônica: De volta à infância. São Paulo: Panini, abril de 2009.

ANEXOS

ANEXO 1

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O GLOBO. Segundo Caderno, 23 de junho de 2011, p.8.

ANEXO 2

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RIO MAPA CULTURAL, Maio 2011, p.12,18.

ANEXO 3

QUESTIONÁRIO

1)ESCOLA/CURSO:________________________

2) IDADE: ________________________________

3) BAIRRO: ________________________________

4) SEXO:

MASCULINO

FEMININO

5) VOCÊ SE CONSIDERA:

CRIANCA

PRÉ-ADOLESCENTE

ADOLESCENTE

ADULTO

6) COMO VOCÊ PREENCHIA SUAS HORAS LIVRES NA INFANCIA?MARQUE QUANTAS ALTERNATIVAS FOREM NECESSÁRIAS.

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14)VOCÊ GOSTA/GOSTARIA DE ASSISTIR PEÇAS DE TEATRO?

SIM

NAO

SE SIM, POR QUÊ GOSTA? SE NAO, O QUE ACHA QUE O TEATRO PRECISARIA TER PARA SER MAIS INTERESSANTE?

_____________________________________________

15) QUE TIPO DE PEÇA (TEMAS, GÊNEROS, ETC.) VOCÊ GOSTARIA OU GOSTA DE ASSISTIR ?

_____________________________________________

16)VOCÊ LEMBRA DO NOME DA ULTIMA PEÇA DE TEATRO QUE ASSISTIU? SE SIM, QUAL FOI?

_____________________________________________

17)VOCÊ ACHA QUE EXISTE DIFERENÇA ENTRE TEATRO PARA JOVENS E TEATRO PARA ADULTOS? QUAIS?

_____________________________________________

18) O QUE VOCÊ MAIS GOSTA DE FAZER NOS TEMPOS LIVRES?

_____________________________________________

ANEXO 4- Gráficos de pizza

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ANEXO 5

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ANEXO 6

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Trabalho de Conclusão de curso apresentada à banca examinadora como um dos requisitos para obtenção do Grau de Licenciado em Teatro, realizado sob orientação do Professor Paulo Merisio.

Dedico esse trabalho à vovó Eny e ao vovô Arthur, in memorian, por terem me dado todo o aparato para traçar o caminho que estou trilhando. Dedico ao Thainã de Medeiros que, com muito amor, me trouxe paz, motivação e apontamentos para realizar esse trabalho. E também aos meus amigos da UNIRIO que sempre ressaltaram o meu potencial e tornaram os meus dias mais azuis.

Agradeço imensamente a ajuda dos professores Andreza Bittencourt, Bárbara Sinedino, Flávio Lanzarini, Vanessa, Ana Maria Araujo e a fonoaudióloga Eline Portela que colaboraram com a execução dessa monografia e à Elza de Andrade, Miguel Vellinho, Paulo Merisio, Gyata, Carmela Soares, Viviane Narvaes e todos os professores da UNIRIO que ampliaram o meu olhar sobre educação teatral. Agradeço especialmente à Liliane Mundim por toda a credibilidade que sempre me deu.

 

 

Autor:

Alessandra Barbosa Da Nóbrega Biá

alessandra.bnb[arroba]gmail.com

UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO- UNIRIO

CENTRO DE LETRAS E ARTES

ESCOLA DE TEATRO

CURSO DE GRADUAÇAO EM TEATRO

MODALIDADE: LICENCIATURA

Rio de Janeiro

2011


[1] Ficha técnica Mãe eu vou ser mãe:Texto e direção: Francis Ivanovich, Elenco: Stephane Rodrigues do Amaral, Flavia Saboya,Raphaela Tafuri.Iluminação: Márcia Rosa.Musica: Francis Ivanovich e Chopin. Assistente de produção: Adriana Zattar. Produção: Ensinoemcena.

[2] Há de se apontar aqui que a grande maioria dos jovens analisados freqüenta aulas de teatro e possui um olhar minimamente trabalhado, entendido do que é a prática teatral, sendo, portanto, espectadores; por mais que não intimamente formados.

[3] Ver os dados quantitativos que subsidiaram este estudo no capítulo 4.

[4] Os gráficos de pizza se encontram no Anexo 4.



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