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Hábitos de hidratação em adolescentes praticantes de judô (página 2)

Natacha Toral; Betzabeth Slater; Isa de Pádua Cintra; Mauro Fisberg

 

A classificação do estado nutricional foi realizada através do Índice de Massa Corporal (IMC = peso (kg) / estatura² (m)). O IMC dos adolescentes foi avaliado por meio da classificação proposta pela OMS (1995), utilizando-se os parâmetros estabelecidos por Must et al. (1991). Foram considerados como de baixo peso os adolescentes cujos valores fossem inferiores ou iguais ao percentil 5; eutróficos quando o IMC estivesse entre os percentis 5 e 85; sobrepeso se estivesse igual ou maior que o percentil 85 e inferior ao 95; e obeso superior ou igual ao percentil 95. Salienta-se que o IMC foi utilizado apenas para fins de classificação.

Em relação à hidratação, considerou-se adequada à ingestão de líquido antes, durante e após os treinos e/ou competições.


Gráfico 1 - Perfil nutricional de adolescentes praticantes de judô, São Paulo, 2002.


Gráfico 2 - Porcentagem de adolescentes praticantes de judô que acreditavam hidratar-se adequadamente, São Paulo, 2002.

4. Resultados e discussão

Do total de 36 esportistas estudados se verificou que a maioria (64%) encontrava-se eutrófico. Isso demonstrou que os mesmos se preocupavam em ter uma nutrição condizente com o seu respectivo nível de atividade física, mantendo também um nível adequado de peso. Entretanto, cerca de 22% estavam com sobrepeso e 14% com obesidade. É importante salientar que, por se tratar de esportistas, é provável que o excesso de peso seja reflexo da massa magra (Gráfico 1). Cabe ressaltar, também, que a determinação do estado nutricional de adolescentes, especialmente atletas, ainda é um assunto obscuro e que necessita de um grande número de dados individuais (Ribeiro, 1998).

Do total dos esportistas estudados, 97% afirmaram acreditar que se hidratavam adequadamente, conforme demonstra o Gráfico 2. Apesar deste resultado, apenas 33,3% apresentavam hábitos de hidratação antes, durante e depois do treino (Tabela 1). Isso demonstra que o número de esportistas que apresentavam hábitos inadequados de hidratação era grande, mostrando a falta de consciência sobre a importância da hidratação correta para um bom desempenho físico. Entre os que se hidratavam antes, durante e após, a maioria (44%) costumava hidratar-se somente com água. Recomenda-se durante o exercício com duração acima de uma hora, o uso de bebidas esportivas, pois pode aumentar a palatabilidade e a ingestão, aumentando a quantidade de fluido consumido. Portanto, a ingestão de água é mais apropriada para eventos esportivos com duração inferior a uma hora (Nutrition and Athetic Performance, 2000).

Cerca de 67% dos esportistas afirmaram preocupar-se com a combinação de nutrientes de sua hidratação, demonstrado no Gráfico 3. Entretanto, a utilização de refrigerante foi maior do que a de bebidas esportivas como meio de se hidratar e repor a energia perdida. Este tipo de comportamento é prejudicial à performance, uma vez que os refrigerantes são desidratantes (Mahmoud et al., 1997), fazendo com que se perca água e eletrólitos, em comparação com algumas bebidas esportivas, que possuem carboidratos e eletrólitos nas quantidades adequadas, favorecendo a hidratação e reposição de energia. Verificou-se, ainda, a presença de outras bebidas utilizadas com a finalidade de hidratação como sucos e iogurtes. Estas bebidas não são aconselhadas durante o exercício, devido à sua alta concentração de carboidratos, dificultando o esvaziamento gástrico e a absorção dos mesmos (Mahmoud, 1997). Assim também, bebidas com frutose retardam o esvaziamento do estômago e, se seus níveis forem altos, podem provocar, em alguns esportistas, cólicas, diarréia e náuseas (Ruud & Grandjean, 1997).

Quando questionados sobre a função das bebidas esportivas, 46% dos esportistas sabiam a importância do uso delas, entretanto, apenas 8,3% possuíam o hábito de hidratar-se com bebidas esportivas antes e após o treinamento ou competição e 5,5% durante os mesmos.

Observou-se que 78% dos esportistas costumavam hidratar-se somente depois de sentir sede, conforme o Gráfico 4. Este é um comportamento negativo, pois a sensação de sede é uma resposta a um quadro de desidratação de no mínimo 2% (Marquezi & Lancha Júnior, 1998). Uma desidratação de 2% a 4% do peso corporal pode afetar a performance do atleta com sintomas graves e progressivos (Probart, 1993).

Apenas 25% possuem o hábito de pesar-se antes e após o treinamento ou competição. Isto demonstra que os esportistas não possuem o hábito de controlar a perda de líquidos durante a atividade, desconhecendo a quantidade de líquidos necessária para a reposição através da hidratação, como, também, desconhecendo que este é um procedimento que pode ser utilizado para controlar o nível de hidratação (Probart, 1993). Consumir líquido correspondente a 150% do peso perdido, durante a sessão de exercício pode ser necessário para corrigir as perdas e alcançar o estado normal de hidratação (Leiper et al., 1996).


Gráfico 3 - Porcentagem de adolescentes praticantes de judô que relataram preocupar-se com o tipo de hidratação, São Paulo, 2002.


Gráfico 4 - Porcentagem de adolescentes praticantes de judô que costumavam hidratar-se antes ou depois do estímulo da sede, São Paulo, 2002.

Vale ressaltar que apenas 8% dos esportistas responderam que não fazia diferença consumir uma quantidade adequada de líquidos antes, durante e depois de treinamento ou competição para um melhor desempenho e, no entanto, verificou-se que os adolescentes referiram sintomas que podem interferir com o desempenho na competição ou treinamento, estando diretamente relacionados à perda de líquidos, ou seja, uma hidratação inadequada (Tabela 2). Sabe-se que, se houver uma perda de 15% a 20% do peso corporal, podem ocorrer choque hipovolêmico, insuficiência renal e até mesmo a morte (Rochelle, 1998).

A sensação de sede muito intensa (61,1%) pode ser resultado da desidratação (Marquezi & Lancha Júnior, 1998). A sensação de perda de força apresentada por 47,2% pode estar relacionada à redução da glicemia sangüínea (McArdle, 1992). O fato de 30,5% apresentarem cãibras demonstra que, provavelmente, houve uma sudorese profunda, sem a reposição adequada de líquidos (Aragón-Vargas et al., 2001). A razão de 27,7% apresentarem sonolência e 19,4% dificuldade de realizar um movimento técnico são sintomas compatíveis com uma condição hipoglicêmica e de hipoidratação, interferindo no funcionamento do sistema nervoso central.

Metade dos adolescentes praticantes de judô afirmaram que já necessitavam perder peso antes da competição. Para isso, 48% aumentaram a atividade física, 36% fizeram dieta, 8% diminuíram a ingestão de líquidos e 8% utilizaram roupas especiais. Sabe-se que na prática de alguns esportes, como lutas (judô, boxe), os atletas normalmente induzem uma desidratação aguda, perdendo cerca de 5% ou mais de seu peso corporal, com o intuito de competirem em categorias inferiores (Lamb & Shehata, 1991; Leiper et al., 1997). Métodos inadequados, como utilizar roupas plásticas durante a atividade física, realizar semidieta de fome, aumentar a duração e intensidade da atividade física e outros, são fatores que podem predispor o indivíduo ao estado de desidratação (Applegate, 1996).

Cerca de 61% dos esportistas responderam que não receberam nenhum tipo de orientação sobre hidratação. Dos adolescentes que tiveram algum tipo de orientação, 16,6% foram orientados pelos pais, 11,1% pelo professor de educação física da escola, 11,1% por nutricionista e 8,3% pelo médico. Estes são os meios a que os adolescentes recorriam mais para obter informações sobre a maneira correta de hidratação. Porém, o comportamento dos adolescentes demonstrou que eles não colocaram em prática as informações que receberam ou os profissionais responsáveis pelo treinamento dos atletas não estão atuando de maneira a orientá-los quanto a uma hidratação adequada.

5. Conclusão

Os judocas possuem consciência sobre a importância da hidratação para o rendimento e acreditam que se hidratam corretamente. Entretanto, não realizam uma estratégia de hidratação adequada.

A água é a principal fonte de hidratação da maioria dos esportistas. As bebidas esportivas são pouco utilizadas, contradizendo o fato dos atletas afirmarem preocupar-se com a combinação de nutrientes de sua hidratação.

Apesar da maioria dos esportistas acharem que a quantidade de líquidos ingerida antes, durante e depois de treinamento ou competição é importante, pois melhora o desempenho e diminui o cansaço, apenas uma minoria possui o hábito de se pesar antes e depois de um treinamento ou competição, a fim de repor líquidos na quantidade adequada e controlar o nível de hidratação.

Os sintomas mais freqüentemente apresentados pelos esportistas durante o treino ou competição foram: sede muito intensa, sensação de perda de força, cãibras e outros. Dentre os sintomas apresentados, acredita-se que muitos poderiam ser minimizados com a ingestão adequada de bebidas esportivas antes, durante e após os treinamentos e competições.

Metade dos esportistas já tiveram que perder peso antes da competição. Deve-se ressaltar que este tipo de esporte é dividido por categorias ascendentes, conforme o peso do atleta. Portanto, muitos acabam tendo que perder peso, utilizando-se de métodos inadequados, para se enquadrarem numa categoria de peso inferior, o que pode comprometer sua performance e induzir a uma desidratação aguda.

Pode-se, então, concluir que são necessárias campanhas de esclarecimento sobre hidratação com os judocas, a fim de melhorar a qualidade dos treinamentos e o desempenho nas competições.

É importante ressaltar a necessidade de se tomarem medidas antropométricas complementares, uma vez que a população adolescente, usualmente, passa por significativas alterações corporais durante seu processo de maturação sexual, além do que, por serem esportistas, é possível que o excesso de peso seja reflexo do aumento da massa magra.

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por Eliana Cristina de Almeida1, Maria Cláudia Cavalieri2, Márcia Daskal Hirschbruch3, Isa de Pádua Cintra4, Mauro Fisberg5 - fisberg[arroba]uol.com.br

1Nutricionista especialista pelo Centro de Atendimento e Apoio ao Adolescente. Pós-graduanda pelo Departamento de Pediatria - Unifesp/EPM

2Nutricionista especialista pelo Centro de Atendimento e Apoio ao Adolescente - Unifesp/EPM

3Nutricionista responsável pelo ambulatório de Nutrição Esportiva do Centro de Atendimento e Apoio ao Adolescente. Mestre pelo Departamento de Pediatria - Unifesp/EPM

4Nutricionista. Professora adjunta do Centro de Atendimento e Apoio ao Adolescente - Unifesp/EPM

5Pediatra. Chefe do Centro de Atendimento e Apoio ao Adolescente - Unifesp/EPM. Coordenador do Centro de Pesquisas Aplicadas à Saúde da Universidade São Marcos. Diretor da Nutrociência Assessoria em Nutrologia

Endereço para correspondência: Centro de Atendimento e Apoio ao Adolescente/EPM/Unifesp - Rua Botucatu, 715. Vila Clementino - CEP 04023-062 - São Paulo - SP



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