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Gestão da Qualidade nos Serviços Públicos (página 2)

José A. Bonilla

Assim, a idéia de que, por meio da Qualidade Total, as organizações sejam capazes de assegurar sua sobrevivência e construir sua prosperidade é o edifício visível de uma concepção mais elevada: iniciar o resgate do homem através de um modo de viver assentado na coerência, na transparência e na cooperação como caminho para atingir o cume das aspirações humanas que é auto-realização. Isso, é verdade, representa a visão antipódica da sociedade humana como ela hoje se apresenta: atolada no egoísmo, no fisiologismo, na gananciosidade e na exploração.

Os dados e as pesquisas nos dizem, entretanto, que o mundo está mudando. Os fatos existem e são irretorquíveis: o segundo país do mundo sumiu de repente, a opinião pública é cada vez mais atuante e poderosa, as negociatas começam a aparecer à luz do dia. As pesquisas, especialmente na área neurobiológica, informam-nos que estão ocorrendo mudanças drásticas na atividade de nossos hemisférios cerebrais.

Com efeito, a predomináncia do hemisfério esquerdo (frio, analítico, linear, cartesiano), necessária para que o homem pudesse desenvolver seu atual patamar científico e tecnológico, está começando a ser equilibrada pelo desenvolvimento do hemisfério direito (integrador, intuitivo, ecossistêmico). Isso leva a uma aceleração rápida da conscientização do ser humano, que se está processando atualmente e que é o alicerce básico das mudanças que estão acontecendo no mundo todo.

Cabe acrescentar que a predomináncia do hemisfério esquerdo, por ter natureza linear, leva a ter medo ou, pelo menos, desconfiança das mudanças. Já o direito, integrador, compreende a essência das mudanças e, por isso, não só não as teme, como também as considera imprescindíveis. Isso parece, talvez, um pequeno detalhe teórico, mas será a fonte de energia que dará força e poder de expansão aos novos conceitos da Qualidade Total.

A abordagem holística nos ensina que o Universo está equilibrado por dois grandes princípios que se manifestam em todos o níveis e dimensões. São eles o princípio auto-afirmativo, que busca a sobrevivência das partes, e o princípio integrativo, que assegura a sobrevivência do todo. (Os chineses já sabiam disto há vários milhares de anos antes que a moderna Física sub-atômica fornecesse base científica para estes conceitos; eles chamam esses princípios de Yang e Yin).

Assim sendo, o princípio auto-afirmativo, cria do hemisfério esquerdo, conduz ao modo de vida que hoje nos asfixia. Já o princípio integrativo, que está começando a desenvolver um novo ciclo, conduz à solidariedade humana, à relação prazerosa com o trabalho, à paz com os outros e consigo mesmo. é esta trilha que a comunidade humana está começando a percorrer lentamente, ancorada na Qualidade Total considerada holisticamente: como metodologia de sobrevivência (princípio auto-afirmativo) e como modo de viver (princípio integrativo). Ambos os princípios são opostos, mas complementares; precisamos trabalhar com eles simultaneamente. Isso também foi demonstrado cientificamente através do princípio da complementaridade elaborado por Niels Böhr por volta de 1920, o que lhe valeu o Prêmio Nobel de Física. Sem querer entrar em polêmicas filosóficas ou religiosas é bom lembrar que o princípio integrativo foi apresentado ao mundo há quase 2000 anos, apenas que com um nome diferente: amor.

As informações anteriores foram necessárias para colocar corretamente os objetivos deste texto. Ele está direcionado fundamentalmente para o enfoque técnico, só que este não está solto e sim amarrado à filosofia básica que acabamos de comentar. O autor já publicou em 1993 outro texto que aborda esta filosofia, intitulado: Resposta à crise: Qualidade Total Autêntica em Bens e Serviços (Editora Makron Books), onde se faz uma análise crítica das organizações humanas, propondo uma mudança do atual esquema de empresa-ilha ou empresa-fortaleza para o de empresa-como-componente-do-ecossistema-social.

Ou seja, apesar de que a Qualidade Total precisa ser inserida num contexto mais profundo, o presente texto, por motivos estratégicos, privilegia os aspectos técnicos e metodológicos. Isso se deve a uma situação real, concreta: conquanto exista um número muito grande de livros relativos à aplicação da Qualidade Total nas indústrias, há uns poucos na área de serviços. Por isto sentimos a necessidade de escrever um livro específico para Serviços Públicos, que embora privilegiando os aspectos operacionais, estivesse sempre apoiado em sólidos alicerces básicos. é por este motivo que, apesar de certos vôos, este livro é prioritariamente pé no chão, mostrando como a Qualidade Total pode ser aplicada numa área vital para a sociedade humana, como é o caso da educação.

Com efeito, material bibliográfico excelente tem sido produzido pela Fundação Christiano Ottoni, notadamente os livros do Prof. Falconi Campos (citados na bibliografia), cuja leitura foi básica para nossa própria formação. O próprio autor já elaborou um livro pioneiro numa área específica ("Qualidade Total na Agricultura: Fundamentos e Aplicações". 1994), cuja estrutura conceitual serviu de arcabouço para o presente texto. Mas a maior limitação constituiu-se na falta de exemplos e exercícios ligados a área de serviço público, pelo que fomos obrigados a improvisar textos adicionais.

Essa situação levou-nos rapidamente a compreender que era urgente e imprescindível elaborar um livro-texto que pudesse ser usado como material básico para cursos de Qualidade Total no Serviço Público. Isto nos levou a uma opção que, no início, foi difícil, mas depois fluiu como a realmente correta. Com efeito, a idéia do livro poderia ser encarada de duas maneiras; uma forma seria fazer um texto muito bem trabalhado, amplamente discutido, tanto com especialistas em Qualidade Total como com especialistas na área da administração pública e revisado com grande detalhe; isso levaria de dois a três anos. A outra maneira, seria elaborar o material rapidamente, corrigindo suas eventuais falhas e incorporando novos desenvolvimentos numa próxima edição. Atendendo às exigências do momento, escolhemos a segunda alternativa.

Portanto, deve ser entendido que esta é uma versão absolutamente preliminar no tocante à Qualidade Total no Serviço Público. Sugestões, críticas construtivas, adendas, exercícios e exemplos são contribuições que o autor deseja vivamente por parte dos leitores.

O texto está dividido em seis partes, a saber:

Parte I : Conceitos básicos.

Parte II : Itens de controle e itens de verificação.

Parte III : Padronização.

Parte IV : Avaliação de processos.

Parte V : Metodologia de solução de problemas.

Parte VI : Implantação da Qualidade Total.

PARTE I

CONCEITOS

BÁSICOS

CAPÍTULO 1

O QUE é QUALIDADE TOTAL?

1.1 CONCEITOS INTRODUTÓRIOS

Gestão da Qualidade Total (GQT), ou Total Quality Control (TQC), corresponde a um modelo gerencial aperfeiçoado no Japão, onde sobressai a figura de Ishikawa (1968), a partir de idéias norte-americanas, especialmente devidas a Deming e Juran, introduzidas durante a ocupação aliada naquele país depois de 1945. A sigla TQC é usada internamente no Japão, mas eles no contato com países estrangeiros preferem outra: CWQC (Company Wide Quality Control), ou seja Controle de Qualidade por toda a Empresa, para diferenciá-la de outro sistema, também chamado TQC, proposta por Feigenbaum (1983), nos EUA.

O TQC(*) está baseado em diferentes fontes, que abrangem duas linhas básicas: uma de natureza técnica, que nasce com Taylor, se desenvolve com os métodos de controle estatístico de Shewhart (1931) e se consolida com todo o conhecimento científico dos últimos 40 anos, através do trabalho dos grandes mestres: Feigenbaum (1983), Deming (1990) e Juran (1980) e outra, de natureza humana, apoiada nas pesquisas sobre comportamento desenvolvidas por Mac Gregor (1960), Herzeberg (1966) e Maslow (1970) e, mais recentemente, na abordagem holística representada, entre outros, por Capra (1982) e Ferguson (1980). A montagem básica do TQC foi feita pela JUSE (Japanese Union of Scientists and Engineers). O autor (Bonilla, 1993) introduziu o conceito de Qualidade Total Autêntica.

Um aspecto fundamental da GQT é o conceito de rompimento, que implica uma mudança de forma de pensar, de estilo e de postura, envolvendo todos os integrantes da organização, desde o principal executivo até o mais modesto funcionário. Em particular, a figura do principal da organização (Ministro, Secretário de Estado, Prefeito, Diretor Geral, etc) assume dimensões decisivas, pois é ele, de forma intransferível, quem tem em suas mãos o detonador do sucesso ou do insucesso. Com efeito, GQT é um programa dele; portanto, ou ele rompe com o modo de pensar, sentir e agir antigo, através da assunção e comprometimento pessoal com a implantação do programa, transformando-se, assim, num dinámico agente de mudanças, ou o abandona a suas próprias forças, inviabilizando-o.

O conceito de Qualidade Total é amplo e dinámico. Em princípio, ele está ligado à satisfação total do cliente, procurada tanto de forma interna (eliminando os fatores que não agradam ao mesmo, segundo pesquisas de mercado feitas), como externas (através da antecipação das necessidades do cliente, incorporando-se as características detectadas nos produtos e serviços). No caso do Serviço Público o principal cliente são os usuários dos serviços, envolvendo tanto organizações públicas ou privadas como grupos familiares e pessoas individuais.

Reconhece-se que a Qualidade Total está composta por cinco dimensões (Ver Fig 1).

FIGURA 1 - AS CINCO DIMENSÕES DA QUALIDADE TOTAL

a) Qualidade intrínseca do produto (ou serviço) - Em sentido amplo, refere-se especificamente às características inerentes ao produto (ou serviço) e daí o nome de intrínsecas, capazes de fornecer satisfação ao cliente. Isto implica uma série de aspectos tais como: ausência de defeitos, adequação ao uso, características agradáveis ao cliente, confiabilidade, previsibilidade, etc. No caso do serviço público, esta dimensão da qualidade pode ser refletida através de indicadores tais como índices de erros nas faturas, de infecção hospitalar, de repetência escolar, de quebra no fornecimento de água ou força, de produtividade de funcionários, etc.

b) Custo do produto ou serviço - Naturalmente que, quanto menor o preço do produto ou serviço, maior será a satisfação do consumidor. Mas isso não implica numa relação linear perfeita. Acontece que um elemento fundamental é o conceito de valor, ou seja, o que o consumidor estaria disposto a pagar pelo produto (ou serviço). Portanto, seu preço deverá levar em conta o valor que o produto ou serviço tem para o usuário. O ideal é que o preço seja igual ou algo menor ao valor estabelecido. Exemplos de custo são: custo de elaboração de um levantamento, custo de treinamento para funcionários, custo de serviços básicos como luz ou telefones, etc..

c) Entrega ou Atendimento - O cliente deve receber o produto ou serviço no prazo certo, no local certo e na quantidade certa. Alguns indicadores poderiam ser atraso na entrega de correspondência, atraso na movimentação de documentos, atraso na entrega de material xerocado, demora de atendimento, etc.

d) Segurança - é fundamental que o produto ou serviço não ameace a saúde mental ou física do usuário.

e) Moral - Refere-se à disposição e motivação que os funcionários da organização manifestam. Para que isto aconteça, a empresa deve se esforçar para pagar-lhes um salário digno, respeitando-os como seres humanos e dando-lhes a oportunidade de crescer como pessoas e no trabalho, vivendo uma vida feliz (Campos, 1992). Uma das formas de avaliar o moral é através do nível de absenteísmo.

A Qualidade Total implica explorar as profundezas, as raízes, as bases, onde a qualidade é elaborada. Muitos pensam que o grande peso da responsabilidade na obtenção da Qualidade depende - quase exclusivamente - da área fim. Não é verdade, GQT refere-se à qualidade em toda a organização. O que ocorre é que a área operacional é o ponto terminal visível da qualidade. Isto é um modo de dizer porque a qualidade, na realidade, é um processo circular e, portanto, sem começo nem fim. Com efeito, nela se acumulam: insumos defeituosos, mão-de-obra não treinada, projetos inadequados, imperfeitos ou incompletos, falta de comunicação com usuário, etc. Nesse sentido, a GQT amplia o conceito clássico de controle de qualidade (conformidade com as especificações, por exemplo: um parafuso deve ter um diámetro entre 9,5 e 10,5 milímetros), desenvolvendo uma idéia básica e fundamental: a do cliente interno, isto é, cada empregado é cliente do processo anterior. Desse modo, dimensões da qualidade são revertidas também para dentro da organização. Exemplos simplificados disso no serviço público seriam: o setor administrativo tem como cliente interno o setor técnico, a área de xerox tem como cliente interno praticamente a toda a empresa, a tesouraria é cliente interna do Diretor Geral, etc.

Essa percepção integrada - verdadeiramente holística - leva então a uma cadeia de relações que deve ser entendida e atendida. Assim, o setor de planejamento deve formular projetos, que possam ser executados em tempo hábil pelo setor operacional; o setor de compras terá que se preocupar muito com os insumos, de forma que eles tenham qualidade intrínseca adequada e prazos de entrega apropriados, fora de cuidar o vital aspecto dos custos. Do mesmo modo, as áreas administrativas, deverão se organizar coordenadamente para que o setor técnico com auxílio do operacional possam cumprir suas funções de forma inteiramente satisfatória por exemplo utilização de máquinas numa Prefeitura, distribuição de correspondência pelo Correio, atendimento da Saúde num hospital, impressão de material gráfico na Imprensa Oficial.

1.2. POR QUE IMPLANTAR A QUALIDADE TOTAL EM GERAL?

Há três tipos de motivos:

a) MOTIVOS PASSADOS - Eles podem se resumir em um: as organizações estão perdendo muitíssimo dinheiro já há muito tempo e perderão mais cada ano que passa, até fecharem suas portas, se não mudarem sua ótica a tempo. Esta perda está representada, basicamente, pelo custo da má qualidade. Voltaremos daqui a pouco a este conceito. é importante salientar que estas perdas ocorrem em todas as áreas do serviço público, nas quais o intenso grau de ineficiência acaba esbanjando os poucos recursos disponíveis, oferecendo um serviço de baixa qualidade à comunidade, remunerando pessimamente os funcionários administrativos e técnicos e desagradando a todos.

b) MOTIVOS ATUAIS - A pressão social está aumentando sobre as organizações. Os sintomas são: a) lei de defesa do consumidor; b) redução das tarifas alfandegárias; c) leis de proteção ambiental; d) projetos de leis de distribuição de lucros; e) exigências de padrões internacionais; f) adoção de Qualidade Total em organizações concorrentes - nacionais e internacionais - fazendo-as mais competitivas, etc. No caso particular do serviço público, a privatização e a terceirização já tem feito bastante estragos, reclamando-se das sobreviventes eficácia e eficiência.

c) MOTIVOS FUTUROS - Eles são também de variada natureza, tais como: a) desenvolvimento acelerado de mercados comuns, nos quais as organizações que não se adaptarem às novas modalidades de mercado não terão vez; b) aplicação acelerada da filosofia e das técnicas da Qualidade Total nas organizações concorrentes, reduzindo seus custos de forma drástica e tornando-as cada vez mais e mais competitivas; c) aumento acelerado da conscientização do ser humano, devido ao rápido desenvolvimento de seu hemisfério cerebral direito, sendo que até agora apenas usamos o esquerdo. Este item em particular influirá drasticamente no serviço público já que as pessoas não querem mais continuar como "súbditos" e sim como cidadãos, cientes de seus deveres e seus direitos.

Vamos voltar agora aos custos de má qualidade. Eles são da mais variada natureza. Na verdade, toda organização deveria fazer uma auditoria para saber quanto é que ela perde por continuar seu modo rotineiro de administrar. Só para se ter uma idéia, segundo pesquisas realizadas, estas perdas alcançam de 20% a 40% do orçamento, quando os custos necessários da qualidade não deveriam passar de 3% ou até, excepcionalmente, 5% daquele. Isto representa a fantástica soma de mais de 100 bilhões de dólares anuais no Brasil na área privada. Entretanto, faltam pesquisas para medir o esbanjamento no setor público.

Outro problema de fundamental importáncia é o dos números tangíveis e dos números intangíveis. Os primeiros são bem conhecidos por todo administrador e os outros são ignorados, porque fazem parte do futuro, mas eles são construídos com nossa ação presente. Um destes números intangíveis tem relação com o que acontece quando um cliente está satisfeito com o nosso produto ou serviço (para obter essa satisfação, devem estar envolvidos todos os setores da organização, agindo com elevados padrões de qualidade, de modo que por isso se fala em Qualidade Total).

Outro número intangível está relacionado ao que acontece quando o cliente está insatisfeito com nosso produto ou serviço (e esta insatisfação não pode atribuir-se, mais uma vez, a uma exclusiva incapacidade do setor operacional de fabricar um produto bom ou entregar um serviço satisfatório; o que está em jogo é a capacidade do Executivo principal e da Diretoria toda, para fazer da organização um empreendimento viável). Da dinámica desses números intangíveis dependerá não só a prosperidade de cada organização e sim a sua própria sobrevivência, incluindo aqui o serviço público. No caso de organizações de ensino por exemplo, se a maioria delas estiverem fornecendo um ensino de baixa qualidade (que é um número intangível, mas perfeitamente interpretado pelos clientes) a tendência será a mudança para outra organização de maior nível, o que pode provocar um colapso do ensino público, se os pais tentarem enviar seus filhos só para as escolas mais reconhecidas. ...

1.3. COMO IMPLANTAR A QUALIDADE TOTAL?

Não há um esquema único, dogmático e imodificável para implementar a Qualidade Total. Cada consultor tem seu próprio esquema, mas existem, sem dúvida, alguns pontos essenciais que não podem ser omitidos. Eles são apresentados em uma concentrada relação de nove assuntos, a saber:

a) O Executivo principal deve assumir publicamente a implantação da Qualidade Total na organização, dirigindo-a como um processo gradual, mas definitivo, parecido com uma bola de neve que tem dificuldades de atingir sua massa crítica durante o período inicial, mas que, depois, uma vez alcançada esta, se transforma num processo irreversível. (Para formar esta massa crítica precisa-se provavelmente de uns três anos).

b) Definição das diretrizes básicas, sustentadas na abordagem ecossistêmica (ou holística).

c) Criação de Comitê de Qualidade Total, com sua Secretaria Executiva, responsável pela implantação e desenvolvimento da nova tecnologia gerencial.

d) Desenvolvimento de um Programa de Educação e Treinamento, gradual, mas que inclua todos os integrantes da empresas, desde o Principal executivo até o último funcionário, com ênfase no crescimento do ser humano.

e) Deslanchar a instalação de um subsistema de Rotinas, começando pelo processo de identificação de problemas a todos os níveis da organização, com um duplo objetivo: poder descobrir onde concentrar os esforços de aperfeiçoamento; e levar à empresa todo um processo de auto-análise cooperativo, como germe para criação de um futuro pensamento (e ação) comum.

f) Deslanchar o processo de solução de problemas, mediante metodologias específicas que serão ensinadas a todos os membros da empresa, e que os capacitarão - cada um em seu nível - a encontrar as soluções adequadas para que a Qualidade Total se transforme numa autêntica realidade.

g) Instalação do Subsistema de Melhorias, através do qual os padrões estabelecidos pela Rotina são melhorados continuamente, numa demonstração de aplicabilidade plena dos princípios de Qualidade Total. é neste ponto que a organização amadurece para essa nova abordagem e onde os retornos dos primeiros tempos de esforço e dedicação começam a oferecer os magníficos frutos da produtividade, competitividade e lucratividade.

h) Promoção do Crescimento do Ser Humano, incluindo a instalação de círculos de controle de qualidade.

i) Implantação de auditorias de qualidade, necessárias para monitorar o andamento do processo.

Uma descrição detalhada acerca da implantação da Qualidade Total numa organização específica é apresentada nos Capítulos 14 e 15.

1.4. POR QUE IMPLANTAR A QUALIDADE TOTAL NO SERVIÇO PÚBLICO?

As empresas privadas estão submetidas a quase todos os fatores mencionados no item 1.2. Já que as públicas têm uma pressão um pouco menor, devido a não estarem enfrentadas a processos de concorrência com seus pares.(*)

Para que os recursos recebidos (sempre escassos) não sejam desperdiçados é necessário um trabalho eficiente, eficaz e efetivo. Para conseguir esses resultados, as técnicas da GQT podem fornecer uma contribuição decisiva através do instrumental oferecido neste texto (itens de controle, avaliação de processos, padronização, metodologia de solução de problemas etc) assim como a moldura conceitual também exposta no mesmo. Como se usa cada milhão de reais repassado pelo Ministério ou Secretaria da Educação ou da Saúde? Como evitar o esbanjamento nessas áreas tão carentes? Como usar proveitosamente numa Prefeitura os recursos oriundos dos impostos pagos pela população? Como usar os recursos da Imprensa Oficial para fazer um trabalho eficiente e eficaz para a comunidade? Ou seja existe uma grande responsabilidade social pairando sobre as entidades públicas em geral. Parece-nos que este é o momento de iniciar o resgate de uma problemática vital para nossa sociedade.

As deficiências na estrutura administrativa podem ser da mais variada natureza, entre elas:

a)   Desperdício de materiais por falta de armazenagem e distribuição adequada.

b)   Falta de padronização das tarefas repetitivas.

c)   Falta de metodologia para identificar os verdadeiros problemas e mais ainda: desconhecimento de como atacá-los.

d)   Falta de clareza no tocante a metas, objetivos, estratégias e controle dos resultados obtidos.

e)   Falta de clareza, e muitas vezes desinteresse, em relação com as necessidades dos usuários e como atendê-las.

f)    Desaproveitamento de grande parte do potencial de trabalho dos funcionários.

g)   Falta de seleção adequada de fornecedores.

h)   Falta de seleção adequada de funcionários.

i)    Falta de gerenciamento eficiente.

O conjunto destas carências acaba se manifestando na forma de incompetência gerencial que leva a altos custos, desmotivação, falta de cumprimento das responsabilidades da organização, imagem pobre frente à opinião pública etc.

é fato que as dificuldades e déficits orçamentários levam as instituições públicas de todos os níveis (federais, estaduais e municipais) a cortarem, eliminarem ou adiarem programas necessários. Será que isto é uma conseqüência fatal da atual situação econômica? Não necessariamente, pois há alternativas e a principal é: melhorar o modo de fazer o trabalho e isto através da Gestão da Qualidade Total. As organizações públicas que estão fazendo isto com seriedade estão tendo estes resultados:

-     Economia de milhões de reais.

-     Conquista do reconhecimento do público, admirado com a qualidade dos serviços.

-     Acréscimo de novos serviços necessários e já exigidos pelo público.

Já em 1989 o Presidente Bush pai proclamava: "Para reafirmarmos nossa posição de liderança será necessário um firme compromisso com a Gestão da Qualidade Total e o princípio de melhoria continua". O fato é que o serviço público americano tem melhorado muito nos últimos anos.

O custo da má qualidade é estimado nos Estados Unidos em 20-40% do preço de vendas, já na área pública esse custo é maior de 30% do orçamento, podendo ser abatido a 10% (ou menos). O caminho para obter estes resultados com a Gestão da Qualidade está na aplicação de sua metodologia básica descrita com bastante detalhe neste texto. O cerne da mesma é procurar identificar e eliminar (ou pelo menos reduzir substancialmente) as causas básicas dos problemas que geram esses imensos desperdícios. Removidas as causas, os sintomas desaparecem. Quando apenas se atacam os sintomas, eles se tornam cada vez mais problemáticos.

Carr e Littman (1990) mencionam muitas destas causas básicas:

-     Erros, retrabalhos, defeitos, excedentes, refugos.

-     Necessidade de horas extras, revisões, trocas de pedidos.

-     Cidadãos não atendidos.

-     Custos de entrega lenta.

-     Tempo ocioso.

-     Relatórios desnecessários.

-     Retreinamento.

-     Cobranças tardias.

-     Absenteísmo.

-     Falhas nos equipamentos.

-     Batalhas de territórios.

-     Estoque em excesso.

-     Rotatividade desnecessária.

O Coordenador de GQT do Centro de Pesquisa Lewis da NASA diz: "nós nos demos conta (e isto agora faz parte de nossa cultura) de que não somos muito diferentes de uma empresa privada, cujos negócios podem tomar outro rumo. Dessa maneira, somos vulneráveis ao fechamento. Temos de fazer bem nosso trabalho, para que sejamos a melhor escolha possível para os novos usuários".

E na onda de privatização, "downsizing" e globalização que hoje varre o planeta, o serviço público necessita - em forma imprescindível - se modernizar para sobreviver honrosamente. A áncora é a Gestão da Qualidade Total.

1.5. ALGUNS CONCEITOS ESSENCIAIS EM QUALIDADE TOTAL

1.5.1. Aspectos introdutórios

Nas últimas décadas a sociedade humana tem sofrido numerosas mudanças, envolvendo áreas econômicas, tecnológicas, políticas, culturais etc que levaram a uma transformação radical da sociedade humana. Algumas das mudanças mais significativas são as seguintes:

a) De uma demanda superior à oferta de produtos e serviços, passou-se hoje ao extremo oposto: há, via de regra, uma oferta superior à demanda real (não à demanda reprimida). Portanto, a competitividade passa a ser um fator fundamental.

b) De uma concorrência escassa (pela oferta reduzida e por limitações oriundas do protecionismo comercial) se passou à globalização da economia.

c) De poucas opções (às vezes só uma) para um determinado produto ou serviço, passou-se a grande número de opções.

d) De informação restrita, controlada apenas por uns poucos, passou-se, pelo menos potencialmente, a um nível de informação quase ilimitado.

e) O preço dos produtos e serviços era formado somando os custos aos lucros; portanto não existia nenhum interesse em reduzir aqueles, já que quanto maior fosse o custo melhor, pois o lucro (estimado como uma percentagem daquele custo) seria mas alto. Hoje a situação mudou radicalmente, sendo o preço fixado pelo mercado, de modo que a equação: Preço = Custo + Lucro, passou para Custo = Preço - Lucro. Deste modo, a redução de custos passa a ser uma ferramenta fundamental para o sucesso de qualquer organização.

No serviço público propriamente dito, não predomina a variável lucros, mas deve existir um equilíbrio entre recursos investidos e benefícios recebidos pela comunidade. As organizações públicas que fiquem afastadas deste equilíbrio terão tendência a desaparecer, como já vimos, engolidas pela onda privatizante e pelo seu obsoletismo social.

A resposta global a estas mudanças, as quais - por outra parte - são geradas a alta velocidade e que implicam, sobretudo, em usuários mais exigentes é fornecida pela Gestão da Qualidade Total, sendo que alguns de seus conceitos essenciais precisam ser apresentados em forma cuidadosa, antes de passar para assuntos mais específicos. Estes conceitos são: Controle, Processos, Produtos, Clientes.

1.5.2. Controle

A palavra controle tem vários sentidos, mas geralmente eles estão centrados na idéia de dominar, inspecionar ou supervisionar e ainda são, geralmente, acompanhados de uma visão coercitiva. Na GQT, porém, controlar significa simplesmente gerenciar ou administrar.

De acordo com V. F. Campos (1990), o controle de uma empresa em termos de Qualidade Total implica execução de duas ações fundamentais: Rotina e Melhorias, lembrando que quando essas palavras são iniciadas com maiúsculas elas deixam de ter o significado genérico com o qual estão normalmente relacionadas e passam a representar ações administrativas específicas.

No Capítulo 2 faremos uma abordagem mais detalhada acerca do significado das palavras Rotina e Melhorias, mas antes é necessário apresentar alguns esclarecimentos básicos.

Rotina implica na conservação do modo atual de fazer as coisas, depois que estas passaram por um processo de padronização. Isto significa que não é qualquer modo atual que será uma Rotina. Com efeito, ela implica um processo estável; portanto, se ele for de natureza instável, será necessário primeiramente colocá-lo sob controle (estatístico) e só a partir daí é que a Rotina poderá ser instalada.

Em resumo, manter a Rotina é uma salvaguarda contra mudanças negativas em qualidade intrínseca, custo, entrega ou atendimento e segurança, assim como de motivação dos funcionários, que no caso de acontecerem poderá trazer sérios problemas para a organização. Desse modo, as principais vantagens que surgem da rotinização dos processos são que estes se tornam estáveis e previsíveis (Estes conceitos serão estudados detalhadamente na Parte IV deste texto: Avaliação de Processos). Mas isto sendo necessário, não é suficiente, pois vivemos num mundo muito dinámico: tanto pode acontecer que um concorrente desenvolva um processo mais adequado (melhor), como que o próprio cliente se torne mais exigente, ou ambas coisas simultaneamente.

Nesses casos, a Rotina se apresenta como insuficiente. Assim, um novo patamar deve ser definido. Esse novo patamar recebe o nome de Melhorias, as quais envolvem níveis de desempenho nunca atingidos antes na empresa.

A gama de ações que pode envolver o gerenciamento das Melhorias é quase infinito: criação de novos produtos, serviços e mercados; aumento de produtividade e lucratividade; redução dos custos; aumento do moral dos funcionários por redução de absenteísmo ou rotatividade, etc; aumento da confiabilidade do serviço; aumento do nível de atendimento às expectativas dos clientes, fazendo cair o número de reclamações, etc.

Para utilizar a linguagem de Deming (1990), a Rotina, que envolve a criação e manutenção de padrões, ataca as causas especiais. Já as Melhorias correspondem a uma modificação das causas comuns (esclarecimentos sobre o significado de ambos os tipos de causas serão dados na Parte IV deste texto).

Numa escola estadual ou municipal, por exemplo, manter uma taxa de repetência de alunos em torno de 8-10% implica numa Rotina do respectivo processo. Já reduzir esta taxa a 5% devido a uma estratégia mais adequada, corresponderia a uma Melhoria. Do mesmo modo, no setor administrativo, manter uma produtividade de 2,5 - 3 páginas por hora no serviço de digitação implicaria numa Rotina. Entretanto, passar o rendimento para 3,5 - 4 páginas por hora, devido a treinamento mais acurado dos operadores, seria uma Melhoria.

Campos (1990) relembra alguns princípios básicos que regulam o gerenciamento por Rotina e por Melhorias. Os importantes são:

a) Rotina é equivalente a manutenção de padrões. Melhorias têm relação com a modificação desses padrões. São válidos aqui os exemplos apresentados anteriormente.

b) A Rotina deve ser implantada antes de pensar em Melhorias, pois primeiro é necessário estabilizar o processo. Isto é responsabilidade do gerenciamento por Rotinas. Já a melhoria da capacidade do processo (através da redução da dispersão e/ou alinhamento da média) é um assunto típico para a gerência das Melhorias (estabilidade e capacidade de processos serão discutidas detalhadamente na Parte IV deste texto).

c) Deve existir um processo seqüencial entre Rotina e Melhorias, de modo que quando alguma destas últimas aconteça, a Rotina a fixe e assim sucessivamente. Em nosso exemplo, uma vez que a Melhoria atinge 5% de repetência, devido a adoção de uma nova estratégia, ela deve ser estabilizada pela Rotina. Mas, depois de um certo tempo, uma nova Melhoria deve ser tentada . Se formos bem sucedidos, essa nova Melhoria deverá ser, por sua vez, rotinizada.

d) O estabelecimento de dois subsistemas gerenciais para administrar a Rotina e as Melhorias deve-se a que a atitude, a organização e a metodologia utilizadas em cada caso são completamente diferentes. Aqui, registra-se uma das grandes contribuições de Juran, o que tem levado a uma revolução administrativa. Segundo a nova visão, a administração deixa de ser considerada apenas como uma seqüência de atividades, o que representa só a percepção básica e passa a ser considerada como um edifício de dois andares, no qual no térreo o enfoque é dirigido a manter e preservar os processos, mas no andar superior a ênfase é completamente diferente: inovar.

Campos (1990) desenvolve algumas comparações acerca das diferenças de enfoque entre Rotinas e Melhorias que facilitam grandemente a compreensão destes dois conceitos básicos:

a) Atitude gerencial. Na Rotina, supõe-se que o nível de desempenho é suficiente, ou, seja se isto não for verdade, ele dificilmente poderá ser melhorado. Ou seja, não temos um problema e sim uma sina. Já nas Melhorias compreende-se que, se o processo atual não é satisfatório, algo deve ser feito; temos, portanto, um problema a resolver.

b) Objetivo gerencial. Na Rotina, através de seus procedimentos próprios, o que se visa é manter o desempenho atual no nível registrado. Já nas Melhorias, o que se persegue é alcançar um melhor desempenho.

c) Plano gerencial. Na Rotina, o grande objetivo é identificar e eliminar desvios eventuais (causas especiais) do desempenho atual; já no caso das Melhorias, o esforço deve ser direcionado aos problemas de natureza crônica que impedem a efetivação de um melhor desempenho.

Estas colocações podem ser sintetizadas segundo a Tabela 1.

ASPECTO

ROTINA

MELHORIA

·       Atitude Gerencial

·       O nível de desempenho é considerado adequado e suficiente.

·       O nível de desempenho atual não é satisfatório. Temos um problema a resolver.

·       Objetivo Gerencial

·       Manter o desempenho atual no nível registrado.

·       Obter um melhor desempenho.

·       Plano Gerencial

·       Identificar e eliminar desvios eventuais do desempenho atual (causas especiais).

·       Atacar os problemas de natureza crônica que impedem a realização de um melhor desempenho (causas comuns).

TABELA 1. DIFERENÇAS DE ENFOQUE ENTRE ROTINA E MELHORIA.

1.5.2. Processo

A palavra processo significa algo que está em movimento permanente, que se está transformando gradualmente de um estado a outro. Isto implica uma sucessão de tarefas realizadas com uma certa finalidade; assim cada tarefa cumprida, de um certo modo, influi na seguinte, de forma que, usando o linguajar da Qualidade Total, podemos entender o processo como um conjunto de causas operando sobre certos insumos, objetivando o desfecho de um certo efeito final.

Por outro lado, os processos correspondem a diversos níveis, de modo que tanto uma Secretaria, uma Prefeitura, a Imprensa Oficial ou um hospital público, podem ser identificados segundo níveis onde acontecem processos específicos. O fato é que dentro do nível maior existem níveis menores tais como departamentos ou seções até chegar aos processos básicos, por exemplos matrícula de alunos, compras, limpeza, tesouraria, serviços gráficos, serviços informatizados, almoxarifado, manutenção de equipamentos, etc.

Assim a palavra processo tem natureza holística, ela é profundamente dinámica podendo envolver o todo e as partes, simultaneamente ou não. Estes processos, independente de sua natureza, se caracterizam por dois aspectos: eles produzem efeitos e são ativados por causas. Por exemplo: o processo "ministrar uma aula" implica em vários efeitos, um deles é o rendimento médio dos alunos; sendo que ele responde a uma multidão de causas tais como qualidade da acústica, tamanho da sala, tipo de carteiras, disponibilidade de meios audiovisuais, conhecimento, entusiasmo e didática do professor, atitude e interesse dos alunos, etc.

O fato é que os processos sejam divisíveis em processos menores é extremamente vantajoso, pois o gerenciamento dos mesmos fica muito facilitado. Por exemplo: controlar ordens de compra de material escolar, controlar a limpeza das salas, controlar a qualidade das aulas etc, são ações perfeitamente possíveis se comparadas ao processo global "ensinar". Portanto, controlando os processos menores ou micro-processos é possível descobrir rapidamente os problemas e agir sobre as suas causas, de modo que eles funcionem de maneira harmônica. Finalmente, a integração de todos estes macro-processos a nível da Diretoria poderá levar o super-macro-processo (a organização) a um patamar de excelência.

Cada processo precisa ser identificado através de um fluxograma, sendo que ele poderá ter vários efeitos, mas só alguns realmente nos interessam. Estes efeitos, verdadeiras características da qualidade, serão escolhidos como indicadores recebendo um nome muito definido e muito importante em Qualidade Total: itens de controle. Por sua vez, cada processo é, normalmente, afetado por várias causas, algumas das quais se reconhecidas como importantes, podem desempenhar também o papel de indicadores agora num segundo nível. Estes indicadores são denominados itens de verificação.

Todo processo tem 3 elementos: entrada, processamento e saída (Ver Fig. 2).

FIGURA 2 - PROCESSO BÁSICO: REPRODUÇÃO CÓPIAS XEROX

Na Parte II deste texto, itens de controle e itens de verificação serão discutidos detalhadamente, pelo que aqui em lugar de colocar um exemplo da área do serviço público, colocaremos um mais genérico para fazer compreender seu significado de uma forma mais leve.

Por exemplo, uma dona de casa pode ter como objetivo preparar um bolo de certo tipo. Neste caso, itens de controle são características que ela testará em ocasião do produto (bolo) acabado. Assim estes itens poderão ser: consistência, sabor, aroma, aspecto visual etc. Eles devem satisfazer ao cliente, mas uma vez o produto pronto, nada pode ser feito para melhorá-lo (salvo levar em conta os problemas acontecidos para uma futura experiência), de modo que se ele ficou ruim poderá ser colocado no lixo. Entretanto, a dona de casa durante o processo de preparação do bolo fez tudo o que estava a seu alcance para produzir um bolo ótimo: assim ela mexeu com a temperatura do forno, com a intensidade da exposição ao fogo, quantidade de leite, tempo de amassado, proporção de ingredientes etc. Essas são suas causas em relação ao efeito final: bolo. Portanto correspondem aos itens de verificação. Naturalmente que a dona de casa trabalhará em vários aspectos de forma subjetiva e sem padronização escrita. Isto não é válido para a aplicação da Qualidade Total que exige fatos e dados e portanto valores numéricos específicos. Mas a parte conceitual é perfeitamente aplicável.

Em resumo, os itens de controle correspondem a efeitos e se medem no produto acabado; já os itens de verificação correspondem a causas e se medem durante o processo.

Traduzindo as idéias anteriores em termos de Qualidade Total, temos o conceito de controle de processo, cujo significado é: Primeiro, manter estável uma série de causas (itens de verificação) que afetam os efeitos do processo (itens de controle) relativos ao produto a ser gerenciado. Isto é: manter a Rotina. Segundo, melhorar a Rotina (Melhorias) agindo sobre aquelas causas.

Esse controle de processo deve seguir a seqüência Q (qualidade intrínseca), C (custo), E (entrega), M (moral) e S (segurança). Esse é o significado de um conceito muito difundido no Japão: primeiro a qualidade.

Os processos, sendo uma sucessão de tarefas, podem ser representados através de gráficos denominados fluxogramas. Um exemplo simplificado é apresentado na Fig. 3. Fluxogramas mais detalhados, com a descrição dos símbolos envolvidos são apresentados na Parte IV deste texto: Padronização.

FIGURA 3 - FLUXOGRAMA SIMPLIFICADO DO PROCESSO "CAPACITAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS DE UMA INSTITUIÇÃO PÚBLICA"

Alguns sub-processos dentro do processo de capacitação são os seguintes:

-      Ministrar aulas expositivas

-      Exposição de casos pelos participantes

-      Ministrar aulas de exercícios

-      Execução de trabalhos de campo

-      Desenvolvimento de debates ou painéis

-      Correção de provas

Entretanto há atividades de capacitação que são importantes, mas não constituem processos, tais como:

-      Lançar matéria ou marcar para casa

-      Dar visto em cadernos

-      Preencher as notas nos cadernos de aula

-      Fazer chamada

-      Atender participantes

Da mesma forma, na área administrativa temos processos (tais como comprar, digitar, xerocar, recrutar pessoal, limpar salas e corredores) e atividades (colocar papel no fax, ligar o aspirador, acender a luz, colocar papel higiênico no banheiro, etc.).

A diferença entre "processo" e "atividade ou ação" é que a primeira envolve uma série destas, sempre que as mesmas se caracterizam por uma regularidade propositada (sistematização).

1.5.3. Produto

Ele pode ser definido como o resultado de um processo. Naturalmente que o produto não necessita ser de natureza física, tangível como um carro, um pacote de manteiga ou uma caixa de parafusos. Ele pode ser de natureza intangível, com é o caso de uma idéia capaz de melhorar um processo gráfico, um diagnóstico médico ou ministrar uma aula. Nestes casos, em lugar de produto muitas vezes utiliza-se a palavra serviço.

Assim no serviço público temos produtos ou serviços tais como:

-     Processo: Análise laboratorial

* Produto: Resultado dos exames

-     Processo: Compra de insumos

* Produto: Emissão de faturas de compra

-     Processo: Recrutamento de pessoal

* Produto: Listagem de pessoal a ser contratado

-     Processo: Impressão

* Produto: Bilhete lotérico

1.5.4. Clientes

Este ponto necessita uma análise especial, pois são vários os tipos de clientes que uma organização deve considerar. Eles são basicamente de três tipos: clientes externos (usuários, aqueles que recebem, compram e/ou utilizam o produto); clientes internos (os funcionários da organização, que são clientes dos processos anteriores àqueles nos quais eles estão trabalhando) e clientes em sentido amplo (aqueles que são afetados de alguma forma pelos produtos ou serviços da organização, embora não sejam usuários dos mesmos).

Das dimensões da qualidade, qualidade intrínseca, custo, entrega e segurança tem a ver com o cliente externo; moral com o cliente interno (funcionário), custo com o cliente interno (gestor); segurança com o cliente em sentido amplo.

A definição cuidadosa do cliente e do produto específico para cada nível da organização não é uma mera curiosidade acadêmica. é em função dela que será possível definir a forma em que cada nível deverá se instrumentalizar para satisfazer os seus clientes específicos.

A identificação nos leva a um ponto fundamental: conhecer os fatores que os clientes gostariam que fossem levados em conta no produto, assim como saber quais fatores são considerados prejudiciais.

é necessário deter-se com certo detalhe nestes assuntos, pois uma identificação errada de produtos e clientes pode afetar severamente a qualidade de desempenho no setor específico e, portanto, da empresa, como um todo.

1.6 - O CICLO PDCA

Existe um método geral de modelo gerencial em Qualidade Total. Ele foi conhecido inicialmente - em 1930 - como Ciclo Shewart, depois quando o Deming o levou ao Japão em 1950 ficou conhecido lá como o ciclo Deming. Hoje é conhecido como Ciclo PDCA, sigla correspondente às iniciais P de plan (planejar); D de do (fazer, executar); C de check (conferir) e A de action (ação corretiva).

O Ciclo PDCA é representado normalmente por um círculo com quatro quadrantes. (Ver figura 4).

FIGURA 4 - O CICLO PDCA

Explicitando um pouco mais tem-se:

- Planejar (P). Consiste basicamente no estabelecimento de um plano composto de metas, assim como pelos meios que permitirão atingi-los, acompanhados do respectivo cronograma.

- Executar, fazer (D). Nesta fase, o plano é executado através de tarefas específicas, devendo-se colher dados com o propósito de posterior controle do processo. Antes da execução do plano há uma etapa fundamental: o treinamento decorrente daquelas. Obviamente ele será iniciado previamente.

A execução, o fazer, corresponde ao processo. Aqui é onde as causas começam a agir sobre os efeitos. Portanto é o momento que corresponde ao monitoramento dos itens de verificação. No exemplo da dona de casa preparando o bolo, é durante a elaboração deste (execução) que os itens de verificação são testados.

- Conferir, checar (C). Agora o processo acabou; tem-se o produto pronto, já elaborado, manifestando-se nele uma série de efeitos. Portanto é a oportunidade adequada para comparar as metas definidas em P com os resultados obtidos, medidos através dos itens de controle.

- Ação corretiva (A). No caso de serem comprovados desvios entre as metas estabelecidas e os resultados obtidos, a gerência deverá fazer correções tendentes a sua neutralização.

Se realmente desejamos trabalhar com Qualidade Total, deve se considerar o Ciclo PDCA como o cerne do sistema, de modo que todas as ações desenvolvidas terão como orientação básica o cumprimento do Ciclo, de maneira que se houve uma etapa inicial de planejamento, necessariamente haverá uma de execução e depois o controle, com ação corretiva, se for o caso. (Naturalmente que se houve algum erro no planejamento o responsável pode percebê-lo e não fornecer os meios para o andamento do Ciclo PDCA. Mas nesse caso, ele comunicará ao subordinado a natureza do impedimento para que seja feito um novo planejamento).

O Ciclo PDCA é o método central da Gestão da Qualidade Total. Sua aplicação é muito vasta e generalizada. Dentre de suas principais utilizações se destacam: padronização, 5 S, metodologia de análise e solução de problemas (MASP) etc. Elas serão discutidas em próximos capítulos.

1.7 - BIBLIOGRAFIA

1.   BARBOSA, E. F. e outros. Gerência da Qualidade Total na Educação: UFMG. Escola de Engenharia, Fundação Christiano Ottoni, 1994.

2.   BONILLA, J. A. - Calidad Total: la nueva orientación empresarial. Montevidéu: Estratégia. Fev. 1991. p. 28-33.

3.   BONILLA, J. A. - Conceitos básicos sobre qualidade e produtividade. Belo Horizonte: Tudo Comércio e Indústria. n0 269, p. 9-10, 1991.

4.   BONILLA, J. A. - Qualidade Total: o que significa, porque e como implantá-la. Belo Horizonte: Tudo Comércio e Indústria. n0 270. p. 56-59, 1991.

5.   BONILLA, J. A. - Qualidade Total na Agricultura. Belo Horizonte: Informe Agropecuário. n0 170, p. 56-59, 1991.

6.   BONILLA, J. A. - A crise das organizações humanas e a grande oportunidade de sua superação através da Qualidade Total Autêntica. Anais do XV Encontro da ANPAD, Belo Horizonte, 1991.

7.   BONILLA, J. A. - Resposta à crise: Qualidade Total Autêntica em Bens e Serviços. São Paulo: Makron Books. 1993, 239 p.

8.   BONILLA, J. A. - Qualidade Total na Saúde. Secretaria de Saúde de Minas Gerais. DCA/FACE/UFMG. 1997, 228 p

9.   BONILLA, J. A. - A sexta dimensão da Qualidade Total: A Responsabilidade Social Autêntica. Ingeniería Química, 23:20-99. nov. 2003.

10. CAMPOS, V. F. - Gerência da Qualidade Total. Belo Horizonte: Fundação Christiano Ottoni. 1980. 187 p.

11. CAMPOS, V. V. - TQC. Controle da Qualidade Total (no estilo japonês). Belo Horizonte: Fundação Christiano Ottoni, 1992, 220 p.

12. CAPRA, F. - O Ponto de Mutação. São Paulo: Ed. Cultrix. 1982. 440 p.

13. CARR. D. K e I.D. LITTMAN. Excelência nos Serviços Públicos: Gestão da Qualidade Total na Década de 90. Rio de Janeiro: Qualitymark. 332 p.

14. DEMING, W. E. - Qualidade: a Revolução da Administração. Rio de Janeiro: Marquês Saraiva, 1990, 367 p.

15. FEIGENBAUM, A. V. - Total Quality Control. Nova Iorque: Mc Graw-Hill Book Company, 1983, 851 p.

16. FERGUSON, M. - A Conspiração Aquariana. Rio de Janeiro: Record, 1980, 427 p.

17. HERZBERG, F. - Work and the Nature of the Man. Nova Iorque: Word Publishing, 1966.

18. ISHIKAWA, K. - TQC - Total Quality Control: estratégia e administração de qualidade, São Paulo: IM e C Internacional, 1986, 278 p.

19. JURAN, J. M. - Juran Planejando a Qualidade. São Paulo: Pioneira, 1990, 394 p.

20. MASLOW, A. H. - Motivation and Personality. Nova Iorque: Mc Graw-Hill, 1960.

Mc GREGOR D. The Human Side of Enterprise. Nova Iorque: Mc Graw-Hill, 1960.

DEDICATÓRIA

Dedico este texto a todos os esforçados servidores públicos do Brasil, em todos os seus níveis: federais, estaduais e municipais, que com sua contribuição indispensável, possibilitam a sobrevivência e a prosperidade da nação.

Nesse marco referencial, a Gestão da Qualidade será uma valiosíssima ajuda, tanto para as respectivas instituições como para os servidores considerados individualmente. Com efeito, a aplicação desta metodologia em forma conscienciosa e segundo as indicações contidas neste material, poderá criar por um lado um clima interno mais favorável ao deslanchamento das potencialidades dos funcionários, e por outro, fornecerá os instrumentos básicos para que estas potencialidades se possam manifestar na forma de um serviço mais eficiente, mais interessante e mais satisfatório para todos.

No contexto da Reforma do Estado, a inserção desta nova metodologia gerencial apresenta-se como um forte triunfo, capaz de reposicionar as instituições públicas em seu verdadeiro lugar: serem as depositárias dos anseios da sociedade em relação com suas necessidades básicas (articulação social, saúde, educação, segurança, etc). Mas isto não será possível sem uma inserção profunda dos atores individuais: os servidores públicos.

Confiando em poder estimular de alguma forma a sua adesão à nova filosofia de vida e de ação gerencial, lhes dedicamos este livro com muito carinho, especialmente às autoridades e funcionários da Imprensa Oficial-MG.

Prof. José A. Bonilla (UFMG)


(*) Entende-se por eficácia: "fazer o que deve ser feito para se atingir objetivos ou resultados". "Já eficiência significa: "fazer da melhor forma possível uma tarefa ou serviço".

(*) De agora em diante, substituiremos a sigla anglo-saxônica TQC pela portuguesa GQT.

(*) A responsabilidade social é um conceito relativamente novo que está sendo aplicado nas empresas privadas. Ele implica em que estas não são apenas máquinas de fazer dinheiro. Elas devem estar a serviço da sociedade, que retribui com lucros seus produtos e serviços. As organizações competem entre si como se estiverem numa vitrine; o cliente "cidadão" consciente, acabará premiando umas e castigando outras, de modo que a sobrevivência empresarial precisa cuidar cada vez mais deste ingrediente.

Já o setor público, tem como missão primordial a responsabilidade social, como é o caso de uma Prefeitura, responsável - entre outras coisas - da coleta de lixo ou da manutenção de ruas e passeios ou no caso das escolas públicas, a educação gratuita de milhões de crianças, adolescentes e jovens.

O autor, Bonilla (2003) propõe a Responsabilidade Social como sexta dimensão da Qualidade (ver item 1.1).

 

 

 

Autor:

José A. Bonilla

bonilla.bhz[arroba]terra.com.br

Professor aposentado do departamento de ciências administrativas da faculdade de ciências econômicas da ufmg

Ex-coordenador do nempo (núcleo de estudos e pesquisas sobre mudança de postura gerencial e humana)

Ex-consultor do banco mundial

Ex-instrutor e consultor da fundação christiano ottoni

Consultor em gestão da qualidade da imprensa oficial de minas gerais

Consultor da fundação iberoamericana



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