A ayahuasca como terapêutica para o uso de drogas



  1. Resumo
  2. Introdução
  3. A problemática da pesquisa: ayahuasca e xamanismo
  4. Hipóteses, objetivo e procedimentos da pesquisa
  5. Referência empírica: definições, descrição e via de acesso às fontes
  6. Descrição dos centros
  7. Resumo dos resultados
  8. Conclusão
  9. Referências bibliográficas

(o imaginário do uso e da cura)

RESUMO

Consideramos o uso da ayahuasca em perspectiva cultural, analisando o "imaginário" relativo à motivações, atitudes, experiências e expectativas relacionadas ao consumo, Indagando como, e se o modelo de consumo ritual de ayahuasca, funciona como re-estruturador em relação a desestruturação provocada pelo uso de drogas. A referência empírica abrange centros da União do Vegetal, do Santo Daime e clandestinos.

Palavras-chave: imaginário, psicoativo, ayahuasca, Santo Daime, União do Vegetal, clandestinos, Antropologia Médica, Xamanismo.


INTRODUÇÃO

O chamado "consumo de drogas" vem sendo destacado ao lado de outros problemas, (a exemplo do desemprego), como um dos males de nossa época. A nível internacional o "combate às drogas" assume "status" de "questão de Estado" na "guerra ao narcotráfico"; e na esfera dos governos nacionais os procedimentos de abordagem vão da repressão policial armada à guerra civil. No âmbito do consumo, ultrapassa a marginalidade social e afeta lares "bem estabelecidos" e escolas públicas e particulares.

Rondônia é identificada como "corredor de exportação" do narcotráfico por ser localizada em área de fronteira com um dos países produtores de matéria-prima, a Bolívia e suas seculares plantações de coca. Além da cocaína refinada com diferentes graus de pureza, circula na cidade de Porto Velho, capital do estado, a pasta - base (anterior ao refino) de cocaína, conhecida como "mela" ou "mescla", produto de baixo custo, cujo consumo é largamente difundido não só por sua acessibilidade econômica, mas também pela facilidade de seu consumo, que não requer necessariamente, "esconderijos", uma vez que pode ser adicionada ao cigarro comum sem provocar alteração no odor característico ao tabaco.

Paralelo a esse consumo de psicoativos ilegais e profanos, cresce o uso de outro psicoativo, à ayahuasca, considerada sagrada e ingerida no contexto de rituais religiosos, sendo ainda utilizada como recurso terapêutico para o consumo de substâncias psicoativas profanas: álcool, tabaco e cocaína. A pesquisa visou compreender o consumo de psicoativos nos dois registros: o sagrado e o profano, buscando perceber em ambos, as estruturas e a dinâmica do imaginário do uso e da cura.


1. A PROBLEMÁTICA DA PESQUISA: Ayahuasca e xamanismo

A ingestão ritual de "ayahuasca" por parcelas da população urbana inicia-se no Brasil, na década de 30, em Rio Branco, Acre, com o culto ao Santo Daime, sistematizado por Raimundo Irineu Serra, que atribuiü à ayahuasca a denominação "Santo Daime e fundou o Centro de Iluminação Cristã Luz Universal - CICLU Alto Santo. No final da década de 60, em Porto Velho, Rondônia, Gabriel da Costa organizou outro grupo ayahuasquero, denominando-o "União do Vegetal", visto que nele a ayahuasca é chamada de vegetal. O processo de divergências e de desdobramentos dos núcleos originais propiciaram a expansão das religiões ayahuasqueras por grande parte do território nacional e mesmo pelo exterior.

Entre as características das religiões ayahuasqueras, duas ganharam amplo destaque na mídia: o fato de organizar-se em torno de substância psicoativa e de originar-se na floresta amazônica. A divulgação cresceu à medida em que jovens urbanos, oriundos do Sul e do Sudeste do país aderiram a uma das vertentes do Santo Daime, à "linha" do "padrinho" Sebastião Mota, dissidência do CICLU Alto Santo. A partir desse contato, o culto, no âmbito da vertente referida, atraiu acadêmicos, jornalistas, artistas, estudantes e diferentes categorias de profissionais liberais empenhados em torná-lo objeto de estudo, notícia ou modo de vida. Algumas conseqüências decorreram dessa aliança, entre elas a adoção pela "linha" de Sebastião, de muitos dos costumes e crenças dos jovens urbanos, a exemplo do controvertido uso ritual da "Cannabis sativa" e da inclusão da religião na "questão ecológica". Desse modo, essa vertente, além de sua base daimista, foi acrescida por elementos da "cultura alternativa".

A projeção social desse grupo faz com que ele seja tomado como parâmetro para a compreensão da religião daimista. Assim, os estudos realizados sobre a mesma têm como enfoque principal a "linha" de Mota, embora todos os trabalhos, em maior ou menor grau, busquem analisar a origem da religião, referindo-se, então, ao Alto Santo, área na qual Irineu consolidou o culto.

Nossa pesquisa de doutorado (Cemin, 1998) alterou a base empírica na qual vinham se dando os estudos, visto que enfocamos o grupo organizado por Irineu, CICLU I Alto Santo, e o CECLU, instituído em Porto Velho, como filial do CICLU I. Estes dois grupos não admitem incorporação, praticando estritamente o xamanismo de "excorporação" (Baldus: 1959) ou xamanismo em sentido estrito, de acordo com Eliade (1960), e não aderem e nem mesmo toleram o uso de outros psicoativos que não a ayahuasca.

A procura de orientação no plano divino através da indução de Estados Alterados de Consciência (JAMES,1961), é a principal característica das práticas xamânicas, por isso identificadas por Eliade (1960) como técnica do êxtase. Esse fenômeno parece ser amplo e profundamente enraizado no horizonte cultural da humanidade, permitindo que o xamanismo seja considerado como disposição especial do ser humano (Gallois, 1996). A forma específica que "técnicas do êxtase" assumem nos rituais xamânicos, inclui a posse de poder por parte do xamã, capaz de situá-lo num tipo de estado que Michael Harner (1989) chamou de "estado xamânico de consciência", induzido por habilidades sob o controle do xamã, que o colocam em contato com realidades ocultas, de onde retira conhecimento e poder para curar ou ferir, adquirir poder pessoal e bem-estar individual e coletivo.


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